A membro do parlamento (MP) Polly Billington, vestida de rosa, ouviu a cada um dos depoimentos e disse que a luta por justiça não deve cessar -  (crédito: Mateus Parreiras/EM/D.A press)

A membro do parlamento (MP) Polly Billington, vestida de rosa, ouviu a cada um dos depoimentos e disse que a luta por justiça não deve cessar

crédito: Mateus Parreiras/EM/D.A press

Londres - As histórias de dor pela perda de filhos, a agonia dos doentes e a destruição da cultura, da tradição e do meio de vida. O parlamento inglês recebeu nesta terça-feira (22/10) uma comitiva de atingidos pelo rompimento da Barragem de Fundão, em Mariana, na Região Central de Minas Gerais, para contar a tragédia do rompimento em um movimento que quer sensibilizar as autoridades sobre as responsabilidades globais das multinacionais.

 

 

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Eles são parte da ação de indenização contra a BHP, neste que é o maior caso na história dos tribunais do Reino Unido e que começou na segunda-feira (21/10). O valor da indenização é estimado em R$ 248 bilhões (44 bilhões de dólares). Na ação são 620 mil atingidos, 46 municípios e 1.500 empresas, autarquias e instituições religiosas.

 

 

Os atingidos são representados pelo escritório internacional Pogust Goodhead. A BHP é sócia da mineradora Vale no controle da Samarco, a empresa que operava o barramento que se rompeu em 5 de novembro de 2015, matando 19 pessoas e deixando mais de um milhão de atingidos na Bacia Hidrográfica do Rio Doce, entre Minas Gerais e o litoral do Espírito Santo.

 

 

A membro do parlamento (MP) Polly Billington ouviu a cada um dos depoimentos e disse que a luta por justiça não deve cessar. “Esse foi o pior desastre ambiental do Brasil e é o maior caso em um tribunal inglês. É uma oportunidade de trazer justiça pela lei. Está e uma chance de assegurar a justiça para os atingidos”, disse Billington.

 

O membro do parlamento (MP) Jake Richards é um dos que convidou os atingidos e contou que antes de ser eleito, em 2019, trabalhou como advogado no escritório Pogust Goodhead e passou três meses nos territórios atingidos. “Sei quanta devastação o rompimento causou. Estou muito feliz de ver que o julgamento começou e espero que seja uma luz no fim do túnel. Espero que o nosso sistema de justiça traga justiça para vocês”, desejou.

 

A primeira a falar foi Wakrewa Krenak, liderança indígena. “Estou aqui para falar do sofrimento do meu povo e da destruição do Watu (Rio Doce), o nosso sagrado rio. Matou a cultura do meu povo, tirou o direito que a Terra deu para a gente de ter nosso direito de nadar, de brincar e de sorrir. Do nosso viver. A empresa sabia. Não foi tragédia, foi crime. Difícil falar que estamos aqui depois de nove anos e não tivemos justiça. A BHP não fez nada pelo nosso povo. Nada pelos atingidos pela lama.

 

“Tivemos perdas de anciãos e a última vontade que meu tio teve foi comer o peixe do Watu, mas a última vontade dele não conseguimos ter. O rio é sagrado para o povo Krenak. A água é sagrada para o povo Krenak. Meu povo está em luto. Se no Brasil não se faz nada por esse povo ser uma minoria, eu estou dizendo que nada vai me calar. A justiça será feita”, declarou Wakrewa. Ela ainda criticou a repatriação por não ter contado com a participação dos atingidos.

 

Simone Silva, que é quilombola da comunidade de Gesteira (Barra Longa) emocionou os presentes ao contar que, de 11 pessoas contaminadas por metais pesados advindos do rompimento, seis tinham morrido perdendo partes de seus corpos. A filha dela é uma das que ainda está viva. Ela coloca a culpa no sistema de justiça, nos políticos e incluindo o presidente Lula, por considerar que atenda mais a pautas internacionais e tenha feito acordos com as mineradoras que ela considerou maléficos.

 

“A minha filha tem nove anos (quase o tempo do rompimento) ela não tem vida passa comigo o tempo todo na luta. A Sofia tem uma contaminação severa por metais pesados. Ela tem arsênio, cádmio, chumbo, mercúrio no cérebro, coração, pulmão. Ela tem uma inflamação gravíssima no intestino e podemos perdê-la a qualquer momento. A última vez que pudemos ir ao médico, há três anos, o médico disse que ela provavelmente não alcançará a vida adulta”, disse.

 

A sócia do escritório Pogust Goodhead, Ana Carolina Salomão, enxerga o processo e a audiência no parlamento como uma oportunidade de se barrar abusos de empresas que operam em outros países.

 

“Podemos criar aqui um precedente global, para que as multinacionais não tentem continuar impunes. A Justiça inglesa se mostra um caminho para se ter uma justiça global e uma responsabilização internacional. É preciso mudar o direito para um mundo que está mudando, o clima está mudando. A Inglaterra foi o berço da revolução industrial e pode liderar essa revolução verde”, considera Salomão.