Além Paraíba e Guidoval – “Ah, mamãe, tá muito difícil.” Com bico na boca, o caçula Carlos Vítor, de 4 anos, tenta explicar o que sente no 16º dia em um abrigo de Guidoval, depois de sua casa perder o telhado e de todos os pertences dos pais serem carregados pelo Rio Xopotó no dia 2. Está difícil mesmo. Nas palavras de moradores dos dois municípios mais afetados pelas chuvas na Zona da Mata – a terra de Carlos Vítor e Além Paraíba –, a reconstrução da infraestrutura urbana parece distante. Mais de 10 dias depois das tragédias, o desafio ainda é de retomar o básico: conseguir água e comida, dar faxina, tirar documentos, arranjar roupas, vacinar.
O cenário ainda é de muita destruição nos dois municípios, por onde se espalham pontes rompidas, casas derrubadas, postes de energia quebrados, barrancos desmoronados e muito barro. Moradores se esforçam para limpar casas e ruas. Põem móveis para secar, improvisam portas, janelas e telhados, tentam salvar o que restou. Quem perdeu tudo olha para o lote onde ficava a casa ou o comércio e ainda não consegue acreditar no que ocorreu. Chora, sem ter a mínima ideia de como recomeçar. Nas ruas, tratores, escavadeiras e caminhões tiram entulhos e abrem caminhos. “Vamos ter de construir uma nova Guidoval”, diz a dona de casa Cássia Maria Oliveira, de 30, mãe de Carlos Vítor.
Enquanto a Defesa Civil, municipal e estadual, monitora a possibilidade de novas tragédias e articula respostas às já ocorridas, o Corpo de Bombeiros percorre casas e avalia estruturas. O Exército improvisa pontes. Equipes dos municípios e a Força de Saúde, formada por voluntários cadastrados pelo estado, visitam os moradores, aplicam vacinas, prestam socorros e alertam sobre o risco de doenças trazidas pela mistura de águas e esgoto. Sem noção do perigo, crianças pisam em poças de água contaminada nas ruas destruídas. Em Guidoval, já há oito suspeitas de leptospirose e três de dengue, além de casos de diarreia e vômito.
A grandes terrenos nos dois municípios chegam doações de todo o país. São roupas, sapatos e material de higiene e limpeza, além de cestas básicas. Mas faltam roupas de cama, toalhas, colchões. Nos mesmos espaços, Polícia Civil, Caixa Econômica Federal e Ministério do Trabalho fornecem carteiras de identidade e de trabalho e CPF. Quem ficou sem teto é levado para abrigos nas duas cidades. Enquanto as crianças brincam em quadras esportivas, os pais se ajeitam como podem entre as carteiras escolares.
RECURSOS Os dois municípios ainda não conseguiram as verbas prometidas pelo governo federal para ações emergenciais. Os R$ 30 milhões liberados para Minas dependem de uma série de exigências, como lei municipal e CNPJ. Guidoval perdeu o prazo de inscrição no Banco do Brasil para receber o dinheiro de plástico. Segundo o coordenador municipal da Defesa Civil, Sílvio Vardieri, a falta de acessos viários a outras cidades impediu a prefeitura de conseguir documentos necessários para o cadastro.
Mas, com a flexibilização de prazos, Guidoval completou a inscrição e aguarda a verba. A prefeitura calcula que precisará de pelo menos R$ 20 milhões para reconstruir o município. Na conta, não entram R$ 18 milhões já licitados pelo DER-MG para construção de uma ponte. Sem a ligação, que foi arrastada pelo Xopotó, a cidade ficou dividida. A previsão é de que a construção da nova ponte comece na próxima semana e fique pronta em cinco meses.