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Estado de Minas COLUNA

O dólar se move ao sabor da expectativa de elevação dos juros nos EUA

Há razões de sobra para esperar um aperto mais forte na política monetária do país que emite o dólar, com as consequências negativas para o resto do mundo


26/04/2022 04:00 - atualizado 26/04/2022 07:39

Cotação
Cotação da divisa norte-americana sente os efeitos das ações para combater a aceleração dos preços no mundo (foto: Fernanda Carvalho/ Fotos Públicas 11/11/16)

 
Menos acostumados do que os brasileiros a conviver com a inflação em alta, os americanos estão sofrendo com algo que não viam há 40 anos: o índice de preços ao consumidor (PCI, na sigla em inglês) já bateu nos 8,5% em base anual. Para eles, trata-se de considerável perda do poder de compra, obrigando a maioria das famílias a cortes no orçamento doméstico, com reflexos negativos nas empresas.
 
Como em todo país, o setor de entretenimentos costuma ser um dos mais afetados por esses cortes e, no momento, oferece um exemplo de grande vi- sibilidade. A inflação e as medidas de combate a ela estão entre as causas das perdas que vem sofrendo a poderosa Netflix – além do aumento da concorrência no mercado de streaming e da redução da oferta de dinheiro nos Estados Unidos.
 
A empresa anunciou na semana passada a previsão de perda de 2 milhões de assinantes nos próximos meses, confirmando a tendência do trimestre passado. O reflexo no competitivo mercado de ações americano foi imediato: as ações da Netflix, antes campeãs de valorização, já acumulam perda de quase 40% e podem cair ainda mais.
 
Segundo apurou o Financial Times, acreditado diário econômico britânico, muitos assinantes americanos reagiram mal ao aumento dos preços decidido recentemente pela empresa, no momento em que os consumidores enfrentam a mais alta inflação do país em décadas.
 
Ainda segundo o FT, esse não é o único estrago provocado pela inflação no negócio da Netflix, empresa que havia se beneficiado da política monetária frouxa dos EUA. A necessidade de combater a inflação levou o Federal Reserve (o banco central dos EUA) a abandonar sua prolongada inércia e inverter a política monetária.
 
A autoridade começou por suspender seu programa de injeções de liquidez na economia e, agora, parte para elevar a taxa básica de juros. A primeira medida teve grande impacto na economia local; afinal, eram recomprados US$ 20 bilhões de bônus todos os meses, com impacto positivo na oferta de crédito.
 
A Netflix, lançada 2007, revolucionou o mercado de TV e de filmes. Mas foi a partir de 2012, quando passou a produzir seus próprios conteúdos, que ganhou o mercado mundial de streaming. Para isso, a empresa decidiu investir pesado, realizando produções que exigiam grandes orçamentos.
 
A política monetária de alimentação da liquidez nos Estados Unidos foi, sem dúvida, de grande ajuda às empresas que, como a Netflix, apostaram em seu próprio crescimento. Somada à baixa taxa de juros da época (menos de 0,5% ao ano), essa política levou os investidores do maior mercado financeiro do mundo a buscarem retorno nas ações, entre elas as da Netflix, que, agora, sente as mudanças. A expectativa é de que quem foi criativo para revolucionar seu mercado e alcançar sucesso mundial vai saber reinventar seu negócio.

Juros altos


Quanto à taxa de juros, o aperto na política monetária dos Estados Unidos teve um começo tímido em março. O aumento aprovado no mês passado foi de apenas 25 pontos-base, ou seja, 0,25%. Foi quase nada frente ao galope da inflação, que, então, já encostava nos 6% ao ano e continuou subindo.
 
Isso foi bom para a nossa sofrida moeda nacional, que, em relação ao dólar, foi a que mais se valorizou por causa da diferença entre as taxas de juros; afinal, a nossa já havia chegado a 11,75% ao ano. É claro que os grandes investidores americanos não perderiam essa oportunidade: despejaram dinheiro na renda fixa e na bolsa brasileiras. Com tanto dólar entrando, o real chegou a acumular valorização de 14,85%, do início do ano até  25 de março.
 
Todo mundo sabia que isso ia durar pouco e, portanto, o mercado permanece de olho nos sinais que membros do comitê que decide sobre política monetária dos EUA costumam emitir antes das reuniões. Está prevista uma elevação de 0,50% na taxa de juros no encontro da semana que vem, mas o mercado espera algo mais.
 
De fato, o impacto inflacionário na sociedade americana tem levado membros da autoridade monetária a defenderem a aceleração das elevações dos juros, já que os fatores que provocaram a atual onda de inflação no mundo persistem. Os desarranjos provocados pelos lockdowns durante a crise sanitária ainda não foram superados. Além disso, a guerra da Rússia com a Ucrânia já entrou no terceiro mês sem uma solução.

Expectativa

Há, portanto, razões de sobra para esperar um aperto mais forte na política monetária do país que emite o dólar, com as consequências negativas que isso pode ter para o resto do mundo. Em meio a essa expectativa, qualquer faísca provoca fogo. Foi o que aconteceu na última sexta-feira, quando o mercado foi surpreendido por uma corrida rumo ao dólar em vários países.
 
Só naquele dia, a moeda americana deu um salto em relação ao real, ascendendo à cotação de R$ 4,80. Ontem, o mercado abriu mais uma vez nervoso, com o dólar a R$ 4,88. Essa nova alta do dólar pode levar a moeda americana, antes do esperado, de volta ao patamar de cotações superiores a R$ 5, ou pode ter sido só mais um alarme falso. Na dúvida, vale o velho ditado de que se a inflação aleija, o câmbio mata. Não dá para ser pego desprevenido.

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