Há apenas sete meses, a fábrica de Sete Lagoas, na Região Central de Minas Gerais, da multinacional PepsiCo passou a responder pela produção brasileira da batata-frita Lay’s, depois de receber investimentos em know how de última geração na industrialização do produto. Em janeiro, foi a vez de a mineira Sérya Alimentos ligar suas máquinas em Araxá, no Alto Paranaíba, ingressando no sofisticado segmento de especialidades de batatas congeladas, produzidas a partir da batata ralada ou do purê. Orçada em R$ 30 milhões, a empresa conta com o capital e as plataformas de vendas e distribuição da mineira Forno de Minas, tornando-se a primeira empresa brasileira do ramo.
Outra fábrica está sendo erguida no município de Perdizes, distante 50 quilômetros de Araxá, pela indústria mineira de alimentos Bem Brasil. A nova unidade, que deverá iniciar suas operações no segundo semestre do próximo ano, abrindo 380 empregos diretos, mais que dobra a capacidade de produção da companhia, hoje de 100 mil toneladas por ano de batatas pré-fritas congeladas em Araxá.
Se depender da disposição das empresas, a despeito da crise da economia, produtores rurais e indústrias tendem a escrever um capítulo importante das iniciativas em Minas de agregar valor aos chamados produtos básicos. O presidente da Forno de Minas, Helder Mendonça, revela que a intenção dos sócios da Sérya Alimentos é mergulhar nas possibilidades que um mercado novo para o Brasil – o de especialidades – oferece, ainda abastecido de forma predominante pelos produtos importados, com a vantagem de dispor do fornecimento da matéria-prima de qualidade, na prática, às portas da fábrica.
MAIS FRESCAS “Estamos inseridos na maior região produtora e isso permite usar a batata colhida no dia, o que garante frescor ao produto. Possibilita, ainda, o desenvolvimento de produtos para serem assados em casa e a oferta durante todo o ano também nos dá um diferencial frente aos concorrentes estrangeiros”, afirma. Além das duas marcas lançadas pela fábrica, que tem capacidade para produzir 12 mil toneladas por ano, rodando em três turnos com 60 empregados diretos, estão previstos mais dois lançamentos importantes, a batata noisette e a do tipo sorriso, de vários formatos.
Os números do consumo no país são, da mesma forma, animadores para a Bem Brasil. A companhia avalia dia após dia as projeções do mercado, que, em 2014, indicaram volume de 388 mil toneladas de batata pré-frita congelada, representando 4,8% mais na comparação com 2013. A expansão da empresa foi de 6,7% no período, portanto, um desempenho superior ao que teria sido registrado para os produtos importados, de 4,5%. As estimativas iniciais em 2015, que tem se mostrado preocupante devido à piora de alguns indicadores da economia, sugerem 440 mil toneladas do produto, o que significaria alta de 13,4% frente a 2014, acima das estimativas para o crescimento do país.
A coordenadora de Marketing da Bem Brasil, Juliana Monteiro, diz que, apesar dos desafios maiores, a política da empresa visa o desenvolvimento no médio prazo. “Sabemos que quanto maiores são as dificuldades, maiores são a competitividade e a concorrência como desafios”, ressalta. O mercado de batatas processadas é considerado promissor no país. Só o consumo anual de batata palito pré-frita congelada é estimado em 400 mil toneladas, proporcionando receita ao redor de R$ 1,5 bilhão. A cifra inclui batatas chips onduladas, lisas, palha e congeladas.
EFICIÊNCIA NO CAMPO Nas lavouras, a produtividade tem mostrado a que veio, como ponto forte em apoio à cadeia do processamento. A produção por hectare dos bataticultores mineiros tem sido, sistematicamente, superior à média nacional nos últimos 14 anos, com base em dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A expectativa neste ano é de uma colheita de 31.463 quilos por hectare no estado e de 27.903 kg/ha no Brasil. A oferta não seria um problema para a agregação de valor à cultura, na avaliação do superintendente de Política e Economia Agrícola da Secretaria de Estado de Agricultura, Pecuária e Abastecimento, João Ricardo Albanez.
A produção mineira vem gravitando desde 2003 próxima ou um pouco acima de 1 milhão de toneladas por ano, o suficiente para o abastecimento interno e de outros estados. “No que nós precisamos trabalhar é na diferenciação da batata para os diferentes tipos de consumo e isso não é muito internalizado pelo próprio cliente”, afirma. A valorização dos preços, que contribui para tornar mais rentável o agronegócio, é, por sua vez, um indicador do caminho que o estado poderá trilhar na industrialização. Tomando-se como exemplo a batata palha, cada quilo do produto in natura vendido a R$ 1 passa pelo processamento ao custo de produção de R$ 7,50 e o produto final costuma ser vendido ao redor de R$ 10 por quilo.
Sem fogo de palha
Para as pequenas fábricas processadoras de batatas em Minas, as perspectivas de participação mais ativa no mercado envolvem um desenho complexo. Em Ipuiuna, no Sul do estado, batizada como a capital nacional da batata, o industrial Antônio Flávio Dias Assis optou por congelar o plano traçado em 2013 de ampliar o leque de produtos da marca de batata palha Mr. Crisp’s, há 23 anos no mercado. “Os custos aumentaram e a inflação subiu. Tenho receio de investir agora. Prefiro manter os pés no chão num ano considerado perdido.”
A fábrica, que emprega sete pessoas, vinha crescendo 20% ao ano até 2013, quando a produção passou de 200 toneladas, para em 2014 sofrer queda de 20%, influenciada pelo desaquecimento da economia. A estratégia mais acertada, para Flávio Assis, é trabalhar para manter as operações e a qualidade, conservando clientes cativos no Sul do estado e em São Paulo.
Apesar do desaquecimento da economia, a expansão do consumo é vista como promissora, em decorrência da mudança de hábitos da população em busca de praticidade, na avaliação do pesquisador Joaquim Gonçalves de Pádua, da regional do Sul de Minas da Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais (Epamig). “Da batata, aproveita-se quase toda a produção”, afirma.
No estado, a história do processamento de batatas está essencialmente ligada à região Sul, onde a indústria de batata palha nasceu na década passada, já tendo ultrapassado uma centena de fábricas de pequeno e médio porte. Boa parte delas ainda vive na informalidade. João Albanez, da Secretaria de Estado de Agricultura, observa que o cultivo da matéria-prima ocorre em três safras. O Sul mineiro responde 57% da produção na primeira temporada. Já o Alto Paranaíba concentra 44% e 52%, nas duas safras seguintes. (MV)