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Estado de Minas Crise política

Reforma ministerial fica mais próxima, com disputa à presidência da Câmara

Pressão por mudanças nos comandos dos ministérios aumenta, mas trocas ainda dependerão de incertezas na economia, que só devem clarear em 2021


26/12/2020 04:00 - atualizado 26/12/2020 07:18

Próximo do presidente da República, o chanceler Ernesto Araújo deve ser trocado do Itamaraty como sinal de diálogo na área externa (foto: Eric Baradat/AFP - 11/9/19)
Próximo do presidente da República, o chanceler Ernesto Araújo deve ser trocado do Itamaraty como sinal de diálogo na área externa (foto: Eric Baradat/AFP - 11/9/19)

 
Brasília – Na tentativa de aglutinar apoio no Congresso e pavimentar o caminho para a reeleição, o presidente Jair Bolsonaro deverá mudar a cara da Esplanada. O presidente não conseguirá fugir de ao menos uma pequena reforma ministerial, já que é desejo do chefe do Executivo emplacar nomes no comando das duas Casas legislativas a partir de fevereiro de 2021. A medida tornou-se essencial para que o governo leve à frente sua agenda nos últimos anos de mandato. 

Embora negue a prática de distribuição de cargos do governo em troca de apoio político, Bolsonaro necessita do apoio do Centrão, que também faturou nas eleições municipais. As concessões de maior calibre e a questão da definição da base política do governo poderão ocorrer no começo de março, caso o candidato preferido do governo ao pleito, Arthur Lira (PP-AL), saia eleito na Câmara dos Deputados. Entre as pastas cobiçadas, estão as que detêm os maiores orçamentos, como o Ministério da Saúde, chefiado pelo general Eduardo Pazuello; o da Cidadania, de Onyx Lorenzoni, e o da Educação, de Milton Ribeiro. 

Apesar de Bolsonaro já ter se adiantado afirmando que não abrirá mão de Ernesto Araújo no Itamaraty e de Ricardo Salles no Meio Ambiente, as pastas também estão na mira. A saída deles é vista como um sinal de diálogo com a comunidade internacional, nas áreas de política externa e ambiental.  

No primeiro escalão íntimo do governo, ainda se ventila nos bastidores a transferência do ministro da Secretaria de Governo, general Luiz Eduardo Ramos, para o posto da Secretaria-Geral da Presidência, com a ida de Jorge Oliveira para o Tribunal de Contas da União em janeiro. Os ministérios de Paulo Guedes (Economia), Tereza Cristina (Agricultura, Pecuária e Abastecimento), Tarcísio Freitas (Infraestrutura), Fernando Azevedo (Defesa), general Augusto Heleno (Segurança Institucional), Braga Netto (Casa Civil), Fábio Faria (Comunicações) e Rogério Marinho (Desenvolvimento Regional) devem ficar de fora da barganha. 
O ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, poderá ser também substituído na linha dos novos ventos sobre o Palário do Planalto (foto: Sérgio Lima/AFP - 23/8/19)
O ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, poderá ser também substituído na linha dos novos ventos sobre o Palário do Planalto (foto: Sérgio Lima/AFP - 23/8/19)

Leva e traz 

O pontapé na mudança dos ministérios foi dado no último dia 9, com a saída de Marcelo Álvaro Antônio do Turismo. Um desentendimento com Luiz Eduardo Ramos adiantou sua partida. Apesar de Gilson Machado, ex-presidente da Agência Brasileira de Promoção Internacional do Turismo (Embratur), ter sido nomeado para comandá-la, a pasta também pode entrar na dança das cadeiras no começo do próximo ano. 

No Congresso, o tema da reforma ministerial é levado em conta, mas com certas ponderações. Deputados e senadores favoráveis ao presidente da República destacam os bons resultados de Bolsonaro nas recentes pesquisas de opinião. Para eles, isso mostra que o chefe do Executivo ainda tem bala na agulha para monopolizar a batuta do governo. Com capacidade política de manobra, a expectativa é que o time não mude, ou que não mude o suficiente para que as alterações assumam as dimensões esperadas. O principal problema é a incerteza econômica provocada pela pandemia do coronavírus, que pode alterar o cenário.  

Ainda é difícil, para muitos, mensurar o tamanho da turbulência que o país enfrentará logo nos primeiros meses de 2021. Por isso, alguns avaliam que seria necessário esperar mais tempo para fazer previsões  certeiras e entender a profundidade de possíveis mudanças. Apesar disso, existe consenso de que nomes como o do presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), possam trazer melhor mobilidade para Bolsonaro nas duas Casas legislativas, mesmo que o presidente da Repúblicar não leve a melhor nas eleições das respectivas mesas diretoras, por exemplo. E as eleições no Parlamento são, justamente, o segundo fator de incerteza quando o assunto é a reforma ministerial. 

Outra variável apontada, desta vez para a necessidade de uma reforma, é a presença do Centrão no governo. Bolsonaro não se envolveu o suficiente com as eleições municipais e saiu enfraquecido do pleito. Consequentemente, ficou mais dependente dos partidos do time de Arthur Lira (PP-AL), tanto para se manter no poder e conservar o relacionamento com o Congresso, quanto para abrir caminho para a reeleição em 2022, no momento uma das prioridades do mandatário do país. 

O líder do governo no Congresso, senador Eduardo Gomes (MDB-TO), está entre os que destacam que “não existe a obrigatoriedade de uma reforma ministerial”. Para ele, a população avalia de forma positiva a presidência de Bolsonaro, “apesar do momento difícil que o Brasil está vivendo”. “Diferentemente do que muitos imaginam, apesar do momento, Jair Bolsonaro mantém índices favoráveis de aprovação. Então, é o presidente, cabe a ele fazer essa análise”, argumenta o parlamentar. Para o tocantinense, o desempenho da economia é que dará o peso para as mudanças. 
 
General Luiz Eduardo Ramos não sairá do batalhão de frente do Palácio do Planalto, mas deve troca Secretaria de Governo pela Secretaria da Presidência (foto: Evaristo Sá/AFP - 4/7/19)
General Luiz Eduardo Ramos não sairá do batalhão de frente do Palácio do Planalto, mas deve troca Secretaria de Governo pela Secretaria da Presidência (foto: Evaristo Sá/AFP - 4/7/19)
 

Cobrança

Na avaliação do deputado Afonso Florence (PT-BA), vice-líder da minoria, porém, o calcanhar de aquiles do presidente da República é a economia. Ele destaca que não há previsão de continuidade do auxílio emergencial, o que também trará dificuldades. Florence coloca como certa a necessidade de uma reforma que possa amarrar o governo, que, mesmo bem avaliado, deve perder tônus muscular nos primeiros meses do próximo ano. Ele afirma, ainda, que o Centrão tem espaços para ocupar, e não deve dar sossego ao Executivo. 

“Bolsonaro já tem uma sustentação parlamentar sólida com o Centrão. Mas, o Centrão não controla todos os cargos que pretende controlar. Todo mundo sabe disso. Sou dos que acham que Jair Bolsonaro precisa dessa base para governar. Senão, ele cai. A quantidade de crimes de responsabilidade que já cometeu, e agora com o problema das vacinas e das seringas, é delicado. E o Centrão vai cobrar caro esse apoio, essa blindagem”, pondera Florence.

Articulação inclui blindar filhos 

Está em voga também a blindagem política aos filhos do presidente Jair Bolsonaro, em especial o senador Flávio (Republicanos-RJ), filho “01”, investigado por suposto esquema de rachadinhas (apropriação de parcela de salários de servidores de gabinetes do Legislativo). É o que avalia o cientista político Fernando Luiz Abrucio, da Fundação Getulio Vargas (FGV-SP). 

“A preocupação de Bolsonaro tem a ver com ele e os filhos. Ele não tem uma agenda para o Congresso. O governo não se preocupa muito com políticas públicas. Na agenda econômica, quem se embaralha mais é ele. Manda PEC sem dizer qual é a prioridade; a reforma administrativa é um Frankestein. Essa do voto impresso não passa. É só pra plateia ver. A de armas também não. A preocupação dele com a Casa nasceu em 18 de junho deste ano, quando Queiroz (Fabrício Queiroz, ex-funcionário de Flávio Bolsonaro, e suposto operador do sistema de rachadinhas) foi preso”, acrescenta. 

O presidente teme o impeachment e, no Senado, o que pode acontecer com seu filho, conta. “Percebeu o risco e, nessa linha, ele poderá entregar todos os cargos que tiver. Abandona até aqueles dos quais disse que não abriria mão. Não tem ninguém seguro com Bolsonaro, por mais que ele diga”, completa. 

Em outro cenário, caso o candidato do Plantalto perca a eleição do Congresso, Bolsonaro poderá optar por distribuir ao Centrão cargos suficientes para não sofrer o risco de processo de impeachment. “Vai lotear os cargos secundários. Os grandes postos, só se conseguir ganhar. Essa reforma só acontecerá antes da votação caso tenha muita certeza de que terá maioria. Passará por pressão forte em janeiro com a pandemia, a vacina.” 

Por fim, Fernando Abrucio ressalta que, de qualquer maneira, o governo federal terá que gastar muitas fichas para tentar chegar aos seus objetivos. “Significaria aumentar a contradição entre o discurso da pré-campanha e o governo que apresentará no dia seguinte: a cara da velha política”, conclui.

Cenário fica mais difícil para 2022

Se o país voltar a sentir impacto na economia, devido à crise provocada pelo novo coronavírus, forte o suficiente para refletir na aprovação de Bolsonaro, a incapacidade do governo de entregar as promessas que fez à população em 2018 poderá inflamar ainda mais o cenário para a reforma ministerial. Isso tornaria ainda mais forte a dependência de Bolsonaro em relação ao Centrão. Um dos exemplos é o ministro da Economia, Paulo Guedes, cujo discurso mais recente foi o de que não prometeria mais nada. 

Porém, o aumento da dependência do governo à maioria do Parlamento será mais um caso em que o chefe do Executivo age diferentemente do que prometeu aos eleitores em seu discurso de campanha. O líder da minoria na Câmara, Afonso Florence (PT-BA), aponta ministérios que podem sofrer mudanças. Para o parlamentar, o do Meio Ambiente, das Relações Exteriores e o da Saúde são pastas mais prováveis de passar por mudanças.  

Vice-líder do bloco parlamentar PL, PP, PSD, Solidariedade e Avante, o deputado Marcelo Ramos (PL-AM) também está entre os que veem a reforma como provável. Ele acredita que o movimento do governo será na direção de “dar consistência política aos ministérios”. Ramos aponta idiossincrasias. Um exemplo é a presença do DEM, que é um partido independente, no governo, enquanto outras legendas mais leiais não têm espaço.  

“Acho que o presidente vai tentar dar mais consistência política para o ministério dele. Isso significa ocupar espaços com lideranças de partidos. O DEM, que é oposição, tem dois ministérios, o da Agricultura e o da Cidadania. O primeiro desafio do presidente, porém, quem quer que seja o próximo presidente da Câmara, é repactuar uma relação de harmonia”, afirma.  

O cientista político Ricardo Ismael, da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ), ressalta que a reforma ministerial dependerá do desfecho da eleição na Câmara. “Pensando no projeto de reeleição, Bolsonaro percebeu que não pode fazer a mesma estratégia de 2018, quando tinha discurso descolado do sistema político. Está mais dependente de buscar apoio de partidos na base do governo. A opção pelo Centrão deve permanecer até 2022”, destaca. 

Pela reeleição, o mandatário precisará alavancar a economia e melhorar ainda as áreas da saúde, meio ambiente e de relacionamento exterior, que podem influenciar nesse crescimento de sua popularidade, enfatiza Ricardo Ismael. “As pautas do Salles e do Ernesto Araújo têm criado dificuldades e podem atrapalhar a retomada do crescimento econômico. Fazem parte de um mundo que tem cada vez menos espaço”, aponta. O grande desafio, explica, é que a reforma ministerial possa garantir aliança forte com o Centrão até o fim do mandato.

Para o cientista político Murillo Aragão, da Arko Advice Pesquisas, o chefe do Executivo vem construindo o presidencialismo de coalizão e tecendo conversas com presidentes do PP, PL, Republicanos e MDB há pelo menos nove meses. Como a eleição será em 1º de fevereiro e como o voto é secreto, os partidos não têm como impedir que seus filiados não sigam suas diretrizes. Logo, Bolsonaro deverá esperar o resultado para mexer as peças do tabuleiro. “A reforma ministerial visa manter uma base no Congresso para os dois últimos anos do governo e deve ocorrer após a votação sobre a liderança da Casa. Essa reforma vai refletir o resultado dessas eleições.” 



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