O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu nesta quinta-feira que as convenções internacionais prevalecem sobre o Código de Defesa do Consumidor em vigência no Brasil para ações que envolvem companhias aéreas internacionais. O placar foi de nove votos a favor e dois contrários.
O recurso extraordinário foi parar no STF, depois de a Air France ter recorrido contra acórdão da 11ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, que entendeu ser inaplicável a Convenção de Varsóvia em caso de extravio da bagagem ocorrido durante transporte aéreo internacional. O entendimento seria o da existência de relação de consumo entre as partes, no caso a companhia e o consumidor.
O primeiro impacto direto da decisão do Supremo, que teve como relator o ministro Gilmar Mendes, impacta o valor das indenizações que as aéreas internacionais têm que pagar quando acionadas na Justiça por algum consumidor que se sinta lesado. Esses valores devem cair, já que a regra internacional estabelece teto para as compensações financeiras, o que não ocorre no caso da norma brasileira.
Além do extravio de bagagem, atrasos em voos também foram contemplados no entendimento do Supremo, em outra ação de relatoria de Roberto Barroso – envolvendo a Air Canadá –, também analisada em conjunto. De acordo com a norma internacional, as indenizações aos passageiros podem ser limitadas. Pelas regras no Brasil, a indenização por danos morais e materiais é mais ampla.
O caso concreto julgado pelos ministros trata de um pedido de indenização de R$ 6 mil feito por uma passageira pelo atraso de 12 horas em um voo internacional. O julgamento teve início em maio de 2014. Na época, os relatores já haviam se posicionado favoravelmente à prevalência das convenções internacionais. Gilmar Mendes entendeu que a defesa do consumidor “não é o único mandamento constitucional” nesse tipo de caso e que a Constituição prevê a observância aos acordos internacionais. Barroso seguiu no mesmo entendimento e ainda citou o artigo 178, que estabelece obediência aos acordos internacionais.
A suspensão da análise ocorreu com o pedido de vista da ministra Rosa Weber. Em seu voto-vista ontem, ela argumentou que “deve ser dada prevalência à concretização dos comandos das convenções de Varsóvia e Montreal, ratificadas pelo Brasil, às quais se confere status supralegal”. Além dos ministros relatores e de Rosa Weber, votaram favoravelmente Edson Fachin, Luiz Fux, Dias Tóffoli, Ricardo Lewandowski e a presidente do STF, Cármen Lúcia.
Foram vencidos os ministros Marco Aurélio Mello e Celso de Mello. Para Marco Aurélio, a relação estabelecida entre a companhia aérea e o passageiro é, na espécie, uma “relação de consumo”. Essa condição traria para reger os eventuais conflitos entre as partes o Código de Defesa do Consumidor. Celso de Mello, por sua vez, considerou que a responsabilidade civil das empresas deve ser balizada pelo código, considerando a má prestação dos serviços.
A reportagem tentou posicionamento do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), mas a expectativa da entidade é de se manifestar hoje sobre a decisão do STF. Já a Proteste – Associação Brasileira de Defesa do Consumidor não retornou o contato do Estado de Minas até o fechamento desta edição.
Consumidores devem ficar atentos
Em nota, o IDEC considerou que o resultado do julgamento “ representa um retrocesso ao direitos dos consumidores brasileiros com um nítido enfraquecimento do CDC”. Para o instituto, houve uma redução de direitos para os consumidores de transporte aéreo internacional com a proteção das companhias internacionais.
“Diante do atual cenário, o Idec orienta que os consumidores fiquem atentos ao novo entendimento para reduzir os efeitos negativos da decisão do STF”.
Veja alguns pontos a serem considerados, segundo o Idec:
- Valor de indenização por perda, furto ou extravio de bagagem. De acordo com o entendimento proferido pelo STF, vale a limitação de 1000 DES ( Direito Especial de Saque, cotação para hoje 4,5061). Caso o consumidor entenda que carrega em sua bagagem valor superior a R$ 4.561,00, deverá fazer a Declaração Especial de Valor, uma espécie de seguro, para garantir a indenização plena.
- O CDC prevê o prazo de 5 anos para ajuizamento de ação de cobrança contra os fornecedores de produto e serviço, agora prevalece o prazo previsto na Convenção de Montreal que é de 2 anos.
- Importante acrescentar que a limitação julgada pelo STF refere-se apenas aos danos materiais, logo, a responsabilidade civil nos casos de danos morais sofridos pelos consumidores não estão sujeitos à limitação.