As ofertas são de encher os olhos: até 90% de desconto numa diária de uma pousada nas cidades históricas mineiras; R$ 2,4 mil a menos a pagar numa viagem para o exterior; vantagens imperdíveis em um pacote na academia de ginástica. Na internet, a febre de promoções dos sites coletivos contagia os consumidores brasileiros há um ano. Em poucas horas é preciso responder: conhecer ou não Paris; passar o fim de semana no litoral nordestino? Eis a questão. Mas a rapidez para se decidir pode esconder uma fraude: os descontos anunciados, muitas vezes, podem não ser tão atraentes como parecem à primeira vista.
A artimanhã é bem simples. Os sites superestimam os valores dos produtos, com isso, o desconto dado no preço promocional é bem maior. Valendo-se de que (quase) nunca os consumidores vão ligar para os estabelecimentos confirmando o preço, maldosamente eles aumentam-nos, criando megadescontos, que, não raro, chegam a 80%, 90% e até 95% do preço original.
No site da Clickon, segundo maior do país segundo empresas especializadas, a empresa ofertou um pacote de dois meses na academia de ginástica Contours, no Bairro Santo Agostinho, mais a avaliação física inicial. Com a promoção, o custo caía de R$ 697 para R$ 69,70, desconto de 90%. Ao todo, foram vendidas 3,7 mil ofertas, esgotando a promoção. Mas, se o consumidor pesquisar os valores, perceberá que o bônus não é tão grande quanto o anunciado. A reportagem do Estado de Minas ligou para a academia e a informação foi que o plano mensal é de R$ 199. Ou seja, por dois meses o novo cliente pagaria R$ 398 mais a inscrição, que inclui a avaliação médica, e sai por R$ 139, totalizando R$ 537 pelo mesmo pacote do site. Assim, em vez de a economia ser de R$ 627,30, será só de R$ 467,30.
Problema idêntico se repete em ofertas do site Groupon, o maior da categoria. Em oferta de 8 de julho é possível obter 50% de desconto em hospedagem na Pousada Spa Prana Lorien, em Santa Antônio do Leite, distrito de Ouro Preto, na Região Central do estado. No site de compras coletivas, duas diárias para um casal saem por R$ 310 e não os R$ 620 que seriam cobrados no valor original. No entanto, em contato telefônico com atendentes da hospedagem, o Estado de Minas confirmou novamente o superfaturamento. Duas diárias para namorados saem por R$ 440 e não por R$ 620. Com isso, o desconto no pacote é só de 29,55%. Longe dos tentadores 50%. Ou seja, o desconto existe, mas não é bem aquele anunciado.
E a promoção do site ainda impõe uma série de exigências para o consumidor, diferente de quem faz o contato direto com a pousada. Pelo Groupon, as ofertas não são válidas para feriados e datas comemorativas e de julho a dezembro o tiquete só pode ser usado de domingo a quarta-feira, enquanto quem compra diretamente com a pousada pode se hospedar também nos fins de semana, inclusive de julho (considerado alta temporada por causa das férias escolares). Outras restrições do site de compras coletivas é que é preciso reservar com antecedência mínima de 15 dias e ainda não está incluída a taxa de serviço de 10%.
Na empolgação do boom das compras coeltivas, o empresário Renato Marques Fernandes colecionou quase uma dezena de cupons promocionais, mas, sem perceber, as datas expiraram e ele tomou prejuízo de quase R$ 100. “Comprei cupom de restaurante, paintball, sorvete de iogurte...mas acabei não usando. É preciso se programar, por isso desanimei”, relata o ex-usuário dos sites, que, ressalta ainda que as promoções nos primeiros meses eram mais atraentes e, agora, uma série de regras torna-as menos atrativas.
Em nota, o Groupon afirma que “parceria com a Pousada Spa Prana Lorien foi realizada com base no tarifário cheio passado pelo estabelecimento e não na tabela promocional”, reiterando que a oferta anunciada ao EM pode tratar-se de uma ‘promoção relâmpago’.
Abusos
O coordenador do Procon da Assembleia Legislativa, Marcelo Barbosa, diz que a estratégia das empresas são caracterizadas como publicidade enganosa. “O consumidor sente-se atraído pelo desconto independentemente do preço”, afirma, tendo como argumento o artigo 37 do Código de Defesa do Consumidor que diz ser proibida “toda publicidade enganosa ou abusiva”.
A lei caracteriza como enganosa “qualquer modalidade de informação ou comunicação de caráter publicitário, inteira ou parcialmente falsa, capaz de induzir em erro o consumidor a respeito da natureza, características, qualidade, quantidade, propriedades, origem e preço”. Para o coordenador do Procon-ALMG, caso o consumidor comprove o problema da superestimativa de preços, tem duas opções: pedir a devolução do valor pago ou exigir que seja oferecido o real desconto anunciado no site.
O primeiro passo é entrar em contato com o prestador do serviço. Caso a negociação não tenha êxito, a orientação é procurar os responsáveis pela página na internet e, persistindo
o problema, o Procon pode ser acionado para intermediar a negociação ou, inclusive, acionar a Justiça para que se chegue a um acordo. “Se houve alteração do preço, estão agindo de má-fé, levando o consumidor ao raciocínio errado. As pessoas são atraídas pelo desconto. Fixam na cabeça 79, 80% e compram”, afirma Marcelo Barbosa, ressaltando que o consumidor que se sentir lesado precisa ter a documentação impressa comprovando o crime. O EM entrou em contato com o ClickOn, mas até o fechamento da edição não obteve resposta.
Palavra de especialista - Marcelo Barbosa - Coordenador do Procon
Indução ao erro
“É direito básico do consumidor a proteção contra a publicidade enganosa, previsto no Código de Defesa do Consumidor. A publicidade enganosa, conceituada no artigo 37 do mesmo diploma legal, é aquela que induz o consumidor a erro sobre vários aspectos relativos ao produto ou ao serviço: características, preço, origem, data de entrega, etc. É o famoso ‘levar gato por lebre’. O consumidor tem uma determinada expectativa sobre o produto ou serviço e o fato
não ocorre. Há também a publicidade enganosa por omissão, onde o fornecedor omite informação relevante sobre o produto ou o serviço, principalmente sobre os riscos do negócio. Nesses casos, há a possibilidade da rescisão do contrato com a devolução do dinheiro pago ao consumidor, corrigido monetariamente ou até mesmo o cumprimento integral do que foi prometido. Promover a publicidade enganosa é crime previsto na legislação consumerista e tal fato deve ser denunciado pelo consumidor à delegacia de policia.”
O que diz o código
Art. 37 – É proibida toda publicidade enganosa ou abusiva.
Parágrafo 1º – É enganosa qualquer modalidade de informação ou comunicação de caráter publicitário, inteira ou parcialmente falsa, ou, por qualquer outro modo, mesmo por omissão, capaz de induzir em erro o consumidor a respeito da natureza, características, qualidade, quantidade, propriedades, origem, preço e quaisquer outros dados sobre produtos e serviços. (…)
Parágrafo 3º – Para efeitos deste Código, a publicidade é enganosa por omissão quando deixa de informar sobre dado essencial do produto ou serviço.
Art.38 – O ônus da prova da veracidade e correção da informação ou comunicação publicitária cabe a quem as patrocina.
A artimanhã é bem simples. Os sites superestimam os valores dos produtos, com isso, o desconto dado no preço promocional é bem maior. Valendo-se de que (quase) nunca os consumidores vão ligar para os estabelecimentos confirmando o preço, maldosamente eles aumentam-nos, criando megadescontos, que, não raro, chegam a 80%, 90% e até 95% do preço original.
No site da Clickon, segundo maior do país segundo empresas especializadas, a empresa ofertou um pacote de dois meses na academia de ginástica Contours, no Bairro Santo Agostinho, mais a avaliação física inicial. Com a promoção, o custo caía de R$ 697 para R$ 69,70, desconto de 90%. Ao todo, foram vendidas 3,7 mil ofertas, esgotando a promoção. Mas, se o consumidor pesquisar os valores, perceberá que o bônus não é tão grande quanto o anunciado. A reportagem do Estado de Minas ligou para a academia e a informação foi que o plano mensal é de R$ 199. Ou seja, por dois meses o novo cliente pagaria R$ 398 mais a inscrição, que inclui a avaliação médica, e sai por R$ 139, totalizando R$ 537 pelo mesmo pacote do site. Assim, em vez de a economia ser de R$ 627,30, será só de R$ 467,30.
Problema idêntico se repete em ofertas do site Groupon, o maior da categoria. Em oferta de 8 de julho é possível obter 50% de desconto em hospedagem na Pousada Spa Prana Lorien, em Santa Antônio do Leite, distrito de Ouro Preto, na Região Central do estado. No site de compras coletivas, duas diárias para um casal saem por R$ 310 e não os R$ 620 que seriam cobrados no valor original. No entanto, em contato telefônico com atendentes da hospedagem, o Estado de Minas confirmou novamente o superfaturamento. Duas diárias para namorados saem por R$ 440 e não por R$ 620. Com isso, o desconto no pacote é só de 29,55%. Longe dos tentadores 50%. Ou seja, o desconto existe, mas não é bem aquele anunciado.
E a promoção do site ainda impõe uma série de exigências para o consumidor, diferente de quem faz o contato direto com a pousada. Pelo Groupon, as ofertas não são válidas para feriados e datas comemorativas e de julho a dezembro o tiquete só pode ser usado de domingo a quarta-feira, enquanto quem compra diretamente com a pousada pode se hospedar também nos fins de semana, inclusive de julho (considerado alta temporada por causa das férias escolares). Outras restrições do site de compras coletivas é que é preciso reservar com antecedência mínima de 15 dias e ainda não está incluída a taxa de serviço de 10%.
Na empolgação do boom das compras coeltivas, o empresário Renato Marques Fernandes colecionou quase uma dezena de cupons promocionais, mas, sem perceber, as datas expiraram e ele tomou prejuízo de quase R$ 100. “Comprei cupom de restaurante, paintball, sorvete de iogurte...mas acabei não usando. É preciso se programar, por isso desanimei”, relata o ex-usuário dos sites, que, ressalta ainda que as promoções nos primeiros meses eram mais atraentes e, agora, uma série de regras torna-as menos atrativas.
Em nota, o Groupon afirma que “parceria com a Pousada Spa Prana Lorien foi realizada com base no tarifário cheio passado pelo estabelecimento e não na tabela promocional”, reiterando que a oferta anunciada ao EM pode tratar-se de uma ‘promoção relâmpago’.
Abusos
O coordenador do Procon da Assembleia Legislativa, Marcelo Barbosa, diz que a estratégia das empresas são caracterizadas como publicidade enganosa. “O consumidor sente-se atraído pelo desconto independentemente do preço”, afirma, tendo como argumento o artigo 37 do Código de Defesa do Consumidor que diz ser proibida “toda publicidade enganosa ou abusiva”.
A lei caracteriza como enganosa “qualquer modalidade de informação ou comunicação de caráter publicitário, inteira ou parcialmente falsa, capaz de induzir em erro o consumidor a respeito da natureza, características, qualidade, quantidade, propriedades, origem e preço”. Para o coordenador do Procon-ALMG, caso o consumidor comprove o problema da superestimativa de preços, tem duas opções: pedir a devolução do valor pago ou exigir que seja oferecido o real desconto anunciado no site.
O primeiro passo é entrar em contato com o prestador do serviço. Caso a negociação não tenha êxito, a orientação é procurar os responsáveis pela página na internet e, persistindo
o problema, o Procon pode ser acionado para intermediar a negociação ou, inclusive, acionar a Justiça para que se chegue a um acordo. “Se houve alteração do preço, estão agindo de má-fé, levando o consumidor ao raciocínio errado. As pessoas são atraídas pelo desconto. Fixam na cabeça 79, 80% e compram”, afirma Marcelo Barbosa, ressaltando que o consumidor que se sentir lesado precisa ter a documentação impressa comprovando o crime. O EM entrou em contato com o ClickOn, mas até o fechamento da edição não obteve resposta.
Palavra de especialista - Marcelo Barbosa - Coordenador do Procon
Indução ao erro
“É direito básico do consumidor a proteção contra a publicidade enganosa, previsto no Código de Defesa do Consumidor. A publicidade enganosa, conceituada no artigo 37 do mesmo diploma legal, é aquela que induz o consumidor a erro sobre vários aspectos relativos ao produto ou ao serviço: características, preço, origem, data de entrega, etc. É o famoso ‘levar gato por lebre’. O consumidor tem uma determinada expectativa sobre o produto ou serviço e o fato
não ocorre. Há também a publicidade enganosa por omissão, onde o fornecedor omite informação relevante sobre o produto ou o serviço, principalmente sobre os riscos do negócio. Nesses casos, há a possibilidade da rescisão do contrato com a devolução do dinheiro pago ao consumidor, corrigido monetariamente ou até mesmo o cumprimento integral do que foi prometido. Promover a publicidade enganosa é crime previsto na legislação consumerista e tal fato deve ser denunciado pelo consumidor à delegacia de policia.”
O que diz o código
Art. 37 – É proibida toda publicidade enganosa ou abusiva.
Parágrafo 1º – É enganosa qualquer modalidade de informação ou comunicação de caráter publicitário, inteira ou parcialmente falsa, ou, por qualquer outro modo, mesmo por omissão, capaz de induzir em erro o consumidor a respeito da natureza, características, qualidade, quantidade, propriedades, origem, preço e quaisquer outros dados sobre produtos e serviços. (…)
Parágrafo 3º – Para efeitos deste Código, a publicidade é enganosa por omissão quando deixa de informar sobre dado essencial do produto ou serviço.
Art.38 – O ônus da prova da veracidade e correção da informação ou comunicação publicitária cabe a quem as patrocina.