Dólar bate novo recorde e assusta o governo
A saída iminente do secretário especial do Tesouro e Orçamento, Rogério Ceron, que pediu demissão do cargo na Fazenda, contribuiu também para as especulações
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O dólar comercial bateu novo recorde ontem e fechou nesta quarta-feira vendido a R$ 6,267, o maior nível nominal da história. Para os analistas de mercado, o temor de que o pacote de corte de gastos proposto pelo governo federal seja desfigurado no Congresso, que negaceia sua aprovação, por causa das emendas parlamentares ainda não liberadas pelo Palácio do Planalto, fez a moeda americana disparar novamente.
Outro fator que alavancou a alta do dólar foi a redução de juros nos Estados Unidos pelo Fed (Federal Reserve, o banco central americano) em 0,25 ponto. O dólar comercial teve alta de 2,82%, vendido a R$ 6,267, a maior desde 10 de novembro de 2022. O dólar futuro já está sendo cotado acima de R$ 6,30. O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, tentou minimizar o descontrole do câmbio e mostrar otimismo em relação à economia, mas suas declarações não foram levadas em consideração pelo mercado.
Haddad disse que o dólar deve se estabilizar nos próximos meses, porque a valorização da moeda norte-americana frente ao real seria reflexo de um ambiente de incerteza econômica momentânea, enquanto o Congresso não aprova o ajuste fiscal. O próprio mercado, segundo o ministro da Fazenda, faz projeções de longo prazo mais positiva do que a apontada por especuladores. “Temos um câmbio flutuante que, nesse momento em que as coisas estão pendentes, reflete um clima de incerteza. Isso faz o câmbio flutuar”, explicou Haddad. ”As avaliações dessas instituições são melhores do que as que os especuladores estão fazendo”, afirmou Haddad.
De fato, os grandes bancos fazem projeções mais otimistas, mas o mercado financeiro mudou muito, faz tempo que migrou da Avenida Paulista para a Faria Lima, em São Paulo. Os bancos digitais e fundos de investimentos são mais nervosos e operam especulativamente no câmbio, para muito além do que seria a alta normal de dezembro, quando muitas empresas estrangeiras fazem remessas de dinheiro para suas matrizes.
A saída iminente do secretário especial do Tesouro e Orçamento, Rogério Ceron, que pediu demissão do cargo, contribuiu também para as especulações. Não se sabe ainda o perfil de seu substituto. Na quinta-feira passada, Ceron admitiu que é preciso controlar o ritmo de crescimento dos gastos obrigatórios para manter de pé o arcabouço fiscal. E, com isso, atingir o chamado grau de investimento.
Percepção negativa
O ministro Fernando Haddad tentou mantê-lo na equipe econômica, mas sua decisão é irreversível. Embora Ceron tenha recebido proposta de trabalho de uma grande instituição privada, nos bastidores, comenta-se que estaria saindo insatisfeito por ter sido derrotado na queda de braços da Fazenda com os demais ministérios da Esplanada na hora de efetuar os cortes no Orçamento.
Nas redes sociais, o governo sofre muitos ataques da oposição, principalmente o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Entretanto, são as críticas dos economistas e operadores de mercado financeiro que estão desconstruindo a imagem de Haddad. A gestão da Fazenda é aprovada por apenas 4% dos agentes financeiros, segundo pesquisa Quaest deste mês de dezembro. Em março, a aprovação era de 24%. Declarações de Lula contra a elevação dos juros para 12,25% e de que os gastos sociais do governo são investimentos enfraquecem o ministro.
A alta do dólar contrasta fortemente com outros indicadores da economia, que são muito positivos. Em 2023, o PIB do Brasil acumulou alta de 2,9%. Para 2024, a previsão é de crescimento de 3,39%; a renda média dos trabalhadores cresceu 6,6% em um ano e a massa salarial atingiu um recorde histórico.
A taxa de desemprego é uma das mais baixas da história: 6,8%. A percepção negativa dos agentes econômicos contamina a maioria da população, por causa da inflação. Caso o dólar se mantenha no patamar de R$ 6,267, a conta chegará para os assalariados no primeiro trimestre de 2026, com a alta de preços de alimentos, combustíveis, medicamentos e transportes.
Fundo Constitucional
A vice-governadora do Distrito Federal, Celina Leão (PP), ontem, participou intensamente das negociações com os líderes do Congresso para manter o critério atual de reajuste anual do Fundo Constitucional do DF. Acompanhada do secretário de Relações Institucionais do GDF, Agaciel Maia, criticou o uso da inflação como parâmetro de repasse de recursos da União ao Fundo Constitucional. O FCDF é reajustado por meio da variação da receita corrente líquida da União desde que foi criado, em 2003.
Celina obteve apoio do relator do corte de gastos, o deputado federal Isnaldo Bulhões Jr (MDB-AL), correligionário do governador Ibaneis Rocha. O presidente do MDB, Baleia Rossi (SP), também é contra a medida. Segundo a vice-governadora do GDF, o FCDF é usado em áreas prioritárias na capital, como segurança, saúde e educação. “Só de inscrições na rede pública de ensino foram 38 mil novas matrículas. Na medida em que o país cresce, o DF cresce três, quatro, cinco, dez vezes mais. O Fundo não acompanha nem o crescimento da nossa cidade”, avalia Celina. A Secretaria de Economia do DF estima que a mudança no cálculo do FCDF pode acarretar, em 15 anos, uma perda de R$ 12 bilhões aos cofres distritais.