Trufa de maracujá com 'terra' de cacau: o chocolate no jantar de sobremesas da confeiteira Mariana Correa ficou para o fim -  (crédito: Bruno Gonzaga/Divulgação)

Trufa de maracujá com 'terra' de cacau: o chocolate no jantar de sobremesas da confeiteira Mariana Correa ficou para o fim

crédito: Bruno Gonzaga/Divulgação

 

Jantar de sobremesas. Quando recebi esse convite pela primeira vez, um ponto de interrogação se desenhou na minha cabeça. Mesmo eu, apaixonada por doces, não tinha ideia de que isso era possível. Cheguei a duvidar. Como vamos comer sobremesa do início ao fim?

 


O convite, que me soava ousado e provocativo, era da confeiteira Mariana Correa, do ateliê La Parisserie, que estudou em Paris e lá conheceu um bar de sobremesas. De lá para cá, já participei de duas edições desse jantar – em 2019 e 2022 – e posso dizer que ele confirmou meu jeito de enxergar a confeitaria. Se era esse o objetivo, cumpriu. Abriu meus olhos e adoçou ainda mais meu paladar.


Tenho bem nítida a lembrança de como fiquei completamente envolvida por aquela experiência inédita na minha vida. Falei disso por um bom tempo. Era tudo muito novo, mas fazia muito sentido para mim. A confeitaria estava ali o tempo todo, mostrando o seu encanto, o seu potencial, a sua beleza, do início ao fim de um jantar, sem ter que dividir as atenções. A minha paixão por (comer) doces sempre me fez dar muita importância para a sobremesa e acreditar que ela merece ser protagonista.

 


O menu seguia os tempos de um jantar francês, começando pelo amouse bouche (aperitivo) até chegar aos petit fours (pequenos doces para o momento do café). Mas tudo era sobremesa. Mariana usou e abusou das frutas, legumes, queijos, ervas e temperos. Provou que não existem fronteiras ao incluir ingredientes que normalmente associamos a receitas salgadas, entre eles beterraba, salsinha, pimenta e manjericão. Os pratos eram leves, pouco doces e nada enjoativos. Eram sobremesas, mas também poderiam ser entradas. Por que não? O chocolate ficou para a etapa da sobremesa, propriamente dita.


O jantar revirou e remexeu meus pensamentos. Derrubou muitos conceitos e construiu outros tantos, reforçando para mim a importância e o valor da confeitaria. Como eu sempre acreditei.


Onde quer que eu vá para comer sempre tenho a expectativa de encontrar um doce. Já chego esperando o gran finale, antes mesmo de fazer o primeiro pedido. Se não tem, ou se encontro uma sobremesa sem graça, pouco pensada (petit gateau e companhia), murcho feito um maracujá. Então, imagina o que significava para mim viver no jantar inteiro o momento apoteótico da sobremesa, do mais puro deleite. Era real, estava no paraíso.

 


No mês passado, recebi outro convite. Veio da Marina Mendes, do ateliê Sá Marina, uma baiana que descobriu a confeitaria na França e uniu esses dois mundos, dando ao seu trabalho o divertido nome de pâtisserie tupiniquim. Partindo de uma confeiteira, imaginei: só pode ser um jantar de doces. Fui mais preparada, sabendo (ou achando que sabia) o que esperar. Mas a verdade é que ela conseguiu me surpreender, e isso é o mais legal da história.


No momento das boas-vindas, recebemos uma taça. Pensei: que bom, um drinque para começar. Fui tomando, sentindo um sabor adocicado, achando que estava entendendo tudo. Até que, no último gole, a grande surpresa. Tinha um mini pudim de tapioca e coco lá dentro. Uma sobremesa em forma de drinque, ou seria um drinque em forma de sobremesa? Isso, confesso, nunca tinha nem imaginado, uma pâtisserie para beber.

 


A proposta era um pouco diferente. Havia três pratos salgados no meio do menu, as chamadas pâtisseries salgadas, mas nada que tirasse a ousadia da experiência. Os três snacks, que estavam na primeira etapa do jantar, eram doces. Depois vinha uma salada. O momento do café também foi marcante. Na xícara, raviólis de massa de chocolate com recheio de chocolate e castanha do Pará, envolvidos por uma calda bem densa de chocolate.


Quando revisito as duas experiências, vejo que elas confirmam o que acredito. Que a confeitaria pode ser a protagonista de um jantar. Que uma confeiteira pode assinar um menu completo. Que a confeitaria pode criar momentos marcantes e inesquecíveis. Que a confeitaria não pode ficar em segundo plano na cozinha. Que a confeitaria tem muito para mostrar e nos surpreender.