A fé dos católicos do interior ajudou a manter Minas Gerais entre os nove estados com mais seguidores da igreja romana. Enquanto em todo o país o número de pessoas que se declarou católica caiu de 73,6% em 2000 para 64,6% em 2010 (queda de nove pontos percentuais), em Minas a diminuição foi menor, de 78,7% para 70,4% (-8,3 pontos percentuais). Os dados são do Censo IBGE 2010, divulgado ontem, que mostram também que a população católica na área rural mineira (84,8%) ficou acima da média nacional (77,8%). Já a população urbana católica também é maior no estado (67,9%) do que no país (62,1%). Enquanto isso, Belo Horizonte tem distribuição ainda mais igualitária de crenças, com 59,9% de católicos, 25,1% evangélicos, 8% sem religião e 4,1% espíritas.
De acordo com a demógrafa Luciene Longo, do IBGE, Minas tem um histórico de população católica e por isso mantém maioria considerável de fiéis dessa religião, apesar de acompanhar a queda nacional. “Essa foi a maior redução católica de todos os censos, puxada principalmente pelo aumento de evangélicos”, destaca. Levando-se em conta as pesquisas de 2000 e de 2010, a fé evangélica cresceu 48,5% no estado, passando de 13,6% para 20,2%. O espiritismo teve crescimento de 30% em 10 anos, passando de 1,6% para 2,1% dos mineiros. Para ela, um dos fatores mais importantes para frear a queda ra dos católicos foi a resistência dos fiéis no interior de Minas. “O estado tem uma área rural extensa e importante na estatística, o que o destacou da média nacional”, afirma a especialista.
A dificuldade da Igreja Católica em manter seu rebanho é reflexo da falta de alcance da instituição milenar, avalia o professor Flávio Senra, chefe do Departamento de Ciências da Religião da PUC Minas. “Evangélicos são mais ágeis e agregam com mais facilidade tecnologias e meios modernos de comunicação. Enquanto uma liderança católica leva cerca de sete anos para ser formada, uma igreja pode ser aberta em dois anos, numa rua perto da casa das pessoas”, compara.
Outro problema enfrentado pelos padres e bispos é que a mensagem católica atinge menos pessoas. “Os evangélicos assumiram um discurso que ajuda a enfrentar problemas de hoje, questões econômicas e afetivas. Tendem a ter mais acolhimento à moralidade vigente. Os padres falam para o coletivo”, diz. Um fator curioso são os dogmas católicos, que entram em conflito com os costumes modernos, como planejamento familiar e aborto, mas não estão entre os motivos mais importantes para essa redução de fiéis. “Os católicos simplesmente não seguem esses preceitos. Muitos são contra, discordam, mas isso não é suficiente para abandonar a religião”, considera Senra.
Maior concentração de espíritas no Triângulo
O Triângulo Mineiro é a região do Brasil com maior concentração de espíritas, de acordo com o Censo 2010. Para a demógrafa do IBGE Luciene Longo, os trabalhos do médium Chico Xavier (1910-2002) em Uberaba e cidades próximas foi fundamental para isso. O presidente da União Espírita Mineira, Marival Veloso de Matos, considera que o médium foi o maior disseminador da doutrina no país. “Lá (Chico Xavier) desempenhou um trabalho notável, psicografando várias obras literárias e, mais que isso, dando o exemplo da caridade. Por coincidência, amanhã (hoje) completa 10 anos que ele desercarnou”, ressalta.
A religião, apesar de pequena, abrangendo apenas 2% da população mineira, está empatada em segundo lugar entre as praticadas por pessoas que recebem as mais altas remunerações salariais (mais de 10 salários), empatada com a evangélica, com 7,5% da preferência. Os católicos são 73,2% de quem recebe a partir dessa faixa. Entre as pessoas que têm curso superior os espíritas também chegam próximos dos evangélicos, com 7,5% contra 11,5%. Mais uma vez os católicos são maioria dos diplomados, com 73,2%.
Para o presidente da União Espírita Mineira, o fato de pessoas com maior grau de instrução estarem procurando suas respostas interiores na doutrina espírita tem relação com a tripé em que o espiritismo se apoia. “Ele é baseado na trilogia ciência, filosofia e religião. São três aspectos que precisam de estudo.
Conjunto de princípios e leis revelados por espíritos superiores, por meio das obras de Allan Kardec (1804-1869), o espiritismo ganhou grande número de adeptos no Triângulo Mineiro, de acordo com dados do IBGE. Segundo Marival, há duas razões especiais para isso. “O médium Eurípedes Barsanulfo (1880-1918) nasceu nessa região, ajudando muitas pessoas durante esse tempo”, conta.
Foi em busca desse exemplo de caridade e da evolução espiritual que, ontem, a dona de casa Solange Gonçalves dos Reis, de 48 anos, foi ao Centro Espírita Oriente, no Bairro Floresta, Região Leste da capital. “Via necessidade de tratar do espírito. Aqui encontrei respostas que a religião católica não me dava. Depois que a Gabriela nasceu com síndrome de Down passei a questionar muitas coisas”, ressalta, ao lado da filha, de 12 anos. (MP e FA)