O problema com as antenas de telefonia celular móvel – estações de rádio base (ERBs), que envolve muita discussão em Belo Horizonte, onde há 280 delas irregulares, 26% do total em funcionamento (1.079) – rompe os limites do município. Moradores de Nova Lima, na região metropolitana da capital, denunciaram e a prefeitura da cidade vizinha embargou a instalação de um desses equipamentos. “É algo raro, uma vitória”, classifica a promotora do Ministério Público Estadual (MP) Josely Ramos Pontes, que pede, na Justiça, a retirada imediata das antenas clandestinas em funcionamento na capital mineira, onde há cerca de 840 delas, segundo estimativas da Secretaria Municipal de Meio Ambiente. Preocupados com os supostos prejuízos à saúde causados pela radiação eletromagnética dos equipamentos, moradores de BH lutam para expulsar os indesejáveis vizinhos.
Em Nova Lima, a antena estava sendo erguida em um lote do Condomínio Vila do Conde, no Bairro do Conde, e seria posta a serviço da operadora Claro. Na semana passada, a proprietária do terreno vizinho, a dentista Virgínia Melgaço Silveira, de 28 anos, acionou a prefeitura, que constatou que a obra não tinha alvará para construção nem licença ambiental, requisitos fixados nos Códigos de Posturas e Obras do município. Os condôminos contrataram uma advogada, que ontem interpôs ação judicial na Vara Cível da comarca local para impedir que a obra prossiga e para que seja demolido o que já foi construído. “O pessoal está indignado com a situação. A antena (que seria instalada na torre) desvaloriza minha propriedade, bem como o condomínio. Visualmente, é algo feio. Além disso, é cancerígeno”, queixa-se Virgínia. A ação interposta na Justiça de Nova Lima também alega que a radiação emitida pela antenas podem acarretar danos à saúde. “Há estudos no sentido de que elas aumentam a incidência de câncer nas pessoas que vivem ao redor”, reforça a advogada Mariana Capanema.
Na tentativa de ganhar o apoio dos condôminos, a Claro lhes entregou uma cartilha em que contesta essa controversa tese. “Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), nenhum efeito à saúde humana causado pelo sinal emitido pelas antenas de telecomunicações foi verificado”, afirma a cartilha. A explicação não convenceu os moradores. “O texto tenta ludibriar as pessoas. Já é de praxe essas operadoras de telefonia instalarem antenas sem as devidas licenças, sem se preocuparem com o bem-estar ou a opinião de quem mora em volta”, critica Mariana.
O posicionamento da Claro é compartilhado pela Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), que regulamenta as normas técnicas de estações rádio base (ERB), nas quais são instaladas uma ou mais antenas de telefonia celular. A Anatel argumenta que “as evidências não indicam” que ondas eletromagnéticas provenientes de ERBs “causem doenças específicas, como leucemia e outros canceres, efeitos adversos na reprodução ou problemas comuns, como dor de cabeça, fadiga e insônia”, afirma um texto publicado no site da estatal (www.anatel.gov.br). Apesar disso, a agência menciona que, em 2011, a OMS classificou o uso do celular como “possivelmente cancerígeno”. A estatal admite que “não é possível afirmar que o uso intenso do telefone celular não cause câncer” e “mais estudos devem ser realizados”.
Pesquisa
Uma pesquisa desenvolvida pela engenheira sanitária Adilza Condessa Dode, defendida em 2010 em sua tese de doutorado na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), sugeriu uma relação entre óbitos causadas por câncer e os geradores de sinais de telefones móveis na capital mineira. As principais vítimas seriam moradores de áreas localizadas num raio distante até 500 metros das antenas. A pesquisadora reconhece limitações do estudo, como o fato de não ter controlado os hábitos de quem morava perto das antenas. “Mas não temos dúvida de que a radiação eletromagnética causa câncer. Vamos esperar as pessoas morrerem para restringirmos esse tipo de tecnologia?”, questiona Adilza.
BELVEDERE, O PARAÍSO DELAS
Algumas associações pressionam vereadores para propor regras mais restritivas para a instalação de ERBs e participam de audiências públicas sobre o assunto realizadas na Câmara Municipal de BH. Em uma delas, em agosto de 2011, compareceram representantes da Associação dos Amigos do Bairro Belvedere, Região Centro-Sul da capital. “A aprovação (da licença de funcionamento das antenas) não passa pela população. Só somos avisados quando a ERB está pronta para ser instalada”, reclama o presidente da associação, Ubirajara Pires Glória. O Belvedere tem 45 ERBs, das quais quatro não são licenciadas. Uma delas, vizinha de residências, ocupa o número 492 da Rua Paulo Camilo Pena, na esquina com a Avenida Celso Porfírio. A prefeitura não informou por que a estrutura é irregular.
No Belvedere, assim como em outros bairros, muitos edifícios alugam suas coberturas e fachadas para a instalação de antenas pelas operadoras. A lei municipal determina que os equipamentos tenham “harmonização estética” com a construção e que “as emissões de ondas eletromagnéticas não sejam direcionadas para o interior da edificação”. Ubirajara aponta um prédio cujo topo está tomado por antenas, na Rua José Antônio Azeredo. “Naquele edifício, o condomínio custava mais de R$ 2 mil e caiu para R$ 700, depois da instalação dos equipamentos. O ser humano não pode ver dinheiro que corre para pegar. Ninguém tem consciência que a radiação da antena causa dano a si mesmo e ao seu vizinho”, diz.
O comerciante Renato Rossi mora com a família em um apartamento na Rua José Antônio Azeredo. Diante de sua varanda, há pelo menos três antenas montadas na fachada e na cobertura de outro prédio. “Elas estão viradas para meu apartamento. Temo principalmente pela saúde dos meus filhos. Já pensei em vender o imóvel. Ninguém provou que essas ondas eletromagnéticas não são nocivas à saúde”, diz Renato. A mulher dele, a decoradora Ângela Rossi, se diz “superpreocupada”: “Eu já tive um tumor na tireoide. A gente morre de medo.”