O desafio nas mãos dos órgãos responsáveis extrapola os 10 municípios avaliados pelo sindicato. Segundo dados da Secretaria de Estado de Saúde, obtidos ontem pelo EM, nos últimos dois anos houve aumento de 11% na distribuição de clonazepam em todo o estado. Em 2010 foram 68,9 milhões de pílulas para toda a rede pública mineira, quantidade que passou para 76,5 milhões no ano passado. Já o crescimento da população no estado não passou de 7% em 10 anos, chegando a 19 milhões de moradores. De acordo com dados da Agência Nacional de Vigilância Sanitária, o ansiolítico é o mais consumido em Minas desde 2009. As doses podem causar dependência e efeitos colaterais, como sonolência, dificuldade de aprendizagem, perda de memória e até parada cardíaca.
Prescrito para o tratamento de ansiedade, início de depressão e insônia, o remédio é tarja-preta e só pode ser adquirido com receita. “O que está ocorrendo nesses lugares?”, questiona o presidente do CRM-MG, João Batista Gomes Soares. Segundo ele, a entidade vai analisar como está sendo prescrita a medicação nessas cidades. “São números assustadores e preocupantes. Temos que levantar quais especialidades médicas estão por trás disso”, afirma, dizendo ainda que autoridades devem também tentar entender o que está ocorrendo com a saúde mental da população desses municípios.
A realidade já incomoda a Secretaria de Estado da Saúde, que pretende se aproximar mais da classe médica nessas localidades, para tentar entender o motivo do alto consumo. “Uma distribuição de 76 milhões de comprimidos em um ano em todo o estado é alta”, admite Leandro Oliveira Iannotta, referência técnica em Saúde Mental da SES. Sobre a falta de psiquiatras nesses municípios, Leandro afirma que há profissionais em cidades polo ou maiores.
Para o psiquiatra Fernando Portela, da Associação Brasileira de Psiquiatria, o problema é muito mais complexo. “É preciso uma investigação profunda, porque há muita falsificação de receita. A polícia também tem que entrar nessa história”, afirma, acrescentando que é preciso ainda apurar quantos e quais profissionais estão prescrevendo a droga nesses municípios.
Capital
Em BH, onde 8,6 milhões de comprimidos foram consumidos só em 2012, com projeção de 17 milhões de unidades neste ano, a gerente de assistência da Secretaria Municipal de Saúde (SMSA), Maria Luisa Tostes, admite dificuldade de controlar o consumo de Rivotril, uma vez que o órgão não tem como limitar o ato médico. “O que podemos fazer é informar a população sobre os riscos e cobrar dos profissionais consciência na prescrição. É fundamental que entidades, faculdades e associações de medicina se unam. Hoje, qualquer médico receita a medicação, independente da especialidade.”
CONSUMO CONTROLADO
Por meio de nota, a Roche, fabricante do Rivotril, esclareceu que o medicamento só pode ser prescrito por médicos, com receita retida e controlada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). A empresa reforça que segue estritamente as normas da Anvisa. “Rivotril® (clonazepam) deve ser utilizado conforme orientações da bula, sempre com prescrição e acompanhamento médicos, portanto a Roche não recomenda e não apoia o uso indiscriminado do medicamento por qualquer paciente”. Sobre o consumo, a empresa disse ainda que o volume de vendas e número de receituários do medicamento estão se mantendo estáveis nos últimos cinco anos.