Prefeitos têm feito manifestações frequentes em Brasília em busca de recursos -  (crédito: Marina Ramos/Câmara dos Deputados)

Prefeitos têm feito manifestações frequentes em Brasília em busca de recursos

crédito: Marina Ramos/Câmara dos Deputados


Na minha coluna de ontem, mostrei que a grande maioria dos municípios está literalmente quebrada financeiramente (assim como, em boa medida, os estados, embora não haja espaço para tratar destes últimos aqui), o que, na raiz de tudo, se explica principalmente pela disparada do crescimento dos gastos previdenciários (especialmente nos primeiros), na presença de receitas (ou do PIB) quase ou mais que estagnados.

 

Nos últimos muitos anos, as despesas previdenciárias municipais cresceram à média real de 12,5% ao ano (a.a.), enquanto as estaduais se expandiam a 5,9% e a evolução média do PIB (que dá uma boa aproximação para o comportamento das receitas) ficava em apenas 1,7% a.a., produzindo “buracos” financeiros significativos nas contas desses entes.

 

Entre os fatores que não destaquei no outro artigo, cabe lembrar o aumento real elevado do piso dos professores, que é algo que quebra municípios pequenos e que afeta tanto os ativos como os aposentados. Mas há principalmente o fato de o governo e o Congresso estarem o tempo todo passando novas funções para os municípios, grandes implementadores de políticas sociais, mas hoje sufocados, sem que estes recebam uma receita adicional compatível com a nova despesa assumida.

 

Com receitas insuficientes para cobrir as despesas, segue-se a pressão interna para deixar de pagar três coisas em torno das quais eles podem “forçar a barra” e tentar não pagar: despesas ligadas às contribuições ao Regime Geral, Precatórios, e despesas ligadas ao Regime Próprio. Ultimamente, a propósito, acumularam-se dívidas ligadas a esses três itens, em torno, ao todo, de R$ 500 bilhões. E daí ser possível entender o porquê da ânsia dos municípios de querer reduzir a alíquota da contribuição patronal para o Regime Geral. Cá para nós, por que o município, que é o grande implementador de políticas sociais do Brasil, paga 20% de contribuição para o Regime Geral enquanto um ente filantrópico não paga nem 1 centavo? Ou enquanto um time de futebol (sem falar no agronegócio) paga muito menos do que os 20%? Para eles, isso soa obviamente bastante injusto, porque, afinal, eles se vêm como os principais implementadores de políticas sociais em nosso país. Ou seja, o “choro” em torno desse assunto parece natural.

Resumindo, são três os principais motivos da difícil situação fiscal dos municípios: 1) a sua previdência própria, cujos gastos dispararam, como dito acima; 2) o piso dos professores, cujo aumento é algo que quebra municípios pequenos, e que afeta tanto os ativos como os aposentados; e 3) municípios recebendo cada vez mais funções na área social com menor cobertura financeira, como no caso da merenda escolar, onde o que a União passa à frente não chega a R$ 1 por aluno, embora uma merenda decente vá custar pelo menos uns R$ 3... (Mais um exemplo nesse sentido é o do programa Mais Médicos).

Outra justificativa é a isonomia entre o Regime Próprio e o Regime Geral. Desde a Emenda 20 vem se buscando ter regras iguais nos dois regimes, que antes eram muito diferentes. A Emenda 20, da era FHC, já aproximou isso; a 41, do governo Lula, já deixou bem próximo, e a 103, de 2019, já igualou (exceto no que diz respeito à contribuição). A contribuição básica do Regime Próprio, se ele não tem déficit atuarial, é de 14%. Assim, por analogia, a contribuição dos municípios para o Regime Geral deveria ser também 14% (algo que a Confederação Nacional dos Municípios defende).

Porém, a proposta na ordem do dia é: este ano, como já está em 8%, continua nos 8, até para dar um fôlego aos municípios, e vai aumentando progressivamente até estabilizar em 14% (10% em 2025, 12% em 2026, e, a partir de 2027, 14%, que seria a alíquota permanente). Qual a lógica disso? Primeiro uma analogia entre os regimes próprio e geral, e segundo por não fazer sentido que os municípios, que são os grandes implementadores das políticas sociais no Brasil, paguem igual a uma grande empresa do setor privado (seja ela uma big tech ou do setor financeiro, por exemplo). Se a alíquota fosse 20% para todas as empresas, tudo bem. Mas não é. São 20% para os setores que não têm tratamento diferenciado. Por que os municípios não merecem tal tratamento, se são os grandes implementadores das políticas sociais do Brasil? O que estão querendo é uma redução de 20 para 14, na lógica de equiparação com o Regime Próprio (20 para 8 talvez estivesse exagerado).

Espero poder aproveitar a discussão pública da alíquota para os municípios em relação ao Regime Geral para sugerir em nova coluna neste mesmo jornal uma nova proposta de PEC similar à que já se chamou “PEC da Sustentabilidade Fiscal”.