Congonhas – Enquanto retira o pó de minério que encarde sua horta diariamente, Miguel Santana, de 58 anos, pensa no dia em que pisará pela última vez no povoado de Plataforma, a 10 quilômetros do Centro Histórico de Congonhas: “O primeiro morador desse lugarejo foi meu avô, na primeira metade do século passado. Agora, todas as pessoas, infelizmente, vão ter de deixar suas casas, pois os imóveis foram desapropriados para a ampliação (da unidade) da mineradora CSN”, explicou o pequeno fazendeiro enquanto observava seu neto, Neneco, de 6, andar de bicicleta pelas calmas ruas do lugar sem a certeza de que o garoto terá o mesmo prazer na nova moradia.
As cerca de 40 famílias que vivem em Plataforma serão transferidas para um bairro que está sendo construído pela CSN a alguns quilômetros de lá, até o fim de 2012. Plataforma dará lugar a duas pelotizadoras da mineradora, que planeja investir alguns bilhões no município na ampliação de sua unidade. O projeto de expansão afetou a modesta economia do lugar, formada apenas por uma mercearia, onde as vendas despencaram 70%, e uma lanchonete, que fechou as portas em 2010, quando boa parte da população aceitou a indenização da empresa e fez as malas. “Cerca de 100 famílias já foram embora”, calculou Waldir Soares de Castro, de 45.
Nascido e criado no povoado, Waldir é o dono tanto da mercearia quanto da lanchonete. “Suspendi a atividade da lanchonete porque perdi praticamente toda a clientela. Em relação à mercearia, que também funciona como um bar, ainda a mantenho, mas o movimento está irrisório. Estou deixando de faturar de R$ 5 mil a R$ 7 mil com o fechamento de uma e a queda nas vendas na outra”, disse. “Um representante da CSN me disse, em junho, que não há prazo para que a mineradora construa os imóveis comerciais no novo bairro. Ele só disse que a prioridade é erguer casas. Quem vai reparar meu prejuízo?”.
Waldir também teme ficar no limbo, pois perderá os 10 abacateiros que lhe rendem, por safra, cerca de R$ 1,5 mil. O dinheiro pode soar como pequena quantia para muita gente, mas é uma boa grana em Plataforma: “As frutas lotam dois caminhões pequenos”. E os prejuízos de Waldir não param: “Terei de vender as 13 cabeças de gado. Como vou fazer e vender queijos?”, pergunta o homem. O neto, Neneco, atento à conversa, ainda não entende o tamanho do problema que aflige seu avô.
Na prática, a desapropriação em Plataforma, cujo decreto foi assinado pela prefeitura, ocorre em duas etapas. Na primeira, realizada entre 2009 e 2010, cerca de 100 famílias aceitaram a indenização paga pela CSN – o valor oscilou de acordo com o tamanho do terreno e a qualidade do imóvel – e deixaram a área. Na segunda, ocorrerá uma permuta até o fim do ano, com a CSN construindo casas e podendo pagar alguma quantia às famílias. “No meu caso, vou receber uma casa de 85 metros quadrados e apenas R$ 29 mil. O que farei com a criação de porcos e a de galinhas?”, questiona Judith, filha de Waldir e mãe de Neneco.
A jovem Bárbara Francisca Queiroz, de 23, também resiste em sair, embora sua casa, a poucos metros da mina da CSN, seja invadida pela poeira todos os dias. “Estão oferecendo uma casa de 85 metros quadrados. Esta tem 121 metros quadrados. Vamos ficar no prejuízo”, disse, enquanto carregava a filha, Ariane, de três meses. “Ela está com problema respiratório. O médico que a examinou disse que o culpado é o pó de minério”, reclamou Bárbara, desejando saber a data certa da desapropriação.
Indefinição
Em nota encaminhada ao Estado de Minas, a CSN informou que “os moradores serão informados da remoção próximo da data, a ser definida pela empresa. “Os estabelecimentos comerciais, religiosos, a sede da Associação dos Moradores e áreas de lazer terão seus trabalhos iniciados assim que garantida a data de entrega das moradias, em 31 dezembro”. As novas moradias estão sendo construídas em estrutura de aço galvanizado e lã de vidro, com extensão de 85 a 160 metros quadrados.
Já o prefeito de Congonhas, Ânderson Cabido, disse que a indenização paga às famílias que deixaram o povoado na primeira etapa da desapropriação foi “justo, preço de mercado”. Ele assegurou ainda que o novo bairro “será o melhor da cidade, devido à localização, estrutura e qualidade das casas”. (Com Marta Vieira)