Tentando sair de férias, vim para o Sul da Bahia. Santo André, local paradisíaco, separado de Porto Seguro por alguns quilômetros e uma balsa.
O mundo ficaria para trás se não fosse o sinal do celular e os mosquitos. Sim, celulares e mosquitos têm o poder de fazer das férias um pesadelo.
Caminhando pela praia vi um mosquito agonizando na beira do mar. Por um segundo, pensei em salvá-lo da crueldade da natureza. Não o fiz. Apenas segui adiante. Mais adiante percebi que outros mosquitos eram vítimas do mesmo destino e se debatiam contra a espuma mortal do mar que invadia a praia. Virariam comida de peixe ou de outro predador qualquer.
Com o vento batendo no meu rosto e o som das ondas quebrando, refleti sobre a nossa insignificância no universo. Minha vida, vida de todos nós, inclusive do mosquito. Ele e eu éramos, naquele segundo filosófico, uma coisa só.
O meu dilema com o mosquito não parou por aí. Um pouco mais tarde percebi que havia sido picado entre uma coxa e outra. Como é possível um mosquito picar entre as duas pernas, espaço praticamente virtual?! Bicho infernal!
Alguns historiadores classificam o mosquito como o maior predador da humanidade. Responsáveis pela morte de uma média de 2 milhões de pessoas por ano no mundo, faz jus ao título. Nós, humanos, seres dotados de racionalidade e inteligência, ficamos em segundo lugar: matamos em média 475 mil membros de nossa própria espécie por ano.
Outros seres que nos aterrorizam, não chegam nem perto de mosquitos e humanos. Cobras matam 50 mil, cachorros 25 mil, crocodilos 1 mil, hipopótamo 500, elefantes e leões 100 pessoas por ano. Os tubarões e lobos ficam com o vexatório 15° lugar entre os maiores predadores do homem, com uma média de 10 vítimas fatais por ano no mundo. Mas morremos de medo de tubarão, mesmo morando em Minas.
Por extrapolação estatística, é possível estimar que a quantidade de mortes por mosquitos equivale a quase metade de todos os humanos que passaram pela crosta terrestre. Em números explícitos, mosquitos aniquilaram cerca de 52 bilhões dos 102 bilhões de indivíduos que existiram em nossa curta história de 200 mil anos na Terra.
Durante esse período, mosquitos conduziram o destino de impérios e nações, destroçaram economias e foram decisivos em inúmeras guerras de nossa história.
O bicho em si, seria inocente , caso não carregasse patógenos responsáveis por doenças como dengue, malária, zika, febre amarela, febre do Nilo Ocidental etc.
As vacinas seriam o grande advogado de defesa dos mosquitos, caso estivessem disponíveis para todas as doenças por ele transmitidas e todas as suas possíveis vítimas.
A vacina contra a dengue, recentemente disponibilizada contra os quatro tipos de vírus que causam essa doença, que nos perturba há décadas no Brasil, começa a propor um novo fim para essa história, mas ainda é cedo para cantarmos vitória. Mosquito e vírus são uma dupla quase tão imbatível quanto Pelé e Tostão na Copa de 1970.
Karl Marx reconheceu em 1852 que “os homens criam a própria história, mas não podem criá-la como bem querem”. J.R.MacNeill, professor de história da Universidade Georgetown, escreveu “Talvez seja um golpe cruel contra o amor-próprio de nossa espécie imaginar que mosquitos insignificantes e vírus acéfalos são capazes de moldar nossos assuntos internacionais. Mas são.”
Tendemos a esquecer que a história não é artefato da inevitabilidade, chama atenção Timothy C. Winegard, autor do fantástico livro “O mosquito”, fonte de informações dessa breve crônica.
E o celular, qual a semelhança com o mosquito?! Tire férias num lugar onde os mosquitos abundam e verá a incrível semelhança entre um e outro.