Nessa terça-feira, a Corregedoria da Polícia Civil esteve em dois endereços do delegado, no Bairro Buritis, Região Oeste da capital, para conversar com moradores e recolher provas do relacionamento conturbado entre o policial e a adolescente. O carro onde o casal estava, no domingo, também foi periciado, mas nenhuma informação foi divulgada. Pessoas próximas dizem que A. e Toledo moravam no mesmo prédio e que o envolvimento começou nesta época, quando A. tinha apenas 14 anos e vivia com a família. Depois da mudança da mãe e do padrasto para Conselheiro Lafaiete, ela alugou um quarto num apartamento no Bairro Estrela Dalva, mas manteve o envolvimento com o delegado.
A agressão teria ocorrido na tarde de 19 de março. A. fez um registro às 21h11 na delegacia do Bairro Estoril. À polícia, ela contou que namorava Toledo havia mais de um ano e que os dois chegaram a morar juntos por seis meses, mas ela havia se mudado havia 15 dias. Naquela tarde, ela teria ido ao apartamento dele buscar pertences e foi seguida por ele, que a agrediu com chutes e socos.
A adolescente quebrou pelo menos um dedo e chegou a ser atendida no HPS. Dezesseis horas depois, na Delegacia Especializada de Atendimento à Pessoa Deficiente e ao Idoso, onde Toledo trabalhava, ele também registrou ocorrência: acusava A. de ter tentado invadir seu prédio e arranhar seu carro. O delegado afirmava que a menina tinha “um amor platônico desde que eram vizinhos” e disse que conseguiu conter a moça, segurando-a pelo pulso.
A jovem chegou a ser incluída no Serviço de Prevenção à Violência Doméstica, da Polícia Militar, e recebeu duas visitas dos policiais, em 20 e 23 de março, quando disse ter sido agredida em três ocasiões. Ela também admitiu ter encontrado o policial, no dia anterior à visita dos PMs, para assinar um termo de desistência da queixa que ela tinha feito contra ele. Dois dias depois, por causa das brigas frequentes, a adolescente fez as malas e voltou para a casa da mãe. “Teve um dia em que ela reclamou que os dois tinham brigado e encontrou o namorado jogando as roupas dela da janela do apartamento onde ele morava”, contou uma funcionária de outra loja do shopping.
A primeira ocorrência na polícia foi feita em 16 de janeiro, quando Toledo registrou ameaça por causa de “um amor não correspondido”, também na delegacia onde ele trabalhava. Segundo o boletim, a adolescente teria entrado no apartamento dele e furtado um revólver calibre 38, com cinco balas, além de um smartphone. “Eles brigavam muito. Posso garantir que ela nunca fez nada contra ele”, disse outra pessoa com quem A. trabalhou.
Ex-namorada
Estudante de engenharia civil e corretora de imóveis, Paula Rafaella Maciel, de 24, diz que namorou Toledo por quatro anos, até agosto do ano passado. Segundo ela, os dois continuam amigos e foi na casa dela que ele passou a noite de domingo, depois do incidente em Ouro Preto. “Ele chegou transtornado, chorando muito. Me contou que foi buscar um pen drive com A., que ela furtou com o revólver, e que ela não quis sair do carro, dizendo que voltaria para BH com ele. Por isso, ele mesmo tirou a chave e saiu do carro. Foi quando ela desceu também, tirou uma arma da bolsa e disparou”, explica a ex-namorada, que também prestou depoimento. “Se ele quisesse matá-la, teria levado ao hospital? Só não ficou porque estava desesperado.”
Confusão
Pouco antes de se entregar, no entanto, o delegado tentou comprar um capacete no Shopping Oiapoque, no Centro de BH, mas se recusou a pagar o valor cobrado e ofendeu uma vendedora. Ele foi retirado pelos seguranças e as imagens gravadas pelas câmeras de segurança mostram quando Toledo retorna, se apresentando como delegado. Testemunhas dizem que ele estava armado e gritava muito. Recentemente, também deu “carteirada” para entrar com a adolescente numa boate no Bairro Funcionários. Diante da recusa dos empregados da casa, afirmou que a menor era responsabilidade dele.
A ex-namorada de Toledo afirma que conheceu A. em um dos seus “ataques” de ciúme. “Para mim, A. sofria de algum transtorno psicológico. Ela dizia que ameaçava Toledo de morte. Logo depois, dizia que o amava e que iria se matar se ele não a quisesse.” Paula aparece como testemunha da agressão física e diz que não houve nada daquilo. “Acabamos passando a nos falar e fui com ela ao hospital e à delegacia, mas ela estava bem e não falava nada com coerência sobre a agressão, porque era mentira. Naquele dia, ela ficou escondida na porta e não queria deixá-lo sair para jogar sinuca com os amigos”.
Mãe de um colega de A., também morador do Buritis, X. conta que os amigos incentivavam a adolescente a procurar a polícia. “Ela achava que era amor. Ele a puxava pelo braço, gritava com ela e essa cena se repetiu muitas vezes no shopping, mas ela achava que ele estava correndo atrás. Na verdade, pela idade dele, ele a manipulava e se relacionava com ela desde os 14 anos, quando ela era só uma menina.”
Acusado fica na ativa
O delegado Toledo está na ativa, na Delegacia de Proteção à Pessoa Deficiente e ao Idoso, mas responde a processos por prevaricação, falsidade ideológica, formação de quadrilha, desacato e lesão corporal. Segundo o secretário de Estado de Defesa Social, Rômulo Ferraz, a lei respalda o agente público investigado. “Há casos que trazem preocupação e a legislação precisa ser aprimorada. Tem de haver possibilidade de afastamento em determinadas situações”, diz. Esse é um dos pontos que deve ser enviado à Assembleia Legislativa para ser redefinido pela Lei Orgânica. Ferraz descarta possibilidade de corporativismo na proteção ao delegado: “A Corregedoria da Polícia Civil é muito séria e não há nenhum tipo de facilitação”.
Para o coordenador do Centro de Estudos em Criminalidade e Segurança Pública (Crisp) da UFMG, Cláudio Beato, o sistema de controle das corporações é falho. A corregedoria, segundo ele, não é proativa nem tem liberdade de investigar. “O ideal é que o funcionário público, principalmente uma autoridade, fique encostado enquanto as suspeitas são investigadas, mas, até que se prove o contrário, ele é inocente”, lembra.
Romance de luxo
Álvaro Fraga
Uma garota alegre, apaixonada pelo delegado Geraldo Toledo Neto e seduzida pela vida de luxo e glamour que levava ao lado dele. Esta é, em resumo, a história que a adolescente A.L.S., de 17 anos, conta em seu perfil no Facebook, recheado de fotos que retratam momentos românticos do casal. Enquanto amigos do policial insistem em afirmar que os dois nunca tiveram qualquer tipo de envolvimento, o perfil da adolescente, que continua internada em estado grave no Hospital de Pronto-Socorro João XXIII, mostra justamente o contrário.
Em uma das fotos, por exemplo, a garota aparece sentada na moto importada do policial. Em outra, no interior de um carro conversível. Numa terceira, um detalhe que chama a atenção: no capacete preso à motocicleta, uma pequena placa com os nomes dos dois, decorada com corações. Os desenhos românticos também enfeitam as costas do delegado, em outra imagem. Feitos com caneta colorida e revelando um homem feliz ao lado da namorada, os desenhos revelam que o casal tinha grande intimidade. Merecem destaque também as fotos que mostram o casal bebendo e brindando.
Por fim, há uma foto postada em 4 de abril, na qual o policial está em meio a um grupo de amigos que seguram um cartaz pedindo à jovem para voltar para BH. No fim de março, depois de registrar queixa de agressão contra o policial e de acusá-lo de ter quebrado sua mão direita, a garota voltou para Conselheiro Lafaiete, onde permaneceu até domingo, dia em que foi baleada na cabeça.