Com o jogo político dominando o governo, BC está sozinho para controlar a inflação
Congresso e Planalto atuam com agendas paralelas ao ajuste fiscal e autoridade monetária fica pendurada na taxa de juros
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Siga noO presidente fala mal da política monetária, o ministro da Fazenda está com a credibilidade arranhada, o Congresso Nacional barganha para aprovar medidas importantes para o país e ameaça desidratar o resultado esperado com elas e o Banco Central está pendurado nos juros, que já não têm mais a mesma eficácia de meses atrás.
Para piorar, todo esse cenário político-econômico do Brasil de hoje se dá num contexto internacional com bastante volatilidade, diante de incertezas sobre o que será a gestão do novo presidente dos Estados Unidos, que assumirá em 2025.
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O resultado dessa combinação a população assiste perplexa, à distância, às vésperas do período de férias escolares e de viagens internacionais para a classe média: a cotação do dólar bateu US$ 6,20 e, depois, recuou fechando a R$ 6,10, ainda assim um dos maiores patamares históricos.
O choque de juros promovido pelo Banco Central e que, na expectativa de muitos deveria acalmar o mercado, na verdade, confirmou o temor dos analistas: o quadro fiscal está mesmo preocupante. Por outro lado, o resultado esperado com a decisão do BC de elevar a taxa Selic (referência para economia) em um ponto percentual e sinalizar mais duas altas da mesma magnitude deverá surtir efeito ao longo de 2025 e 2026, reduzindo o crescimento e segurando a inflação dento da meta.
O controle da inflação é mandato do Banco Central. Na Fazenda, a preocupação com o fiscal navega, também, de olho no calendário das eleições presidenciais de 2026, foco no Palácio do Planalto. O Congresso tem sua própria agenda que contempla a troca de comando nas duas casas (Câmara e Senado) em fevereiro de 2025, na abertura do novo ano legislativo.
Com cada um olhando para o seu quadrado, o Banco Central avaliou que o quadro fiscal afetou os preços de ativos, como o dólar, e também as expectativas de investidores e analistas sobre o futuro. Isso está retratado de forma clara na ata da última reunião do comitê que define a taxa de juros no país, o Copom.
“De fato, as expectativas de inflação, medidas por diferentes instrumentos e obtidas de diferentes grupos de agentes, elevaram-se em todos os prazos, indicando desancoragem adicional”, destacam os diretores do BC no documento.
Isso fez com que o BC optasse por uma política monetária mais apertada. “A desancoragem das expectativas de inflação é um fator de desconforto comum a todos os membros do Comitê e deve ser combatida”, declararam ainda. Na prática, eles só confirmaram as análises feitas a partir do anúncio da decisão de alta dos juros na semana passada. Apesar de agradar os analistas, a ata não foi suficiente para conter o pavor no mercado financeiro nesta terça-feira, 17.
As atenções estavam voltadas para o Congresso Nacional. Os economistas tentavam antecipar quanto o pacote de medidas para conter as despesas públicas será desidratado. O ministro Fernando Haddad (Fazenda) anunciou que espera um ganho de R$ 70 bilhões nos próximos dois anos. As dúvidas sobre quanto a equipe econômica conseguirá manter dessa projeção tem influenciado do humor do mercado nos últimos dias.
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O BC precisa gerenciar esse humor e conseguir influenciar nas expectativas sobre o futuro. Usou o instrumento que tinha: a taxa de juros para tentar convencer. O problema é que isso também agrava a situação fiscal que ele precisa que melhore, já que a dívida é corrigida por taxas de juros mais altas. Mas esse é um preço a ser pago, também, afinal é preciso se blindar num ambiente em que a política predomina. Se o BC fosse interpretado como mais uma peça no tabuleiro político, o prejuízo, na avaliação de integrantes do governo, seria bem pior.