Da academia para o mercado. Testes desenvolvidos pelo Laboratório de Genética da Escola de Veterinária da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), que ajudam na identificação de fraudes em alimentos por meio do sequenciamento de DNA, ultrapassam os muros da instituição e o serviço já é disponibilizado para venda ao público interessado, que vai desde órgãos de defesa do consumidor e de fiscalização sanitária ao consumidor comum. Além do trabalho oferecido pelo próprio laboratório, a empresa Myleus, que também é fruto de encubadora surgida dentro da UFMG, é licenciada para usar a tecnologia e vender os testes. Assim, é possível confirmar se o alimento consumido é, de fato, o que foi comprado. Por enquanto, são vendidos testes para a confirmação do uso do leite de búfala no próprio leite comercializado como puro e em seus derivados, e de algumas espécies de peixes vendidos em supermercados, restaurantes ou qualquer outro estabelecimento. Outros dois testes – para identificação de vermes em bovinos e de confirmação do tipo de carne de origem animal – aguardam conclusão de resultados e processo de patenteamento para também serem oferecidos.
O trabalho com os pescados começou durante a graduação em biologia do hoje doutorando em zootecnia e analista no laboratório de genética da Escola de Veterinária da UFMG, Danilo Alves Pimenta Neto. Em 2010, ele iniciou uma pesquisa em parceria com o Instituto Estadual de Florestas (IEF) para identificar as espécies de peixes existentes no Rio São Francisco por meio do rastreamento do DNA. O objetivo era identificar as espécies com o intuito de preservação. Em seguida, no entanto, surgiu um trabalho para detectar fraudes na venda de surubim em Belo Horizonte e na região metropolitana. “Foi o primeiro trabalho de detecção de fraude em pescado feito aqui”, lembra a professora Denise Aparecida Andrade de Oliveira, coordenadora do Laboratório de Genética.
Depois de ingressar no mestrado, concluído em 2013, Danilo decidiu estudar outros peixes. Foram escolhidos oito tipos mais comercializados no Sudeste: atum, cação, sardinha, tilápia, bacalhau, merluza, panga e salmão. As amostras estudadas eram compradas em supermercados, restaurantes e lanchonetes, sempre que possível. “Eu comia um bolinho de bacalhau e pegava uma parte para usar como amostra”, lembra Danilo. “A extração do DNA não precisa ser feita somente no peixe cru, pode ser nele processado também”, ressalta. O resultado foi a constatação de um índice alto de fraude em determinados tipos. No caso da merluza, havia fraude em 70% das amostras coletadas. Em segundo vinha o bacalhau, com 63% de fraude; depois o panga, com 43%; e o salmão, 4%. “É muito comum a venda de outro tipo de peixe salgado como bacalhau, mas que não é o bacalhau de verdade. A descrição deveria ser ‘peixe salgado tipo bacalhau’, mas vendem como bacalhau”, alerta Denise. Não foi encontrada fraude nas amostras de atum, cação, sardinha e tilápia. Foi obtida a patente e, desde então, todos esses tipos de teste são feitos tanto pelo laboratório da UFMG, como pela Myleus.
Parasitas bovinos
Outro tipo de serviço que em breve será oferecido é para identificar parasitas em bois sensíveis (ou não) a um determinado tipo de vermífugo. O objetivo é que a pesquisa ajude os produtores no tratamento dos bovinos, evitando um medicamento muitas vezes ineficaz e que deixa resíduos na carne, depois de o animal ser abatido para consumo.
A pesquisa é desenvolvida pela médica veterinária e doutoranda em zootecnia Lívia Loiola e está em fase de pedido de patente. Ela diz que, ainda em campo, os bovinos são tratados com muito vermífugo, mas pode ocorrer de os parasitas ficarem resistentes a um determinado medicamento, o que o torna ineficaz. O prinípio ativo pesquisado é o benzimidazol.
Lívia explica as vantagens do novo teste, em relação aos clássicos. “No teste clássico, você pega as fezes do animal, faz a cultura, conta quantos ovos de vermes existem e identifica o gênero do parasita para indica o tratamento. Além disso, leva de sete a 10 dias até que os ovos se transformem em larvas. Depois, é preciso contar com um taxonomista para analisar no microscópio qual a espécie. Atualmente, é muito difícil encontrar esse profissional”, diz.
Com a nova técnica, o teste é mais rápido pois o DNA pode ser extraído do ovo, identificando gêneros e espécies. O objetivo é fazer o teste com as fezes dos animais antes e depois do tratamento com o vermífugo, buscando certificar se o medicamento funcionou. Até o fim do ano o trabalho deve estar disponível.
Leite de búfala e carne terão testes
Na mesma linha de proposta, a médica veterinária e doutoranda em zootecnia Lissandra Sousa Dalsecco desenvolveu um método de pesquisa para identificar a pureza do leite de búfala. O trabalho começou em 2009 e a patente foi obtida em 2011 e, consequentemente, os testes também já estão disponíveis ao público. Para dar início à pesquisa, Lissandra colheu 204 amostras de 29 marcas diferentes de leite de búfala e de todos os tipos de derivados disponíveis no mercado. O objetivo, também usando a técnica de análise do DNA, era saber se o leite era puro ou se continha mistura de leite bovino. E a constatação foi de que em 31% das amostras havia leite de vaca, sendo que em 17% dessas o índice de mistura era alto, superior a 10%. “Não é proibido vender o produto contendo leite de ambas as origens, porém é obrigatório rotulá-lo como misto”, ressalta a pesquisadora. O teste é qualitativo (identifica a origem do produto) e quantitativo (informa em que percentual). “A gente extrai o DNA da amostra de lácteo. Identifica o DNA de búfala e o de vaca. Faz a cópia do DNA, põe em contato com a sequência de DNA sintético de bovino e de búfala, e detecta. Um aparelho específico identifica com qual se uniu e em que quantidade”, detalha Lissandra.
O teste é feito em quatro ou cinco dias e fica em torno de R$ 400 por amostra, devido ao custo elevado dos insumos. Pode ser caro para o consumidor comum, mas não é inacessível a empresas ou entidades de defesa ou fiscalização. Atualmente, o laboratório da UFMG presta o serviço, por exemplo, para o instituto paulista Totum, que coleta amostras a pedido da Associação Brasileira de Criadores de Búfalos, que atesta o leite e derivados dos associados com um selo de pureza. São certificados os produtos que apresentam 1% ou menos de mistura de leite bovino (quantidade tolerável levando-se em conta que muitos produtores também lidam com o leite de vaca e resquícios podem ficar nas máquinas).
CÁRNEOS
O próximo passo de Lissandra agora é finalizar testes, identificando a origem de 10 tipos de carnes: de boi, búfalo, cabra, ovelha, porco, cavalo, frango, peru, gato e cachorro, além da carne de soja. Serão analisadas carnes in natura e embutidos. Nesse caso, o teste será somente qualitativo, ou seja, identificará se a carne (ou embutido) vendida como de um determinado animal é de fato deste animal ou se há fraude. Mas o teste não apontará em que percentual. Por enquanto, a pesquisa está na fase de padronização: são pegas amostras de carnes sabidamente puras para serem consideradas padrão e, a partir daí, o DNA será extraído. Em uma segunda etapa do trabalho serão comprados todos os tipos possíveis de embutidos disponíveis no mercado para a confirmação da origem. A pesquisadora acredita que até o fim do ano o trabalho já deva estar concluído para ser obtida a patente e, a exemplo dos demais, ser disponibilizado ao mercado.
O trabalho com os pescados começou durante a graduação em biologia do hoje doutorando em zootecnia e analista no laboratório de genética da Escola de Veterinária da UFMG, Danilo Alves Pimenta Neto. Em 2010, ele iniciou uma pesquisa em parceria com o Instituto Estadual de Florestas (IEF) para identificar as espécies de peixes existentes no Rio São Francisco por meio do rastreamento do DNA. O objetivo era identificar as espécies com o intuito de preservação. Em seguida, no entanto, surgiu um trabalho para detectar fraudes na venda de surubim em Belo Horizonte e na região metropolitana. “Foi o primeiro trabalho de detecção de fraude em pescado feito aqui”, lembra a professora Denise Aparecida Andrade de Oliveira, coordenadora do Laboratório de Genética.
Depois de ingressar no mestrado, concluído em 2013, Danilo decidiu estudar outros peixes. Foram escolhidos oito tipos mais comercializados no Sudeste: atum, cação, sardinha, tilápia, bacalhau, merluza, panga e salmão. As amostras estudadas eram compradas em supermercados, restaurantes e lanchonetes, sempre que possível. “Eu comia um bolinho de bacalhau e pegava uma parte para usar como amostra”, lembra Danilo. “A extração do DNA não precisa ser feita somente no peixe cru, pode ser nele processado também”, ressalta. O resultado foi a constatação de um índice alto de fraude em determinados tipos. No caso da merluza, havia fraude em 70% das amostras coletadas. Em segundo vinha o bacalhau, com 63% de fraude; depois o panga, com 43%; e o salmão, 4%. “É muito comum a venda de outro tipo de peixe salgado como bacalhau, mas que não é o bacalhau de verdade. A descrição deveria ser ‘peixe salgado tipo bacalhau’, mas vendem como bacalhau”, alerta Denise. Não foi encontrada fraude nas amostras de atum, cação, sardinha e tilápia. Foi obtida a patente e, desde então, todos esses tipos de teste são feitos tanto pelo laboratório da UFMG, como pela Myleus.
Parasitas bovinos
Outro tipo de serviço que em breve será oferecido é para identificar parasitas em bois sensíveis (ou não) a um determinado tipo de vermífugo. O objetivo é que a pesquisa ajude os produtores no tratamento dos bovinos, evitando um medicamento muitas vezes ineficaz e que deixa resíduos na carne, depois de o animal ser abatido para consumo.
A pesquisa é desenvolvida pela médica veterinária e doutoranda em zootecnia Lívia Loiola e está em fase de pedido de patente. Ela diz que, ainda em campo, os bovinos são tratados com muito vermífugo, mas pode ocorrer de os parasitas ficarem resistentes a um determinado medicamento, o que o torna ineficaz. O prinípio ativo pesquisado é o benzimidazol.
Lívia explica as vantagens do novo teste, em relação aos clássicos. “No teste clássico, você pega as fezes do animal, faz a cultura, conta quantos ovos de vermes existem e identifica o gênero do parasita para indica o tratamento. Além disso, leva de sete a 10 dias até que os ovos se transformem em larvas. Depois, é preciso contar com um taxonomista para analisar no microscópio qual a espécie. Atualmente, é muito difícil encontrar esse profissional”, diz.
Com a nova técnica, o teste é mais rápido pois o DNA pode ser extraído do ovo, identificando gêneros e espécies. O objetivo é fazer o teste com as fezes dos animais antes e depois do tratamento com o vermífugo, buscando certificar se o medicamento funcionou. Até o fim do ano o trabalho deve estar disponível.
Leite de búfala e carne terão testes
Na mesma linha de proposta, a médica veterinária e doutoranda em zootecnia Lissandra Sousa Dalsecco desenvolveu um método de pesquisa para identificar a pureza do leite de búfala. O trabalho começou em 2009 e a patente foi obtida em 2011 e, consequentemente, os testes também já estão disponíveis ao público. Para dar início à pesquisa, Lissandra colheu 204 amostras de 29 marcas diferentes de leite de búfala e de todos os tipos de derivados disponíveis no mercado. O objetivo, também usando a técnica de análise do DNA, era saber se o leite era puro ou se continha mistura de leite bovino. E a constatação foi de que em 31% das amostras havia leite de vaca, sendo que em 17% dessas o índice de mistura era alto, superior a 10%. “Não é proibido vender o produto contendo leite de ambas as origens, porém é obrigatório rotulá-lo como misto”, ressalta a pesquisadora. O teste é qualitativo (identifica a origem do produto) e quantitativo (informa em que percentual). “A gente extrai o DNA da amostra de lácteo. Identifica o DNA de búfala e o de vaca. Faz a cópia do DNA, põe em contato com a sequência de DNA sintético de bovino e de búfala, e detecta. Um aparelho específico identifica com qual se uniu e em que quantidade”, detalha Lissandra.
O teste é feito em quatro ou cinco dias e fica em torno de R$ 400 por amostra, devido ao custo elevado dos insumos. Pode ser caro para o consumidor comum, mas não é inacessível a empresas ou entidades de defesa ou fiscalização. Atualmente, o laboratório da UFMG presta o serviço, por exemplo, para o instituto paulista Totum, que coleta amostras a pedido da Associação Brasileira de Criadores de Búfalos, que atesta o leite e derivados dos associados com um selo de pureza. São certificados os produtos que apresentam 1% ou menos de mistura de leite bovino (quantidade tolerável levando-se em conta que muitos produtores também lidam com o leite de vaca e resquícios podem ficar nas máquinas).
CÁRNEOS
O próximo passo de Lissandra agora é finalizar testes, identificando a origem de 10 tipos de carnes: de boi, búfalo, cabra, ovelha, porco, cavalo, frango, peru, gato e cachorro, além da carne de soja. Serão analisadas carnes in natura e embutidos. Nesse caso, o teste será somente qualitativo, ou seja, identificará se a carne (ou embutido) vendida como de um determinado animal é de fato deste animal ou se há fraude. Mas o teste não apontará em que percentual. Por enquanto, a pesquisa está na fase de padronização: são pegas amostras de carnes sabidamente puras para serem consideradas padrão e, a partir daí, o DNA será extraído. Em uma segunda etapa do trabalho serão comprados todos os tipos possíveis de embutidos disponíveis no mercado para a confirmação da origem. A pesquisadora acredita que até o fim do ano o trabalho já deva estar concluído para ser obtida a patente e, a exemplo dos demais, ser disponibilizado ao mercado.