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Juraciara Vieira Cardoso
Juraciara Vieira Cardoso
Professora da Universidade Federal de Lavras, graduada em Direito, mestre em Direito Constitucional e doutora em Filosofia do Direito

A voz de Demi Moore contra padrões irreais

Que sua voz ecoe em cada um de nós rumo a uma autoaceitação radical

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O Globo de Ouro, ocorrido na semana passada, foi palco de uma das premiações mais importantes já alcançadas por uma atriz brasileira e encheu a todos nós de orgulho. No entanto, meu desejo hoje não é incensar ainda mais o grande feito de Fernanda Torres, mas me dedicar ao discurso realizado por Demi Moore. Ao receber o prêmio de melhor atriz pelo filme “A substância”, que tem como tema central o modo como lidamos com o envelhecimento, ela refletiu sobre os mais de 45 anos de carreira, marcados não apenas pelo sucesso, mas também por julgamentos que afetaram profundamente sua autoestima.

Em uma fala, que foi pessoal, mas ao mesmo tempo universal, Demi Moore capturou a essência de lutas que transcendem a tela do cinema e nos convidam diretamente a pensar temas como etarismo e a constante pressão que todos nós recebemos, sejamos homens ou mulheres, para nos adaptarmos a padrões que são irreais e que nos enchem de angústia. Como uma espécie de desabafo, a atriz falou para todos nós que, em maior ou menor grau, nos deixamos guiar por métricas feitas para pessoas que, muitas vezes, não vivem vidas reais. Ela usou a própria trajetória para exemplificar como a idade pode ser um fator de exclusão, fazendo com que passemos a duvidar do nosso próprio valor.

Isso me lembrou Simone de Beauvoir, que no livro "A velhice", conclui que no envelhecimento há um processo de apagamento, no qual o sujeito vai sendo destituído de si próprio em nome dos interesses dos membros mais jovens do grupo, em uma espécie de “morte social”, que pode ser profundamente prejudicial para sua autoestima. Para a autora, a velhice não é apenas uma etapa natural da vida, mas um território que foi construído culturalmente para silenciar e marginalizar aqueles que não mais representam o modelo ideal de juventude e produtividade. Talvez seja na indústria do entretenimento que isso se mostre mais real, já que aparência e juventude são consideradas capitais indispensáveis para o sucesso, ainda mais para as mulheres, cuja perda da juventude é vista como o fim de sua utilidade.

Ao dividir conosco suas próprias inseguranças e dúvidas, a vencedora do Globo de Ouro, valida a experiência de muitos de nós, pois também somos constantemente confrontados com os mesmos dilemas, ainda que não sejamos atores famosos de Hollywood. Nós também sentimos, como ela, que nunca somos bonitos, magros ou bem-sucedidos o suficiente, porque estamos sempre nos comparando a padrões culturais que nos deixam a sensação de fracasso existencial.

Ao se apresentar vulnerável para nós, o público, Moore quebra o silêncio sobre como esses padrões podem ser destrutivos para nossa autoimagem e para nossa autopercepção. Seu discurso é um clamor para que nos aceitemos e reconheçamos o nosso próprio valor, independentemente da opinião das outras pessoas, da nossa idade ou dos padrões irreais que nos são impostos. Ao ganhar o primeiro prêmio, aos 62 anos e após 45 de anos de carreira, a atriz nos prova que nossos talentos não são diminuídos pelo efeito do tempo, ao contrário, eles podem muitas vezes se aprimorar.

Mais que um Globo de Ouro, Demi Moore, com sua premiação, consagrou a urgência de nos aceitarmos como somos, ainda que o mundo insista em moldar nossas identidades a partir de padrões inalcançáveis. Seu discurso foi muito mais do que uma simples reflexão sobre o envelhecimento, foi a indicação de que cada fase da vida tem sua própria beleza e significado, que devem ser valorizados. Que sua voz, amplificada pelo filme A Substância, cujo artigo já escrevemos aqui, e pelo palco da premiação, agora ecoe em cada um de nós rumo a uma autoaceitação radical.

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