André Shalders
Brasília – A posse de imóvel em Brasília não impede que deputados federais recebam auxílio-moradia pago pelo contribuinte, no valor de R$ 3,8 mil mensais. Levantamento elaborado pelo Estado de Minas com base em dados do portal da Câmara e da Justiça Eleitoral encontrou 19 parlamentares que recebem o benefício, mesmo possuindo casas, apartamentos ou flats na capital da República, conforme declarações feitas à Justiça Eleitoral em 2010, disponíveis no site do TSE na internet. Do início da atual legislatura, em 2011, até fevereiro, o desperdício de dinheiro público alcançou a cifra de R$ 2,743 milhões. O valor seria suficiente, por exemplo, para a compra de 23 casas populares do programa Minha Casa, Minha Vida. Apesar do custo elevado, a Câmara não tem nenhuma norma que impeça o acúmulo.
Pelas regras, o pagamento do auxílio-moradia pode ser feito diretamente ao parlamentar, em espécie, ou na modalidade de reembolso, mediante apresentação das notas de hotéis ou aluguéis de imóveis. Segundo a 4ª Secretaria da Mesa, responsável pela gestão da ajuda de custo, cada parlamentar pode utilizar o benefício da forma que preferir, inclusive para o pagamento de prestações de imóveis. Dos 19 parlamentares com imóvel em Brasília, 17 optaram por receber o benefício em espécie. Atualmente, 196 recebem o auxílio-moradia, com custo anual de cerca de R$ 8,9 milhões. Entre eles, não há nenhum integrante da bancada do Distrito Federal, que tradicionalmente abre mão do benefício.
O titular da 4ª Secretaria, deputado Antônio Carlos Biffi (PT-MS), disse que os parlamentares reclamam frequentemente do valor do benefício. “É pouco para os parlamentares, mas o custo é muito alto para a Casa”, disse ele. “Em relação aos que possuem imóvel em Brasília, é preciso averiguar se há alguma ilegalidade. Vamos estudar essa questão no âmbito da 4ª Secretaria. É preciso dar um jeito nisso”, completou. Atualmente, o órgão trabalha para ampliar o número de apartamentos funcionais disponíveis para os deputados, o que reduziria custos. “A diferença é de quase R$ 1,6 mil por mês, por deputado. O processo burocrático junto ao GDF está encaminhado para reformar mais algumas unidades”, afirmou. No total, a Câmara possui 432 apartamentos funcionais, mas apenas 310 estão habitáveis.
Farra
A situação envolve parlamentares de nove legendas, sendo que sete dos 19 estão filiados ao PMDB (veja quadro). Quadras no Plano Piloto e os apart-hotéis à beira do lago estão entre os endereços favoritos dos parlamentares. Um dos deputados, o peemedebista Osvaldo Reis (TO), declarou em 2010 possuir dois apartamentos em Águas Claras, sendo um deles uma cobertura. “Não existe democracia sem um Poder Legislativo forte e atuante, mas a verdade é que, hoje, ele tem um custo extremamente elevado para o contribuinte. Alguns desses gastos são desnecessários”, opinou o deputado federal José Antônio Reguffe (PDT-DF).
O deputado Eduardo Sciarra (PSD-PR) confirmou possuir apartamento em Brasília, mas disse utilizar o auxílio exclusivamente para o pagamento de despesas correntes do imóvel, como luz, água e IPTU. Jair Bolsonaro (PP-RJ) lembrou que a prática não é vedada pela Casa. “Portanto, nada tenho do que me defender”, argumentou. O parlamentar comentou ainda sobre os militares, que enfrentam dificuldades por falta de benefício similar. “Não peço para eles um valor igual ao nosso, mas nada é um escárnio”, escreveu, por e-mail. Já Danilo Forte disse que o apartamento no Sudoeste pertence hoje a uma ex-esposa. “Nós nunca fizemos a partilha, por isso ficou no meu nome. Mas quem usa é ela. Comprei esse imóvel quando me elegi senador e me mudei com a família para Brasília”. Os demais parlamentares não responderam aos contatos da reportagem.