O fim da hegemonia ocidental
À meia-noite, 2024 se despede. Mas o futuro que se inicia parece traçado. Enquanto o Ocidente semeia guerras, o Oriente planta investimentos
Mais lidas
compartilhe
SIGA NODepois de uma caminhada de 25 dias até alcançar o mar, em 6 de abril de 1930, após o ritual sagrado do banho, Mahatma Gandhi arrebanhou um punhado de sal, em desafio ao colonialismo britânico, que proibiu a produção por indianos. O gesto foi repetido por milhares de manifestantes. Os ingleses reagiram. Prenderam 50 mil, entre os quais o próprio Gandhi. Mas, nada frearia o movimento. Liderando o “exército da paz”, Manilal, filho de Gandhi, marchou com outros 2,5 mil homens até as salinas ao norte de Bombaim.
Lá chegando, alternando-se em colunas pacíficas e silenciosas, aproximaram-se dos depósitos guardados por 400 policiais, que com cassetetes derrubaram um a um, sem encontrar qualquer resistência. Sucessivas colunas silenciosas foram abatidas. A última, sentou-se ao chão e foi atacada com golpes e pontapés. Ao assistir tal cena, Vince Walker, jornalista do New York Times escreveu: “Qualquer que fosse a ascendência moral que o Ocidente tinha, ela se perdeu hoje. A Índia está livre, pois ela aceitou tudo o que o aço e a crueldade podiam dar e não se encolheu nem recuou.”
Os jornalistas ocidentais e parte do Ocidente, especialmente os norte-americanos, tinham naquele tempo clara noção dos limites morais de certas realidades. De lá para cá, em crescente decadência, nada se compara ao que acontece na Palestina. A contagem de mortos produzidos pela carnificina já ultrapassou a casa dos 100 mil. Recentemente, se espalhou para o Líbano e agora para a Síria. Não há limites para a bestialidade nestes novos tempos. O balanço de 2024 é simples. Este foi o ano que o Ocidente perdeu as suas últimas reservas morais e a sua decência. O próprio jornalismo é literalmente executado diariamente na região do Levante: até 10 de dezembro eram 104 jornalistas palestinos assassinados. Este ano que se encerra foi regado a sangue. Mata-se fartamente na frente ucraniana, no Sahel africano, nas comunidades carentes do Brasil, no Haiti, nos bombardeios ao Iêmen, recentemente devastado por uma guerra civil, na Síria e no Líbano.
Mas, nem só de sangue viveu 2024. O bitcoin ultrapassou a marca de 100 mil dólares em uma única unidade. Estima-se que o mundo já possua mais de 10 mil moedas digitais diferentes. O ano também revelou ao mundo a corrida pela inteligência artificial e a ascensão meteórica das ações das empresas americanas que participam deste jogo: mantiveram os índices das bolsas no mais alto desempenho.
O ano também revelou ao mundo duas novas potências espaciais. China e Índia entraram para o clube restrito. Os chineses também apresentaram dois caças de sexta geração e o maior navio de desembarque do planeta. Taiwan parece ser a próxima bola da vez. Além disso, mais um míssil hipersônico ficou conhecido na guerra da Ucrânia. A cada nova invenção disruptiva desta era tecno feudal, a humanidade mais se aproxima da barbárie. A Europa conheceu em 2024 a avassaladora onda de movimentos de extrema direita ganhando protagonismo na Itália, na Áustria, no Leste Europeu, na França e agora na Alemanha. Sem falar no retorno de Donald Trump nos EUA. Os controladores de algoritmos alcançam o auge de seu poder.
A Índia só conseguiu a sua independência 19 anos depois da chamada Marcha do Sal, liderada por Gandhi. Pela violência absurda daquele domínio colonial, o jornalista Vince Walker antecipou sem dificuldade o resultado final. Na ordem mundial do século passado, a derrota moral antecedia a política e a militar. No mundo da inteligência artificial e dos tecno feudos, a moral deixou de existir, mas a lógica ainda não. Hoje, à meia-noite, 2024 se despede. Mas o futuro que se inicia parece traçado. Enquanto o Ocidente semeia guerras, o Oriente planta investimentos.
Conta-gotas
Diferentemente do que chegou a ser cogitado, as três vagas para conselheiro do Tribunal de Contas do Estado (TCE-MG) serão escolhidas uma a uma, em eleições separadas na Assembleia Legislativa. Duas em 2025. Talvez, uma em 2026. O deputado estadual Alencar da Silveira (PDT) é o mais cotado para a primeira. Para a segunda vaga, estão entre os mais ventilados a deputada estadual Ione Pinheiro (União) e o secretário de estado de Governo, Gustavo Valadares. Para a terceira, há um pelotão de candidaturas de deputados estaduais, entre os quais Tito Torres (PSD), Thiago Cota (PDT), Arnaldo Silva (União), Doutor Wilson Batista (PSD) e Sargento Rodrigues (PL).
Novo bloco
PRD, Solidariedade, Cidadania e PV anunciaram a formalização de bloco parlamentar para a nova legislatura em BH, denominado Independência Democrática. São seis vereadores: Wanderley Porto (PRD); Michelly Siqueira (PRD); Diego Sanches (Solidariedade); Rudson Paixão (Solidariedade); Wagner Ferreira (PV); e Leonardo Ângelo (Cidadania). A líder do bloco será Michelly Siqueira; o vice-líder, Rudson Paixão. “Unidos, fortaleceremos alianças em prol de uma Câmara Municipal independente, harmônica e verdadeiramente voltada para as pessoas e para o futuro de Belo Horizonte”, informa nota divulgada.
Oposição
Exceção ao Solidariedade, que teve os cargos exonerados esta semana, em desdobramento à disputa pela presidência da Câmara Municipal, as quatro outras legendas participam do governo Fuad Noman (PSD). Todos declararam apoio à candidatura de Juliano Lopes (Podemos) para a presidência da Casa. Por causa disso, serão tratados como oposição pelo Executivo, conforme anunciou o secretário de Governo e vice-prefeito eleito, Álvaro Damião (União).
Vai e vem
A adesão de Wagner Ferreira ao novo bloco também representa a sua ruptura com a federação PT-PV-PcdoB. Além de apoiar a candidatura de Bruno Miranda (PDT) à presidência da Câmara, PT e PcdoB integrarão a base de sustentação do governo Fuad Noman (PSD) no Legislativo e participarão da formação do governo. Ainda em recuperação, Fuad chegou a telefonar pessoalmente a Wagner Ferreira pedindo-lhe apoio a Bruno Miranda. O vereador assentiu. Depois, voltou atrás e se reposicionou com Juliano Lopes.
Qual verde?
Na contramão da federação a qual pertence, a adesão de Wagner Ferreira ao novo bloco causou indignação nos partidos aliados e dentro do PV, que tem a Secretaria Municipal de Meio Ambiente em seu portfólio. Sem o voto de Wagner Ferreira para Bruno Miranda, a legenda não permanecerá no governo Fuad Noman, avisa o interlocutor de Álvaro Damião. Além disso, a executiva nacional do PV repassou a Wagner Ferreira, durante a campanha eleitoral, R$ 150 mil de um total de R$ 209 mil em gastos de campanha informados por ele ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Siga nosso canal no WhatsApp e receba em primeira mão notícias relevantes para o seu dia
Retaliação
“A postura de Wagner Ferreira é incompreensível. Ele tem tudo a perder, pois a federação PT-PcdoB-PV já estuda meio de requerer judicialmente o mandato dele. Por outro lado, a base dele é sindical. Ele vai ficar ao lado do PL e do Zema e contra a federação que o elegeu? Algo inconfessável deve ter acontecido e vamos investigar”, afirma o deputado federal Rogério Correia (PT). A disputa pela presidência da Câmara é duríssima e já deixa um rastro de mortos e feridos.