A lei de Brandolini, formulada, ou melhor, twittada pela primeira vez em 2013, sob o título bullshit assimetryprinciple – em português: princípio da assimetria da estupidez –, encerra um axioma que pode ser assim sintetizado: “a quantidade de energia necessária para refutar uma idiotice é uma ordem de magnitude maior do que a necessária para produzi-la”. Noutras palavras, é mais fácil criar e disseminar desinformação do que desmascará-la.
O princípio que compara o desproporcional esforço e energia dispendidos numa ação e noutra pode ser estendido a outras situações da vida social, tal como entre disseminar o bem e o mal. Afinal, é inegavelmente mais fácil fazer o mal do que fazer o bem, inclusive quanto ao alcance dos efeitos dessas ações em larga escala. É preciso muita energia para levar o bem a muitas pessoas; o mal, dispensa maior esforço ou dedicação.
Não é por acaso, portanto, que candidatos em disputa lancem mão de ilícito expediente de criar e difundir fake news a dois dias de uma eleição, cientes de que, se o aforismo enunciado acima estiver certo, o candidato prejudicado não terá tempo hábil para desmenti-la satisfatoriamente, sobretudo quando impulsionada por redes sociais não raro interessadas no resultado de determinada eleição. É disso que se trata. A estupidez, nesse contexto, parece compensar.
Pior ainda quando uma parcela considerável da população pareça estar entorpecida, sendo muito comum encontrarem roda de letrados e bem sucedidos um orgulhoso discurso de resistência cega à realidade de que haja manipulação em massa promovida por redes sociais, que se pretendem supraterritorias e imunes aos controles de instituições democráticas de estados soberanos, arregimentando uma legião de apoiadores que, confusos, invocam princípios e valores muito caros à democracia, tal como a liberdade de expressão, sem perceber que, assim, contribuem para miná-la.
Do ponto de vista eleitoral, o artigo 323 da Lei n. 4.737/1965 proíbe expressamente a divulgação, na propaganda ou no período de campanha eleitoral, de fatos sabidamente inverídicos em relação a partidos políticos ou a candidatos, capazes de exercer influência perante o eleitorado, punindo criminalmente quem espalha notícias fraudulentas e mentirosas. A pena, de dois meses a um ano de detenção, ou o pagamento de multa, é agravada se o crime for cometido pela imprensa, rádio ou televisão, ou por meio da internet ou de rede social, ou se for transmitido em tempo real.
Há, portanto, dispositivo legal que criminaliza a propagação e o impulsionamento de conteúdos que se destinam a desinformar ou criar estados mentais ou emocionais lesivos ao eleitorado, mas as penas não parecem suficientemente persuasivas para aqueles que confiam na capacidade de manipular a opinião pública e apostam na perspectiva de que, obtido um resultado favorável com a distorção de última hora, a massa novamente manipulada pelas redes sociais constrangerá instituições democráticas para fazer prevalecer aquilo que denominarão “vontade das urnas”. Caberá à Justiça Eleitoral aplicar a lei e tornar ilegíveis aqueles que se valem do jogo democrático para enfraquecer instituições, punindo condutas que nada têm de divertido e que não podem ser normalizadas. Convém pensar em mecanismos mais ágeis, que possam fazer com que a estupidez não compense. O combo “multa e remoção de perfil” tampouco parece promissor, embora possa auxiliar.
Do cidadão comum, afetado diretamente pelo emprego da lei de Brandolini potencializada pelas redes sociais - não somente nas eleições, mas em tantos temas da vida social-, espera-se senso crítico e coerência para reagir com eficácia e rapidez a essa manipulação, exprimindo em suas decisões políticas ou relações sociais a intolerância com os intolerantes que, a pretexto de sobrepujar as ideias do outro, não respeitam regras básicas da democracia.