Segunda temporada da série sul-coreana que é um dos maiores sucessos da plataforma estreou no último dia 26 
 -  (crédito: netflix/divulgação)

Segunda temporada da série sul-coreana que é um dos maiores sucessos da plataforma estreou no último dia 26 

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A batalha campal em uma fábrica, a polícia provocando grevistas com tasers, o ativista que passa 100 dias empoleirado na chaminé são exemplos da brutalidade das relações sociais na Coreia do Sul que inspiraram a série “Round 6”, cuja aguardada segunda temporada estreou na Netflix no último dia 26.

 


A produção mostra personagens desesperados competindo na versão mortal de um jogo infantil tradicional coreano em busca de recompensa em dinheiro.

 


O diretor e roteirista Hwang Dong-hyuk diz que as experiências do protagonista Gi-hun foram inspiradas na violenta greve na fábrica da Ssangyong em 2009, quando um grupo de trabalhadores tomou o local para protestar contra o plano de demissão.

 

 

“Eu queria mostrar que, no mundo em que vivemos, qualquer pessoa de classe média pode entrar em colapso e cair para o fundo da escala social da noite para o dia”, afirma.

 


Plano de demissão

Em maio de 2009, a gigante automotiva Ssangyong anunciou o plano de demissão que afetaria mais de 2,6 mil pessoas, 40% de sua força de trabalho, sob o argumento de que enfrentava dificuldades econômicas.

 


Os trabalhadores ocuparam a fábrica durante a greve de 77 dias, que terminou com confrontos entre grevistas e policiais armados com tasers e helicópteros que lançaram gás lacrimogêneo.

 


Muitos sindicalistas foram violentamente reprimidos, alguns foram presos. No entanto, o conflito não terminou naquele momento.

 


Cinco anos depois, o líder sindical Lee Chang-kun iniciou protesto de 100 dias, escalando a chaminé da fábrica para denunciar a decisão do tribunal a favor da empresa e contra os grevistas.

 


O sindicalista foi alimentado graças a uma cesta alçada por uma corda e, segundo ele, sofreu alucinações. Para alguns trabalhadores que participaram do protesto em 2009, é difícil falar sobre “Round 6” por causa do trauma.

 


Prisões e mortes

Os trabalhadores enfrentaram tormentos judiciais. Mais de 200 foram processados e quase 100, incluindo Lee, condenados à prisão. Cerca de 30 cometeram suicídio devido ao estresse, lembra Lee. “Muitos perderam a vida”, diz ele. Para Lee, os trabalhadores eram vistos como “ativistas obsoletos que haviam perdido a cabeça”.

 


“A polícia continuou a nos espancar, mesmo depois que ficamos inconscientes. Isso ocorreu em nosso local de trabalho e foi transmitido para que muitos pudessem assistir”, diz.

 

 

Lee afirma que muitas cenas da primeira temporada de “Round 6”, em que o protagonista luta para não trair os concorrentes, foram muito comoventes.

 


No entanto, lamenta que não houve mudança real para os trabalhadores na Coreia do Sul com grandes desigualdades, relações tensas entre funcionários e empresas e a política marcada pela tensão.

 

 

“Parece que a desigualdade está tão arraigada que não há como voltar atrás”, comenta.

 


O sucesso da série em 2021 fez com que se sentisse “vazio e frustrado”. “Senti que a história dos trabalhadores da Ssangyong foi reduzida a um produto descartável”, disse.


 

“Round 6” se tornou parte da “onda coreana” que inclui o sucesso internacional de filmes como “Parasita” e bandas de K-pop como BTS.

 


A segunda temporada estreou em um momento de crise política na Coreia do Sul, depois que o presidente Yoon Suk Yeol foi destituído pelo Parlamento por sua tentativa fracassada de decretar a lei marcial.

 

 

Yoon foi afastado de suas funções até que o Tribunal Constitucional decida sobre seu futuro. Vladimir Tikhonov, especialista em estudos coreanos da Universidade de Oslo, acredita que algumas produções culturais mais bem-sucedidas do país relacionam a violência do Estado e a crueldade da sociedade capitalista.

 


“Continuamos a viver à sombra da violência do Estado, e essa violência do Estado é um tema recorrente em produtos culturais de sucesso”, diz Tikhonov.