Imagine que você tenha acertado todas as questões do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). Pois esse feito heroico não é garantia de que terá nota máxima na convocação para a segunda etapa do vestibular da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Uma complexa fórmula aplicada pela instituição para fazer a conversão das notas pode provocar distorções e fazer com que você atinja no máximo 61,3 pontos, numa escala de zero a 64. Pior que isso, você pode ser atropelado por um candidato que tenha direito ao programa de bônus no concurso, na prática, os únicos com chance de atingir o topo de pontos na seleção. A polêmica fórmula matemática – batizada de equipercentile ou polinômio de grau 12 – abre brechas para questionamentos sobre os critérios estabelecidos pela UFMG e causa reações em cursos pré-vestibulares. A universidade nega erros e distorções e defende a necessidade do cálculo em nome da transparência do processo seletivo.
O principal problema da equação adotada pela UFMG está nos parâmetros de notas do Enem. Como a fórmula foi publicada em junho, com o edital do vestibular, a universidade estimou a média de desempenho dos estudantes no exame nacional e fixou a escala de zero a 919,1475. Mas, na semana passada, com a divulgação oficial dos resultados das provas, foi observado que a média das notas variou de zero a 852,2. Esse erro de estimativa leva a distorções na conversão da nota e um aluno que acertou todas as questões do Enem, ou seja, atingiu o total de 852,2 pontos na prova, não será capaz de obter nota máxima de 64 pontos nas contas da instituição. O maior valor alcançado na conversão é 61,3.
No Colégio e Pré-Vestibular Bernoulli, campeão de desempenho no Enem em Minas, a falha na fórmula é considerada um “desnivelamento”. “Realmente, parece que a prova vale 61 para uns candidatos e 64 para outros e os alunos com bônus foram os mais beneficiados. O impacto disso não nos preocupa muito, pois os candidatos que ficaram próximos da nota máxima provavelmente serão aprovados, independentemente desse problema. Não creio que haverá injustiças na lista final de aprovados, mas, certamente, haverá mudança na classificação final dos estudantes. Ou seja, o topo do ranking dos aprovados deve ser composto por alunos com o benefício, que, além de conquistar os primeiros lugares, têm a chance de começar os estudos no primeiro semestre letivo”, pondera o diretor de ensino do Bernoulli, o professor de matemática Rommel Fernandes Domingos.
Transparência
A UFMG se defende e descarta a possibilidade de erros. Em nota, alega que a função matemática adotada “é crescente no intervalo [0; 919,1475]. Isso garante que, se um candidato A obteve no Enem uma pontuação superior à de um candidato B, após a conversão a nota do candidato A continuará sendo superior à nota do candidato B”. Questionada sobre a distorção provocada pela aplicação do acréscimo do bônus, a instituição bateu na tecla da transparência do concurso.
“A universidade divulgou a fórmula de conversão das notas do vestibular com a publicação do edital. Isso permitiu que, no ato da inscrição, o candidato tivesse ciência da conversão que seria utilizada, dando assim transparência ao processo. O edital prevê limite máximo de 64 pontos na primeira fase, não podendo, em nenhum caso, ser ultrapassado. No entanto, é impossível garantir que algum candidato vá alcançar o total de 64 pontos, uma vez que isso dependerá dos itens selecionados para compor as provas do Enem e do desempenho dos candidatos nelas”, acrescentou, em nota.
MP na Justiça de novo
O Ministério Público Federal ajuizou nova ação contra o Enem. Desta vez, o procurador da República no Ceará Oscar Costa Filho exige que o Ministério da Educação explique em detalhes os critérios de correção da prova. Ele diz ter recebido vários e-mails com reclamações de candidatos, que não entendem os métodos de pontuação da Teoria de Resposta ao Item (TRI), na qual o exame se baseia. Oscar Costa Filho é autor de outra ação contra o Enem, na qual tentou anular o exame em todo o país em novembro.