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Estado de Minas

Pré-carnaval deixa rastro de destruição em um dos cartões postais de BH

Mais de 10 mil pessoas foram à Praça da Liberdade e causaram estragos ao patrimônio. PBH licenciou evento, mas diz que vai multar produtores


postado em 14/02/2012 06:00 / atualizado em 14/02/2012 08:48

Na manhã de segunda-feira o que se viu foi lixo espalhado e plantas e grama pisoteados pela multidão(foto: Maria Tereza Correia/EM/D.A PRESS)
Na manhã de segunda-feira o que se viu foi lixo espalhado e plantas e grama pisoteados pela multidão (foto: Maria Tereza Correia/EM/D.A PRESS)

 

Grama destruída, canteiros danificados, luminária arrancada, lixo espalhado, cheiro de urina por todo lado e lustres roubados no Museu das Minas e do Metal. A Praça da Liberdade, na Região Centro-Sul, ainda está com as marcas do show da banda carioca Monobloco, que levou cerca de 10 mil de pessoas ao local na noite de domingo como parte do 1º Concurso Mineiro de Marchinhas de Carnaval, promovido por uma empresa particular. O evento foi licenciado pela Prefeitura de Belo Horizonte (PBH) e o Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico (Iepha/MG), já que a praça é tombada.

Contudo, a PBH afirma que a produtora do evento não informou que haveria apresentação da banda do Rio de Janeiro, maior atrativo da noite, conforme divulgação ampla dos meios de comunicação. Alegando desconhecer o porte do espetáculo pré-carnavalesco, a prefeitura promete multar em cerca de R$ 1,2 mil a empresa Sleep Walkers, responsável pelo show. O motivo da infração é “realizar evento em logradouro público em desconformidade com a licença ou com as normas”, conforme o Código de Posturas.

O diretor da Sleep Walkers, produtora do 1º Concurso Mineiro de Marchinhas de Carnaval, Henrique Torres Chaves, rebateu a informação dada pela prefeitura dizendo que durante a reunião da Comissão de Monitoramento da Violência em Eventos Esportivos e Culturais (Comovec) deixou claro para todas as autoridades que a atração principal seria o Monobloco.

Luminária não suportou a pressão do público que lotou a praça(foto: Maria Tereza Correia/EM/D.A PRESS)
Luminária não suportou a pressão do público que lotou a praça (foto: Maria Tereza Correia/EM/D.A PRESS)
O Estado de Minas constatou que, antes mesmo das atrações do fim da semana na Praça da Liberdade, a Regional Centro-Sul já havia enviado, em 6 de fevereiro, uma orientação a diversos órgãos pedindo a suspensão de eventos em cinco locais da cidade: as praças da Liberdade (Funcionários/Lourdes) e do Papa (Mangabeiras), os parques JK (Sion) e da Barragem Santa Lúcia (Santa Lúcia) e o Bairro Belvedere.

O comunicado diz que a suspensão dos agendamentos foi orientada já que está em “fase de aprovação a minuta de instruções normativas que definirá os critérios para licenciamento, bem parecidos com os que disciplinam o uso da Praça da Estação”. Ainda segundo o texto do e-mail, “estava havendo uma sobrecarga de eventos nesses locais e esta decisão foi no intuito de minimizar os impactos”.

Um dos destinatários do comunicado foi o Iepha, responsável pelo tombamento da Praça da Liberdade, que garante já trabalhar seguindo a orientação. “Quando recebi o comunicado, o concurso de marchinhas já estava licenciado. A partir de agora, se chegar alguma solicitação de evento na praça, responderei com o e-mail da PBH”, diz o diretor de Conservação e Restauração do Iepha, Renato César José de Souza.

Quando questionada sobre a orientação dada por sua gerente de Licenciamento, Alzira Lima, pedindo a suspensão de eventos nesses locais, a Regional-Centro Sul negou, mas admitiu que há estudos internos para padronizar os eventos e garantir o que pode ou não ocorrer nos bairros. De acordo com a Regional, os licenciamentos estão ocorrendo normalmente.

Manhã de limpeza

Enquanto a situação não se resolve, a segunda-feira na Praça da Liberdade foi para contabilizar os prejuízos do domingo. Um poste que faz parte do patrimônio cultural foi derrubado durante os shows e a grama em alguns canteiros foi destruída. “A impressão é de que estamos em um curral”, disse a esteticista Marília Gonçalves, de 51 anos, que fazia caminhada pela manhã. Funcionários de uma empresa contratada pela Vale, responsável pela manutenção da praça, garantiram que no início do dia outra empresa fez a limpeza do local, reunindo dezenas de sacos de lixo.

Mas a reportagem constatou que ainda restavam vários pontos sujos, cheios de garrafas, pedaços de plásticos e cacos de vidro.Até a tarde dessa segunda-feira, a Vale ainda não havia sido comunicada pela PBH sobre os danos causados ao local. Segundo a assesssoria de imprensa da empresa, a vistoria sempre é feita pelo poder público municipal. “Antes de cada evento, é firmado um termo de responsabilidade entre os promotores do evento e a prefeitura”, informaram.

O diretor da Sleep Walkers, Henrique Torres Chaves, garantiu que a empresa vai arcar com todos os reparos necessários e avaliou como positivo o evento. “Tivemos pouquíssimas ocorrências policiais e os danos são facilmente recuperados. O poste não quebrou, apenas tombou, bastando recolocá-lo no lugar. É claro que sempre tiramos algo para melhorar, mas todos que participaram elogiaram o evento”, diz Henrique.

A situação preocupa a Associação dos Amigos da Praça da Liberdade (Apraliber). O presidente da entidade, Aroaldo de Macedo, dise que vai procurar a Prefeitura de Belo Horizonte e a Polícia Militar para que sejam tomadas providências de forma a evitar a degradação do espaço público.

(foto: Tulio Santos/EM/D.A Press)
(foto: Tulio Santos/EM/D.A Press)


Praça não suporta megaeventos

Os produtores culturais de Belo Horizonte são unânimes em afirmar que a Praça da Liberdade não comporta grandes eventos – no máximo, um público de 4 mil pessoas. Na tarde de ontem, a empresária Luciana Salles, diretora da Bangalô Produções, esteve no local, numa visita técnica para futuro evento. “Antes de mais nada, é preciso especificar bem o perfil da atração que se quer trazer para cá. Na Liberdade, a música deve ser mais tranquila devido às características do espaço, um bem tombado pelo patrimônio. O Monobloco, por exemplo, não se enquadra nesse perfil”, afirmou Luciana. Ela relembra duas experiências que a deixaram “tensa” na Praça da Liberdade. “Em 2005, tivemos os shows de Yamandú Costa e do Grupo Uakti, ambos com cerca de 4 mil pessoas. Felizmente, não tivemos problema algum, mas é uma tensão”, conta.

O produtor cultural Kuru Lima, da Cria Cultura, concorda com que cada espaço público deve receber um determinado tipo de atração. “Não se pode fazer um evento em qualquer lugar”, pondera. O planejamento das atrações com antecedência também é fundamental para o sucesso da empreitada e Kuru defende que os órgãos responsáveis pelo licenciamento publiquem uma cartilha com todos os passos. Vendo com bons olhos a regulamentação dos shows em espaços públicos, Kuru pede, antes de tudo, “que o assunto seja discutido com os produtores culturais”. (GW)

Análise da notícia
Apenas uma pergunta - Andréa Castello Branco

É uma pena que em meio ao apelo da população e da classe artística para que os espaços públicos de Belo Horizonte sejam democratizados, uma praça da cidade seja utilizada de forma completamente equivocada com o aval da prefeitura. A depredação da Praça da Liberdade nos faz tirar algumas conclusões. A primeira, e mais óbvia, é a carência de espaços públicos para grandes eventos na capital. A segunda é o despreparo dos órgãos públicos na hora de licenciar os eventos. No mundo inteiro, parques e praças – várias delas patrimônios históricos – recebem espetáculos que democratizam o acesso à cultura. A diferença é que pelas bandas de lá a primeira pergunta é: “Qual o público previsto?” A PBH dizer que desconhecia o porte do show é a prova máxima de que os responsáveis pelo licenciamento não fizeram esse questionamento primário e não sabem dimensionar o alcance de público do Monobloco. Ao ameaçar proibir shows em várias praças, a PBH comete o velho erro de jogar a criança fora junto com a água do banho.


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