Flávia Ayer
Considerada preocupante pela própria administração pública, a situação, além de interferir no equilíbrio climático, aponta, segundo especialistas, a origem de um dos principais problemas que desafiam Belo Horizonte: as inundações. Não por acaso, as áreas críticas abrangem lugares onde ruas e avenidas já se transformaram em um mar de água, lama e sujeira. A mancha vermelha indicando estado máximo de atenção envolve, por exemplo, as avenidas Cristiano Machado, que corta a Região Nordeste e Norte – refém da força do Ribeirão do Onça –, e a Tereza Cristina, na Região Oeste. Depois de ser tomada pelo Ribeirão Arrudas, a via teve registro de três mortes no réveillon 2008/2009, e volta e meia é invadida pelas águas.
As taxas de impermeabilidade mais baixas, de até 30%, correspondem a pouco mais que um quinto (22%) de BH. Embora a prefeitura ainda não tenha estabelecido a relação direta entre o avanço da impermeabilidade do solo e as inundações, Marcus Vinícius Polignano, coordenador do Projeto Manuelzão, da UFMG, voltado para a preservação da Bacia do Rio das Velhas, reforça a relação entre esses dois fatores e a necessidade de soluções para o problema. “Quanto maior a área impermeável, maior é o escoamento de água e a sua velocidade. Como ela não consegue penetrar no solo, acaba escoando em grande quantidade. É preciso pensar em formas para que essa água ‘excedente’ seja captada e absorvida”, adverte.
Professor aposentado do Instituto de Geociências da UFMG, Friedrich Renger explica o processo que culminou no retrato de uma BH árida, impermeável e suscetível a inundações. “As casas, com suas hortas e quintais, estão sendo derrubadas e transformadas em prédios. Paralelamente, nossa rede de drenagem pluvial é muito antiga”, comenta.
AQUÍFEROS A preocupação que o estudo da PBH sobre impermeabilização desperta vai além das inundações e suas consequências. Segundo o levantamento, as regiões com maior taxa de impermeabilidade são justamente aquelas em que, originalmente, a água teria maior potencial de infiltração no solo. “Normalmente, as construções aumentam com maior velocidade especialmente nas áreas mais planas da cidade, que são também as mais favoráveis à infiltração da água”, ressalta Friedrich Renger. “Com isso, em vez de se autodepurar pela penetração no solo, a água sai lavando o asfalto e levando toda essa poluição difusa – lixo, poeira, graxa, combustíveis – para dentro dos cursos d’água”, completa Polignano.
A secretária municipal adjunta de Planejamento Urbano da Prefeitura de BH, Ana Paula Chaves Lemos, explica que o mapeamento das áreas impermeáveis foi o primeiro de uma série que irá nortear mudanças na legislação e estímulos para manutenção de áreas em que a água não encontra dificuldade de se infiltrar. “O mapa demonstra que temos que tomar cuidado e ficar atentos em relação a essa situação. Vamos cruzar as informações com outros mapas, como de declividade e ocupações irregulares, para, no ano que vem, durante a Conferência Municipal de Política Urbana, propormos alterações na Lei de Parcelamento, Ocupação e Uso do Solo”, afirma.
O gerente de Legislação e Gestão Urbana da pasta, José Júlio Vieira, afirma que as primeiras análises do mapa mostram que as áreas mais impermeáveis coincidem com regiões onde há mais ocupação irregular e residências. “É mais difícil para o poder público exercer um controle sobre esses terrenos particulares. Já temos um artigo na lei atualmente que incentiva a manutenção de áreas permeáveis na frente do terreno, como forma de facilitar o trabalho do fiscal”, ressalta. Vieira acrescenta que o fato de ruas e avenidas serem praticamente 100% resistentes à infiltração hídrica contribui consideravelmente para o aumento da taxa de impermeabilidade de BH.