“Achei que tinha sido uma batida de caminhão, mas a minha vizinha já foi avisando que uma árvore caiu sobre o prédio”, conta. Foi da portaria do edifício que ela teve noção do que tinha ocorrido. Após a chuva da madrugada, uma castanheira de 10 metros de altura desmoronou do outro lado da Rua Visconde do Rio das Velhas, no Bairro Vila Paris, Centro-Sul da capital mineira, e parte dos galhos perfurou as paredes, indo parar dentro do imóvel de Mirtes.
Na queda, a árvore de grande porte apanhou a fiação elétrica, atingiu as paredes de tijolos do prédio, quebrou janelas em dois andares e só parou ao esmagar completamente as grades de metal da garagem do edifício, bloqueando a saída dos carros. O susto que a professora e seus vizinhos passaram tem algo em comum com quem mora ou circula em outros locais onde árvores foram ao solo e trouxeram pânico e destruição: todos afirmam que a Prefeitura de Belo Horizonte (PBH) foi alertada para esse perigo, mas não tomou providências. A PBH informou que sem protocolos de atendimento não tem como checar o que de fato ocorreu.
Entre 2009 e 2014, a PBH e a Cemig inventariaram 300 mil árvores (dois terços do total da capital mineira) pelo Programa Especial de Manejo Integrado de Árvores e Redes (Premiar), segundo a empresa, mas para que a situação das 150 mil árvores restantes seja conhecida, a Cemig informa que será necessário formalizar um novo contrato. O problema é tão grave para a concessionária de energia elétrica que, por ano, a Cemig calcula que ocorram 25 mil interrupções de fornecimento causadas pelo choque de árvores contra a rede de distribuição e postes – média diária de 68 ocorrências.
A falta de energia foi o menor dos problemas para a professora aposentada Mirtes Borges e seus vizinhos. A ponta da árvore que caiu sobre a parede de tijolos a perfurou, perpassando o armário de brinquedos e roupas do quarto onde dorme a neta de Mirtes. Gavetas com peças de roupas, vestidos de bonecas e brinquedos cor-de-rosa foram violentamente atirados para todos os cantos do quarto, como se um terremoto tivesse passado por lá. Em outros dois quartos, as vidraças foram espatifadas e camas, sofás, mesas e um violoncelo foram atingidos. “Na hora, fiquei em choque, sem saber o que tinha ocorrido. Ainda bem que minha filha e minha neta estão viajando”, disse.
RECLAMAÇÕES Outra vizinha, que teve os vidros da sala quebrados pela violência da queda da árvore, foi a também professora aposentada Fátima Seixas, de 63. “Se a árvore caísse cinco minutos antes poderia ter atingido um carro onde o pai levava as filhas gêmeas de 2 anos de idade para a escola. Aí seria uma tragédia”, conta. De acordo com informações de Fátima e de vários moradores da rua, em 2015, os jardineiros contratados por um dos edifícios alertou os moradores de que a castanheira estava em risco iminente de desabar.
“A prefeitura foi alertada, enviou um técnico aqui, mas ele disse que não havia perigo. Será que a árvore apodreceu de dois anos para cá?”, indaga a mulher, sobre a provável causa do desabamento, mas sem apresentar um protocolo de atendimento municipal. As raízes da árvore pareciam em processo de putrefação e um grande buraco se formou sob ela, sobretudo devido à grande pressão da tubulação da Copasa, que foi rompida com a queda da árvore. Os bombeiros levaram cerca de cinco horas para liberar a via. Enquanto isso, o fornecimento de eletricidade teve de ser cortado.
O mesmo problema pode ter feito com que uma árvore de nove metros desabasse sobre a rede elétrica e bloqueasse a Rua Doutor Juvenal Santos, no Bairro Vila Paris, na mesma região, por volta das 7h30 de ontem. Enquanto os bombeiros cortavam a árvore em toras menores, moradores também reclamavam de falta de prevenção da administração municipal. “É um absurdo mobilizar os bombeiros pela cidade inteira para cortar árvores, porque a PBH não fez seu trabalho preventivo”, protestou o aposentado Alcindo Paulo Moura Pereira da Silva, de 75. Aqui a gente nem se assusta mais. Nos últimos seis anos caíram várias árvores. Ali adiante mesmo tem uma que está podre, com as raízes já na fundação do prédio e tão altas que se tornam reservatórios de dengue, criatórios de baratas e escorpiões”, reclama.
PRAÇA 7 Nem mesmo na Praça 7, marco do Hipercentro da capital mineira que fica a pouco mais de 500 metros da sede da PBH, a situação das árvores é melhor. No domingo, uma árvore enorme caiu durante as chuvas da tarde, bloqueando a via no sentido Mangabeiras, atingindo e destruindo dois automóveis que passavam naquele momento.
Ontem, dois caminhões eram usados para recolher as toras que foram fracionadas pelas motosserras dos bombeiros. Parte do quarteirão Xacriabá da Praça 7 foi interditado, enquanto os trabalhadores incumbidos de remover os pedaços da árvore reclamavam do prazo que lhes foi dado para esse serviço. “Em meia hora é impossível tirar isso tudo daqui”, diziam, alegando pressão das autoridades municipais. “É preocupante e imediato que a situação dessas árvores seja conhecida e sanada. Por toda a cidade vejo árvores de grande porte caindo, na região dos hospitais, no Centro, no Barro Preto. Será que isso só vai parar quando ocorrer uma tragédia?”, perguntava o empresário Walter Santana Lago, de 55, impressionado ao ver o tamanho da árvore que caiu numa região que durante a semana comporta o tráfego de cerca de 1,5 milhão de pessoas, segundo a Polícia Militar.