Mistérios da fé, em estado bruto, lapidados dia a dia pelas orações, trabalho voluntário e crença numa sociedade mais solidária. Há 24 anos, em Piedade dos Gerais, na Região Central do estado, a 106 quilômetros de Belo Horizonte, uma comunidade, hoje com 170 pessoas, vive diretamente sob as bênçãos de Nossa Senhora. É que desde 19 de setembro de 1987 a moradora Marilda Cleonice de Santana, de 36 anos, católica, administradora de empresas com pós-gradução em relações humanas, afirma ter visões da Virgem Maria e receber mensagens dela. A cada domingo, terça e quinta-feira, dia das aparições, o Vale da Imaculada Conceição, na zona rural do município de 4,7 mil habitantes, dá boas-vindas a centenas de novos visitantes, movidos pela espiritualidade ou desejo de mudança de vida. Impossível ficar indiferente às histórias e cenas de emoção, independente da crença. “Quem vem para o vale recebeu um chamado”, conta Marilda, casada e mãe de Maria Clara, de um ano. A partir das aparições, que ocorrem num clima de tranquilidade, jamais de histeria, a santa ficou conhecida como Nossa Senhora “de” Piedade e não “da” Piedade, como se chama a padroeira de Minas.
Piedade dos Gerais – O sino toca, ouvem-se cânticos de louvor e a singela Capela de São Francisco, no Vale da Imaculada Conceição, a um quilômetro do Centro de Piedade dos Gerais, está de portas abertas. Há frio e poeira lá fora, vindos no vento da noite, mas ninguém parece se incomodar. Em poucos minutos, todos os bancos estarão ocupados, com gente de idades, profissões e procedências variadas à espera da mensagem da Virgem Maria. Na última terça-feira, às 20h, não foi diferente. Num clima de fé e calma, a moradora Marilda Cleonice de Santana subiu ao pequeno altar do templo com um buquê de flores vermelhas nas mãos, ajoelhou-se e avisou aos fiéis que Nossa Senhora estava chegando. Palmas calorosas e silêncio imediato para ouvir as palavras, desta vez sobre a importância da família e a necessidade de sua união.
A revelação da mensagem dura exatos 12 minutos e o mais impressionante, nesse período, é que os olhos de Marilda adquirem um brilho especial, não banhado de lágrimas, mas parecendo iluminados. Os olhos não piscam e se direcionam para o meio da capela, onde, segundo Marilda, se encontra a Virgem Maria. Ao fim das palavras, como vem ocorrendo desde 19 de setembro de 1987, quando, aos 12 anos, a moradora diz ter visto Nossa Senhora pela primeira vez, ela descreve as feições da mãe de Jesus: “Nossa Senhora é jovem, tem em torno de 18 anos, 1,70m, pele morena, olhos castanhos-claros quase verdes, cabelos castanhos compridos cobertos por um véu e roupa branca”. Especialmente na terça-feira, a santa carregava um terço dourado nas mãos.
Assim que termina a revelação da mensagem, algumas pessoas cercam Marilda. Homens e mulheres haviam pedido, anteriormente, que ela buscasse respostas com a santa para as aflições do corpo e da alma. Com paciência e doçura, Marilda conversa com todos e sai rápido da capela, afinal a filha Maria Clara a espera.
“Nossa Senhora nunca traz mensagens de medo, sempre de união. São palavras relacionadas ao perdão, amor ao próximo, caridade, fraternidade e silêncio. Mas ela já revelou sobre o fim dos tempos e não do mundo. Há uma perda da religiosidade e a família precisa ser restaurada”, conta. Se a vida é um mistério, o fim da existência tem resposta: “Nossa Senhora diz que a morte é um alívio, libertação. Há vida depois, tanto que ela vem à terra de corpo e alma.”
Vento forte
Na tarde de terça-feira, por volta das 15h, Marilda e pessoas da comunidade acompanharam a equipe do EM à elevação onde a história começou. A caminhada até de cerca de 500m, passando por quadros representando a Via Sacra da Paixão de Cristo, presente de católicos alemães, até uma árvore frondosa. Antes de surgir a comunidade, as terras eram divididas entre a fazenda do avô de Marilda e o sítio do seu pai, Antônio Xavier de Santana. “Era um sábado, por volta das 14h30, e brincávamos na gangorra: eu, com 12 anos, minha irmã Juliana, de 8, e a prima Íris, de 10. De repente, escutamos um barulho, como se fosse de um sino tocando, e surgiu um vento forte. Pensamos que fosse chover e corremos para casa. Mas apareceu uma fumaça azulada e eu vi os pés flutuando. Depois, estava lá Nossa Senhora de corpo inteiro, no meio de muita luz, com a mão no coração. Ficou assim meia hora e depois sumiu no ar”, conta Marilda, diante do lugar da primeira aparição.
“Na época, falaram que era a alma de minha avó, uma mulher que cortava lenha ou um fantasma. Disseram até que eu tinha visto disco voador. E pior, comentaram que eu estava doida”, recorda-se Marilda. Uma semana depois, a 100 metros acima da árvore, houve nova aparição. “Dessa vez, Nossa Senhora estava com uma criança nos braços. Então, perguntei: “Quem é a senhora”? E ela respondeu: “Sou a sua mãe”.
Sem entender direito o sentido das palavras, as meninas perguntaram qual era o nome dela. “Naquele momento, a criança sumiu dos seus braços e, com uma varinha prateada, escreveu no ar: ‘Eu sou a Imaculada Conceição. A mãe de Jesus. Sou Nossa Senhora’. Perguntamos o que desejava, quando apareceu nas mãos uma bola escura com uma cruz brilhante por cima. Depois, ela mostrou uma vela acesa e um buquê de rosas brancas, contendo uma única vermelha ao centro. Pediu que fôssemos à missa, rezássemos muito e estivéssemos naquele local aos sábados às 14h30”.
Com o tempo, as aparições no alto do morro mudaram para o domingo, às 13h, e começaram a ocorrer às terças e quintas, às 20h, na Capela de São Francisco. “Íris nunca mais viu Nossa Senhora e Juliana, por ser enfermeira e trabalhar em hospital, quase nunca pode estar aqui”, observa Marilda, certa de que foi preparada por Deus para essa missão. “A entrega tem que ser maior do que nós mesmos. Não tenho medo, tenho força e coragem.”
Mineira afirma ver e conversar com a Virgem Maria
Em cidade do interior, existe uma pequena comunidade onde ocorrem as aparições. Fiéis seguem orientações da santa