Na semana em que o governo reviu o rombo fiscal de R$ 139 bilhões para R$ 159 bilhões, o presidente do Insper e ex-secretário de Política Econômica, Marcos Lisboa, diz que, ao contrário do que muitos esperam, a medida não evitará alta de impostos. “Não vamos escapar disso. Demoramos demais a fazer as reformas e vai faltar dinheiro para políticas essenciais.”
ENTREVISTA – Marcos Lisboa, presidente do Insper e ex-secretário de política econômica do Ministério da Fazenda.
Como o senhor avalia a mudança na meta fiscal?
Reflete a severidade da situação do país. Não foi uma surpresa. O preocupante é que a causa dessa situação é o aumento recorrente das despesas obrigatórias, por força de lei, como as regras de reajustes, que vêm aumentando há quase três décadas nos governos federal e estaduais. Esse gasto cresce mais que o PIB há muito tempo. Esse imenso conjunto de leis e obrigações diz quanto e como gastar. Ou fazemos discussões profundas sobre reformas estruturais para interromper esse crescimento ou teremos aumentos recorrentes da carga tributária.
Então, elevar imposto é uma saída?
Não vamos escapar disso. Demoramos demais para fazer as reformas E mesmo aumentando a meta faltará dinheiro para políticas essenciais. Seria melhor que não fosse assim, mas é o custo por demorarmos a reconhecer os problemas. Todos teremos de ir para o sacrifício. Teremos de pagar mais imposto e trabalhar mais para nos aposentar. A questão é como fazer o processo de maneira socialmente justa e equânime, tratando iguais como iguais e protegendo os vulneráveis.
O senhor acha que a reforma da Previdência vai avançar?
A população aposentada cresce 3,5% ao ano. A que trabalha está crescendo 0,7% e em poucos anos vai parar de aumentar. A estimativa é de que em três décadas haverá 6% a menos pessoas trabalhando e 250% a mais de pessoas recebendo benefícios da Previdência. Um número menor de trabalhadores vai sustentar um número duas vezes e meia maior de aposentados. A reforma é urgente.
Por que há tanta resistência?
O que me surpreende é como os grupos resistem em participar do sacrifício para tirar o país da crise. Há uma série de privilégios disseminados na economia. Tem gente com acesso a crédito subsidiado do BNDES, que paga pouco imposto, que é protegido da concorrência externa. Há pessoas que podem se aposentar mais cedo, que têm benefícios maiores, outras que pagam seu aluguel, sua educação. E há pessoas que, além do salário, recebem auxílio-moradia. É um país onde é disseminada a meia-entrada. É preciso ficar claro que, se preservar o privilégio de A, os demais vão pagar.