Agilidade no trânsito, baixo consumo de combustível, crédito fácil. Os mesmos atrativos que fazem cada vez mais gente optar pelo transporte em motocicleta se tornaram chamariz para ladrões e transformaram as duas rodas em tormento para as vítimas e em desafio para a polícia. Só no ano passado, mais de um terço dos assaltos a estabelecimentos comerciais de Belo Horizonte foram cometidos com a ajuda de motos. O índice alarmante, de 36%, obriga a Polícia Militar a montar estratégia especial para tentar deter o avanço do que se transformou em meio de fuga preferido no mundo do crime. Essa forma de ação é difícil de combater, por ter como principais traços a rapidez na fuga e o anonimato do assaltante, com identidade escondida pelo capacete. E, embora já assustador, o percentual de uso do veículo em assaltos é ainda maior, pois ficam foram da conta de ataques a comerciantes outros delitos, como as chamadas saidinhas de banco.
A partir de hoje, a PM põe na rua várias operações para abordar motociclistas suspeitos e promete tornar investidas em semáforos e nas ruas uma rotina na capital. A operação batizada de Impacto contará com pelo menos três tipos de abordagens, que poderão ocorrer simultaneamente. Será promovida em todas as áreas comerciais da cidade, incluindo as principais vias de acesso a essas regiões. Para isso, foram feitas análises de locais, horários e modo da ação criminosa em cada local.
Nos estudos do comandante do Policiamento da Capital, coronel Rogério Andrade, além do aumento do número de casos de roubo usando moto, foi traçado um perfil dos criminosos: “São homens, atuam em dupla, usam capacete, pilotam motos que têm certa potência e agem armados. Um deles permanece na motocicleta e outro desembarca e rouba o estabelecimento ou a pessoa”, detalha. A grande capacidade de mobilidade e possibilidades de fuga são apontadas também como fator-chave. Os levantamentos constataram que os roubos ocorrem principalmente em grandes corredores de trânsito ou próximo a eles.
Uma das ofensivas da Operação Impacto consiste em ações rápidas nos sinais de trânsito. Enquanto o semáforo estiver vermelho, policiais vão fazer um pente-fino e destacar alguns motociclistas, que serão levados para a lateral da rua ou avenida para averiguação. Militares à paisana do Tático Móvel, Patrulha de Operações e do Grupo de Prevenção Motorizado (GPmor) também ficarão espalhados, observando suspeitos em motos ou aqueles que andam a pé, com capacete na mão.
Viaturas serão adaptadas para receber um sistema de som que servirá de alerta à população. Em determinadas áreas, a polícia passará informando no megafone que uma operação poderá ser desencadeada a qualquer momento – nos semáforos ou com o fechamento de quarteirões inteiros. A ideia é não assustar cidadãos que estiverem no local. “Essa é uma estratégia de segurança para atacar o problema. É necessária uma intervenção diferenciada para obter uma diminuição significativa desse tipo de crime, que passou a envolver moto por causa da versatilidade do veículo”, afirma o coronel.
A implantação do sistema de som tem o apoio da Federação do Comércio de Minas Gerais (Fecomércio). “É preciso tomar medidas para atenuar a situação, uma vez que acabar com o problema é difícil. A moto é hoje um grande perigo, devido à facilidade de locomoção no trânsito”, afirma o presidente da entidade, Lázaro Luiz Gonzaga. O sindicato e a federação dos motociclistas também se reunirão com a PM, a partir de hoje, para firmar parcerias.
Nos bairros, a expectativa é grande. O presidente da Associação de Moradores do Bairro Santo Antônio, Gegê Angelino, destaca a Avenida Prudente de Morais, um importante corredor da capital, como estratégico para a ação da PM. “Temos muita reclamação sobre a criminalidade na região envolvendo motoqueiros e garupeiros e estamos preocupados, pois a avenida, que tem um trânsito fortíssimo, passou a ser ligação para vários bairros e isso facilita a fuga dos bandidos”, relata.
Ofensiva rápida espalha o medo
Em agosto do ano passado, Alexandre Teixeira, de 38 anos, sobreviveu a dois tiros depois de ser assaltado no Restaurante Maurício, onde trabalha com o pai, José Maurício Teixeira, de 55 anos. A ação dos ladrões durou três minutos e dois segundos, como mostrou uma das câmeras do circuito interno de vigilância do estabelecimento, apontada para a rua. Dois assaltantes chegaram a pé, usaram o capacete para esconder o revólver e fugiram em uma motocicleta YBR de cor escura. “Moto é fácil de trocar a placa e de desovar depois do crime. Eu, que nunca tive medo de moto, fiquei com pavor. Não posso ver uma parada na esquina que acho que serei abordado”, diz o empresário, que costumava participar de enduros na juventude. Seis meses depois, os dois bandidos continuam soltos e Alexandre sofreu a última cirurgia na perna para retirar os estilhaços de bala, mas já está trabalhando normalmente. “Só pensava em ficar vivo para cuidar dos meus dois filhos”, completa ele, que reagiu ao assalto, o sétimo em seis anos do restaurante, além de 15 arrombamentos.
“Eu estava na lanchonete quando vi que a moto avançou o sinal da Avenida do Contorno (com Rua Gonçalves Dias) e percebi que era assalto. Na hora, liguei para a polícia do celular. Tentei ver a placa, mas o cara tirou um adesivo do tanque de gasolina e tapou a identificação”, conta o representante comercial L.C.P., de 35 anos. Ele conversava com conhecidos em uma lanchonete, às 13h30, quando presenciou uma saidinha de banco praticada com a ajuda de motocicleta em plena Avenida do Contorno, há cerca de 15 dias. Segundo ele, o empresário atravessava na faixa de pedestres com cerca de R$ 5,5 mil quando foi abordado pelo garupa da moto, que levou o dinheiro, pulou de volta na moto e fugiu com o comparsa, ambos com a identidade oculta pelo capacete. Segundo os comerciantes da região, foram registradas nove saidinhas de banco nos últimos três meses no mesmo ponto.
Interior
Os trabalhos que serão implementados em BH tiveram origem no Centro-Oeste mineiro, onde o coronel que agora está à frente do CPC atuou. O programa contou com a participação de 51 municípios, onde foram feitas várias blitzes. Nelas, o motoqueiro era orientado a parar, desligar o veículo, tirar o capacete e levantar o braço direito. A ideia é orientar os condutores para que o procedimento se repita na capital. As autoescolas também serão alvo da PM.
Memória
São Paulo tentou proibir a garupa
O governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), vetou no fim do ano passado projeto de lei que proibia as motocicletas de levarem passageiros na garupa. A proposta, aprovada pela Assembleia Legislativa no fim de novembro, proibia que os garupeiros fossem carregados nos dias úteis nas cidades paulistas com mais de 1 milhão de habitantes. Na ocasião, o governador chegou a afirmar que não seriam medidas como essa que diminuiriam a criminalidade, mas sim a atuação da Polícia Militar.
São Paulo tentou proibir a garupa
O governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), vetou no fim do ano passado projeto de lei que proibia as motocicletas de levarem passageiros na garupa. A proposta, aprovada pela Assembleia Legislativa no fim de novembro, proibia que os garupeiros fossem carregados nos dias úteis nas cidades paulistas com mais de 1 milhão de habitantes. Na ocasião, o governador chegou a afirmar que não seriam medidas como essa que diminuiriam a criminalidade, mas sim a atuação da Polícia Militar.