Quando estreou, há pouco mais de três anos, “Round 6” não parecia ter a pretensão de se tornar um fenômeno global capaz de rivalizar com superproduções anglófonas como “Stranger things” ou “Succession”. Mas sua fantasia enraizada na cultura sul-coreana não encontrou resistência mundo afora.
Nesta quinta-feira (26/12), em plena ressaca de Natal, a série volta para a segunda temporada revigorada e mais entrelaçada à política local do que nunca.
Primeiro, porque sua popularidade é a prova de que as estratégias de “soft power” do governo sul-coreano vêm rendendo frutos. Segundo, porque os novos episódios parecem refletir o caos que tomou o país de assalto desde que o ex-presidente Yoon Suk Yeol encampou a tentativa de autogolpe que resultou em impeachment. O protagonista de “Round 6”, afinal, agora tem como objetivo derrubar um líder autoritário.
Coincidência ou futurologia, a reestreia ocorre depois que a série tirou prêmios Emmy de produções caras e prestigiosas como o já citado drama familiar da HBO, que perdeu os troféus de melhor direção e ator, pela primeira vez embolsados por asiáticos.
“Round 6” teve 330 milhões de espectadores e 2,8 bilhões de horas vistas, de acordo com a Netflix. É a obra original mais popular da plataforma.
“Isso é a prova de que o idioma não é barreira, que o inglês pouco importa quando estamos entretidos com uma história”, afirmou o diretor e criador Hwang Dong-hyuk.
Tempos atrás, Dong-hyuk chegou a dizer que o trabalho na primeira temporada foi tão estressante que ele perdeu dentes e não voltaria a escrever e dirigir novos episódios. Mas não conseguiu abandonar a cria.
Em sua primeira temporada, “Round 6” (“Squid Game”, no título original) narrou a história de Seong Gi-hun (Lee Jung-jae), sul-coreano afundado em dívidas que, num momento de desespero, aceita participar de uma competição baseada em jogos infantis. A cada rodada, os vencedores avançam para a próxima fase, enquanto os perdedores são mortos.
Tudo bancado por um grupo de ricaços que se divertem às custas do sofrimento de homens e mulheres que precisam de dinheiro para pagar cirurgias, empréstimos, estudos e por aí vai.
Agora, Seong percebe que, para interromper aqueles jogos olímpicos do sadismo, precisa participar da competição novamente para desmascarar seu organizador.
“Qualquer um podia se relacionar com os temas da primeira temporada, então não foi difícil passá-los ao público por meio do meu personagem. Minha tarefa, enquanto ator, era encontrar o ponto certo entre divertir e espalhar uma mensagem”, diz Lee Jung-jae, que ganhou o cobiçado Emmy por interpretar o protagonista.
“Round 6” é, ao mesmo tempo, muito coreana e muito universal, diz o diretor. Ele costurou a trama de ação e suspense a problemas sociais graves não só em seu país, mas no mundo abatido por taxas de desemprego crescentes, desigualdade social galopante e discursos populistas vazios.
A série lembra “Parasita”, filme de Bong Joon-ho que fez história ao vencer a Palma de Ouro em Cannes e, depois, ser o primeiro longa em língua não inglesa a embolsar o Oscar, há quatro anos.
O drama familiar também usava as particularidades e excentricidades da produção audiovisual sul-coreana para denunciar o abismo social entre pobres e ricos no país.
“ROUND 6”
Coreia do Sul, 2024. Série de Hwang Dong-hyuk. Com Lee Jung-jae, Wi Ha-joon e Lee Byung-hun. A segunda temporada, com sete episódios, estreia nesta quinta-feira (26/12). Classificação: 18 anos.