Paulo Guerra
Paulo Guerra
CAMINHO DIGITAL

Como celulares velhos estão combatendo o desmatamento na Amazônia?

Sistema da Rainforest Connection usa celulares antigos, som e inteligência artificial para desvendar os segredos da floresta

Publicidade

Combater o desmatamento em um país continental como o Brasil não é fácil. A complexidade não está apenas na extensão territorial, mas também na dificuldade de acesso, na impunidade (segundo dados do Ibama, menos de 1% das áreas desmatadas na Amazônia entre 2005 e 2018 foram alvo de multas ou ações legais) e em questões culturais e históricas que geram conflitos fundiários, entre outros problemas.

Tudo isso gera uma situação na qual o desmatamento representa 46% das emissões brutas de gases de efeito estufa, enquanto no resto do mundo, o valor é de 17%. Para piorar, segundo dados do MapBiomas, 99% do desmatamento no Brasil tem indícios de ilegalidade.

Esses dados mostram a urgência e a dificuldade de se combater o desmatamento. Mas a Rainforest Connection (RFCx), uma ONG internacional, criou uma solução tão genial quanto inesperada: ela utiliza tecnologia acústica para monitorar e proteger ecossistemas. O sistema conhecido como "Guardian" utiliza microfones sensíveis instalados nas copas das árvores e conectados a celulares usados, que por sua vez se conectam a sistemas de carregamento solar. Os dispositivos capturam o som ambiente em um raio de até 1 km, submetem esses sons a sistemas de inteligência artificial e quando sons de motosserras ou caminhões e tratores são identificados, o sistema emite alerta em tempo real, permitindo que as equipes de conservação ajam rapidamente.

Atualmente, há cerca de 600 “guardians” atuando em 7 países e protegendo cerca de 726 mil hectares e um dos países beneficiados é o Brasil. A terra indígena Tembé, no Pará, foi uma das contempladas pelo projeto. Após recuperarem parte de suas terras da posse de colonos ilegais, o sistema foi instalado e hoje monitora a reserva.

Se fosse só isso já seria maravilhoso, mas o sistema vai além. Ele usa os sons da floresta para monitoramento bioacústico e está criando o maior repositório compartilhável e pesquisável do mundo, o "Audio Ark", com sons de florestas tropicais e dados ecológicos. Quem não é da área deve estar se perguntando, e daí?

E daí que cada canto de pássaro, zumbido de inseto ou som animal pode ser usado para identificar novas espécies, localizar animais em risco de extinção e alimentar biólogos e pesquisadores com um sem número de possibilidades. Esse tesouro da ciência da vida é composto por dados ecológicos que podem ser comparados a fim de identificar mudanças naturais e antrópicas, ou seja, a saúde dos ecossistemas pode ser monitorada a um custo muito baixo.

Tudo isso pode gerar insumo para gestão de terras, mudanças de políticas e alocação de recursos com maior impacto positivo. Assim, a tecnologia não apenas ajuda a prevenir o desmatamento, mas identifica os infratores, promove uma compreensão mais profunda da biodiversidade local, e monitora mais de 4 mil espécies em suas interações com o ambiente. Ela também auxilia os povos indígenas na luta por seus direitos territoriais e pela preservação de suas reservas.

Siga nosso canal no WhatsApp e receba notícias relevantes para o seu dia

A ideia, embora inusitada, é simples, barata e funcional. Ela conecta a tecnologia de monitoramento acústico ao esforço humano de conservação e mostra que há caminhos para se combater o desmatamento, desde que a sustentabilidade se una à inovação e à vontade política de se resolver o problema. Há caminhos, mas há vontade?

As opiniões expressas neste texto são de responsabilidade exclusiva do(a) autor(a) e não refletem, necessariamente, o posicionamento e a visão do Estado de Minas sobre o tema.

Acesse sua conta

Se você já possui cadastro no Estado de Minas, informe e-mail/matrícula e senha. Se ainda não tem,

Informe seus dados para criar uma conta:

Digite seu e-mail da conta para enviarmos os passos para a recuperação de senha:

Faça a sua assinatura

Estado de Minas

Estado de Minas

de R$ 9,90 por apenas

R$ 1,90

nos 2 primeiros meses

Aproveite o melhor do Estado de Minas: conteúdos exclusivos, colunistas renomados e muitos benefícios para você

Assine agora
overflay