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Estado de Minas SECA SEM FIM

Municípios localizados antes e depois da barragem de Três Marias travam disputa pela água

Os dois lados contabilizam perdas no abastecimento e no agronegócio. Na série que teve início na sexta-feira e é encerrada hoje, o Estado de Minas revelou o drama da seca prolongada em várias regiões do estado


postado em 27/07/2014 07:00 / atualizado em 27/07/2014 11:19

Pedro Rocha Franco e Luiz Ribeiro
Enviados especiais


Criticada, Cemig reduziu nível do reservatório localizado na Região Central do estado, que está em 10,18%(foto: Glayston Rodrigues/EM/D.A Press)
Criticada, Cemig reduziu nível do reservatório localizado na Região Central do estado, que está em 10,18% (foto: Glayston Rodrigues/EM/D.A Press)

Pirapora, Três Marias e Morada Nova de Minas – A insuficiência de água no Rio São Francisco estabeleceu uma disputa por água entre os municípios localizados antes e depois da barragem de Três Marias. De um lado, os defensores da redução da vazão para abastecer a represa; do outro, os críticos que clamam por água para garantir o abastecimento e permitir o cultivo de importantes projetos agrícolas no Norte de Minas, como o Jaíba. Lá, novos plantios estão suspensos até o aumento do volume do rio.

Moradores de Pirapora e de outras cidades localizadas depois da represa criticam a atuação da Companhia Energética de Minas Gerais (Cemig) por baixar o volume do rio, interferindo na captação da água e comprometendo a atividade de pescadores, fruticultores e da indústria têxtil. Enquanto isso, os cidadãos dos municípios que antecedem a barragem, como Três Marias, Morada Nova de Minas e Felixlândia, se dizem tão ou mais prejudicados.

Baixa do Rio São Francisco estabelece disputa de água entre municípios mineiro: veja o vídeo!



A disputa foi parar na Justiça, com a Prefeitura de Pirapora protocolando ação civil pública para tentar impedir mais uma vez a redução da vazão da represa de Três Marias. Desde março, a Cemig baixou pela metade a vazão (de 500 para 250 metros cúbicos por segundo) e pretendia reduzir ainda mais, o que foi barrado pela Justiça.

Em acordo de 2001, ano do “apagão”, a prefeitura da cidade e a Cemig tinham definido a manutenção da vazão mínima da represa em 300 metros cúbicos por segundo. A alegação da prefeitura é que a redução poderia comprometer o abastecimento de Pirapora, primeira cidade ribeirinha depois da barragem. Na ação, era pedido prazo de 90 dias para a construção emergencial de um novo sistema de captação. O projeto, concluído mês passado, garante o bombeamento da água, evitando o risco de desabastecimento.

“O que era poupança passou a ser desperdício. A decisão judicial foi desastrosa. O ideal seria manter a defluência, mas foram com muita sede ao rio”, afirma o prefeito de Três Marias, Vicente de Paulo Resende, que classifica como o “pior cenário possível” a situação do rio. Ele e outros prefeitos da região se reuniram na terça-feira em Belo Horizonte com a direção da Cemig para ter mais informações sobre as decisões relacionadas à represa. Em audiência em Pirapora, a empresa energética já havia informado que a vazão poderia ser reduzida para 150 metros cúbicos por segundo em agosto e para 105 metros cúbicos por segundo um mês depois, quase um quinto do normal.

Nadson Martins teme perder tudo o que plantou se o rio baixar mais(foto: Glayston Rodrigues/EM/D.A Press)
Nadson Martins teme perder tudo o que plantou se o rio baixar mais (foto: Glayston Rodrigues/EM/D.A Press)

Na vizinha Morada Nova de Minas, a produção de peixes reduziu-se em um terço no primeiro semestre com a baixa do rio. Situação agravada pela vazão mais alta defendida por Pirapora e as demais cidades depois da represa. Segundo o presidente da Cooperativa dos Piscicultores de Morada Nova de Minas, Onedino Pereira, todos estão preocupados com o que vai ocorrer. “Essa água vai fazer uma falta terrível. Tiraram a nossa camisa, que não serviu para eles”, afirma, recordando que ano passado a mortandade já foi alta.

LAVOURAS SECAS
A produção do Projeto Jaíba, maior perímetro irrigado da América Latina, localizado no Norte de Minas, também é atingida pela redução do nível do rio. A gerência do Distrito de Irrigação do Jaíba encaminhou comunicado aos produtores instalados na área, informando a suspensão de novos plantios até passar o período crítico do baixo volume do Rio São Francisco, problema agravado pela falta de chuvas e pela diminuição da água liberada pelo reservatório de Três Marias, que, atualmente, está com menos de 10% de sua capacidade.

Atualmente, são captados pelo Projeto Jaíba 15 mil litros por segundo, sendo fornecida água para a manutenção dos cerca de 25 mil hectares cultivados, que envolvem cerca de 2 mil produtores. Também estão sendo feitas obras emergenciais para garantir uma quantidade mínima de água para as culturas. Mesmo assim, os produtores estão apreensivos e temem ter prejuízos caso o nível do rio venha baixar muito. O gerente do Distrito de Irrigação do Jaíba, Marcos Medrado, diz que, de abril até agora, o nível do rio baixou três metros. Ele explica que a suspensão temporária do fornecimento de água para novos plantios foi uma medida de segurança para impedir consequências piores, tendo em vista a redução da vazão liberada pela represa de Três Marias. “A suspensão vai até o rio voltar ao normal”, diz Medrado.

Alerta ligado no Noroeste
Na série que teve início na sexta-feira e é encerrada hoje, o Estado de Minas revelou o drama da seca prolongada em várias regiões do estado. Foram percorridos milhares de quilômetros afetados pela forte estiagem deste ano. No Norte e no Jequitinhonha, 136 municípios decretaram emergência. No Sul, a safra de café teve perdas de 30%. Na Região Central, o drama da represa de Três Marias já se reflete em disputas. E no Noroeste, a situação também é preocupante, principalmente para a agricultura. A chuva dos últimos dias em algumas localidades mineiras foi incapaz de reverter o problema.

Ponto de captação no Jaíba: suspensão de novos plantios até passar o período crítico do São Francisco(foto: Codevasf / Divulgação)
Ponto de captação no Jaíba: suspensão de novos plantios até passar o período crítico do São Francisco (foto: Codevasf / Divulgação)

Um dos atingidos pela estiagem é o produtor rural Adelson Rodrigues Cunha, que cultiva soja, feijão, semente de milho e abóbora em área assistida pelas águas do Rio Paracatu, maior afluente do São Francisco, contribuindo com 26% de suas águas, no Noroeste de Minas. Produzindo no mesmo local desde 2002, Adelson observa o baixo nível do rio e diz que não se lembra de já ter enfrentado estiagem parecida. “Essa é a pior seca da década.”

NO LIMITE
Segundo o produtor, a esta altura do ano o nível pluviométrico da região já deveria ter ultrapassado 1 mil milímetros, mas ainda está pouco acima dos 700mm. “As águas do rio já estão abaixo do nível que alcançaram em setembro do ano passado, em pleno período de seca, e não sabemos em qual patamar o Paracatu estará em outubro”, destaca Adelson Cunha.

O agricultor, que está no centro de uma região listada entre as maiores produtoras de grãos do estado, está apreensivo. “Plantei 160 hectares de soja no sequeiro (sem irrigação) e a perda foi de 100%, o que salvou um pouco foi a área irrigada.” Adelson Cunha, que também cultivava, de duas e meia a três safras por ano de cereais, reduziu sua produção para duas colheitas devido à escassez das chuvas.

Também no Noroeste do estado, o agricultor Geraldo Pimentel, presidente do Condomínio de Irrigação Paracatu Entre-Ribeiros, diz que o momento é de alerta, principalmente para os agricultores assistidos pelas águas da sub-bacia do Paracatu. Segundo ele, por falta de água o momento é de atenção na região do Entre-Ribeiros, que reúne 46 lotes de 300 hectares onde são cultivados cana, arroz, feijão, soja e semente de milho. “Os produtores plantam agora apenas duas safras. Há uma década o plantio era realizado em três etapas.”

CONTA-GOTAS
O monitoramento do uso da água também foi intensificado há cerca de três anos, o que resultou em economia de aproximadamente 40% do importante insumo. “Estamos tentando também investir para instalar na região uma estação fluviométrica, que vai nos dar condições de acompanhar o histórico da chuva e o procedimento do rio. Assim, saberemos até onde poderemos ir com o plantio irrigado”, explica Pimentel.

Outra medida para tentar conter o avanço da seca, segundo o produtor, tanto para os assistidos pelo Rio Paracatu quanto pelo Entre-Ribeiros, é a construção de pequenas barraginhas próximas aos córregos, que possibilitam reter a água no período da chuva , com lenta liberação na estiagem”, explica.


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