De acordo com o chefe da sala de imprensa da PM, major Gilmar Luciano dos Santos, o comandante-geral da corporação, Márcio Martins Sant'ana, se reuniu com os comandantes de batalhões para discutir o problema. Os flagrantes feitos pelo EM em Belo Horizonte e Contagem, segundo ele, vão contribuir para apurar casos desse tipo, que já são de conhecimento da polícia.
Segundo a corporação, as práticas denunciadas configuram desvio de conduta, conforme a Lei Estadual 14.310, de 2002 (Código de Conduta Ética dos Militares do Estado de Minas Gerais), e o Decreto 43.885/2004, que dispõe sobre o código de conduta ética do servidor público da alta administração estadual. Policiais que agem dessa forma “contrariam o interesse público e as diretrizes emanadas pelo comando da corporação”, informa a PM, ressaltando que é sua missão orientar, recomendar, proibir e punir condutas que desviem o militar de sua função, garantindo rigor nas apurações por parte dos comandantes de batalhões e da Corregedoria.
Por meio de nota, o comando da PM disse ainda que o desvio de conduta denunciado pela reportagem envolve um número inexpressivo de agentes e não representa o comportamento da maioria dos 45 mil militares no estado. “O fato, inclusive, causou desconforto e repúdio em toda a corporação. A PM orienta que, tão logo o comerciante perceba situações irregulares envolvendo policiais militares, denuncie, imediatamente, à Corregedoria ou pelo Disque-Denúncia Unificado 181”, orienta a corporação, lembrando que o denunciante não precisa se identificar e que receberá senha para acompanhar o andamento das investigações pela internet.
A PM informou ainda que todos os militares são orientados a manter contatos diretos com a população, inclusive os comerciantes, com objetivo de reforçar a rede de segurança pública e estreitar os laços de convivência harmoniosa, dentro da filosofia de polícia comunitária. “Essa aproximação, que deve ser estritamente profissional, tem o objetivo de prevenir e reprimir delitos, dentro do conceito de beneficiar toda a comunidade. Obviamente, essa relação saudável entre policiais militares e a comunidade não permite que os profissionais de segurança pública exijam quaisquer benefícios a seu favor, ainda que lhes sejam oferecidos espontaneamente, sendo-lhes vedado receber mimos, brindes, cortesias, agrados ou benefícios de quaisquer natureza”, esclareceu a PM.
A aceitação ou conivência do comerciante com a prática é considerada antiética pela PM, e pode configurar crime. A postura, informa a corporação, “acaba estimulando a impunidade, o desvio de conduta e, principalmente, dificultando o trabalho de apuração e correição para com os transgressores”. Dos 10 estabelecimentos visitados pelo EM, seis permitem que os PMs consumam irrestritamente produtos que comercializam, dois preparam kits de lanches para os militares e dois alegaram que são pressionados pelos PMs.
Policiais que se beneficiam de alimentação e agrados para favorecer a segurança em dado estabelecimento ferem também o Código Penal. Constranger comerciantes é crime de concussão, com pena de reclusão, de dois a oito anos, e multa. Já servidores públicos que se corrompem para receber favores incorrem em corrupção passiva. Comerciantes que oferecem benefícios praticam corrupção ativa. Os dois crimes são punidos com pena de reclusão, de dois a 12 anos, e multa.
Análise da notícia
Rigor para preservar cidadãos e policiais
Roney Garcia
Há práticas arraigadas que não são menos questionáveis apenas por serem antigas. A atitude de policiais que se valem do emprego público para obter vantagens, entre elas alimentação gratuita, é de conhecimento da própria corporação, que a repudia. É preciso agir com rigor para separar os militares que justificam o título – a maioria, conforme atesta a própria PMMG – daqueles que usam a farda como uma espécie de vale-refeição, uma forma de intimidar comerciantes ou de acenar com qualquer tipo de benefício em troca do lanche gratuito ou de outros mimos. Mesmo porque o tempo dedicado a essas “parcerias” é tempo furtado de quem não tem o que oferecer ou dos que se recusam a ser coniventes. Ainda que sejam minoria, os responsáveis por essas atitudes agem valendo-se de uniformes, armas e divisas que lhes são confiados pela sociedade. São, naquele momento, representantes da Polícia Militar de Minas Gerais diante do cidadão. Identificando-os, a PM protege não só o contribuinte, mas a própria imagem e a da maioria dos seus comandados.