Grupo que destruiu caverna anunciou ação sustentável ao chegar a Ouro Preto
Mina Patrimônio, onde cavidade desapareceu, foi apresentada como empreendimento comprometido com sustentabilidade. Sociedades se repetem em iniciativas parecida
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Siga noQuando a Mina Patrimônio foi instalada em Ouro Preto, o Grupo Minerar tomou a frente nos projetos de apresentação do empreendimento à comunidade, à mídia local e às autoridades. Na oportunidade, afirmou que “contou com a aprovação e licenciamento de todas as autoridades competentes, e representa um marco importante para o desenvolvimento sustentável da região”. Uma postura que contrasta com a destruição recente de uma caverna na área, com a ameaça a outra e com a continuidade das ações, mesmo após embargo dos órgãos ambientais. Ontem, em decisão liminar, a Justiça local também determinou a suspensão de atividades nas proximidades das cavidades naturais afetadas.
Segundo a análise de uma fonte ligada ao setor ambiental, na constituição social dessas empresas mineradoras dificilmente se encontram os nomes dos seus reais controladores enquanto sócios ou representantes legais. “Todas elas têm se utilizado de um emaranhado contábil onde, entre os sócios da mineradora, sempre existe uma outra pessoa jurídica. E ao se fazer a busca pelos sócios e representantes legais dessa outra pessoa jurídica, o que você encontra? Outra pessoa jurídica. E assim, os reais controladores dessas mineradoras se escondem numa cadeia de pessoas jurídicas. Por vezes, é necessário fazer uma busca por seis ou sete pessoas jurídicas vinculadas entre si”, afirma.
Ao abrir toda essa intrincada rede, uma relação muito mais próxima é encontrada, segundo a avaliação dessa fonte. “Observa-se um mesmo grupo de pessoas, controladores de mineradoras em Minas Gerais na última década.”
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Justiça vê Mesmo grupo econômico
Em meio a polêmica sobre a mineração na Serra do Curral, em BH, e métodos e pessoas que remetem ao empreendimento que destruiu uma caverna não catalogada em Ouro Preto, os indicativos da relação íntima entre as mineradoras Gute Sicht e a Fleurs Global Mineração vêm de várias situações jurídicas e até criminais. Em 23 de dezembro de 2024, João Alberto Paixão Lage enviou mensagens para a secretária estadual de Meio Ambiente, Marília Melo, em que a ameaçava e a pressionava para que não adiasse a reunião que poderia liberar as atividades da Fleurs Global Mineração, marcada para dezembro.
Mas, na Polícia Civil, em depoimento, João Alberto negou fazer parte dos quadros da Fleurs Global. Ele foi indiciado por crimes de injúria e grave ameaça, mas o inquérito acabou arquivado. Já no órgão ambiental estadual, o processo de licenciamento foi submetido a julgamento e aprovado, sendo concedida a licença ambiental à Fleurs.
Em 24 de janeiro de 2025, o Juízo da 3ª Vara Federal Criminal da Subseção Judiciária de Belo Horizonte determinou a imediata suspensão das atividades das mineradoras Gute Sicht e Fleurs Global Mineração, após “novos fatos apresentados pela Polícia Federal (PF)”. A Justiça Federal aceitou a ligação que a PF fez entre a utilização de uma empresa de terraplanagem para minerar e vender minério irregularmente pela Fleurs Global e a Gute Sicht, considerando-as assim como partes integrantes de um “mesmo grupo econômico”.
Segundo divulgado pela Justiça Federal (Tribunal Regional Federal da 6ª Regão/TRF-6), ocorreram fatos determinantes para a decisão. O primeiro foi o continuado descumprimento pela Gute Sicht dos embargos emitidos desde 2022 e a terraplanagem feita na Serra do Curral para dissimular a extração de minério.
“Um terceiro ponto observado, envolvendo dessa vez a empresa Fleurs Global Mineração (a cujo grupo econômico também pertence a empresa Gute Sicht), foi o não atendimento de diversos TACs (termos de ajustamento de conduta) firmados entre a Semad (Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável) e as próprias mineradoras. A referida empresa havia obtido uma dispensa de licença ambiental, porém havia descumprido todos os seus TACs anteriores que, por sua natureza, são documentos temporários”, informou o TRF-6.
Mas há também ligações feitas por sociedades em empresas que conectam os quadros de acionistas da Gute Sicht e da Fleurs Global. Além da JHMinas Participações (de João Alberto Paixão Lages e Helder Adriano Freitas) e de Alexandre Ignácio Gomes Abrantes, da Gute Sicht, a BVT Mineração – empresa que acabou encerrada em 2023, justamente na época em que a Gute Sicht se viu impedida de minerar na Serra do Curral – tinha como associada a FH10 Participações. No quadro dessa empresa, aparece a Teca Participações, que tem como representante legal Alan Cavalcante do Nascimento, também representante legal da Fleurs Global Mineração e de outras empresas do grupo Fleurs.
Histórico de desobediência
Quando foi flagrada minerando na área tombada da Serra do Curral, em Belo Horizonte, nos limites entre Sabará e Nova Lima, a empresa Gute Sicht passava por um processo de regularização e celebrou, com a Superintendência Regional de Meio Ambiente Central e Metropolitana (Supram CM), em 11 de maio de 2021, um TAC que lhe permitiria minerar nos contrafortes da Serra do Curral, na área da Serra do Taquaril, em Sabará.
Tentativas de comissões de vereadores de BH e de deputados estaduais de vistoriar as atividades da empresa foram barradas por seguranças. Já a Prefeitura de Belo Horizonte, ao constatar que parte da mineração se dava na área da capital mineira, tombada pelo município, interditou a Mina Boa Vista, que pertence à Gute Sicht, em 25 de maio de 2022.
Mas a empresa, alegando ter autorizações e seguir as condicionantes, seguiu suas atividades, ignorando as multas diárias que em um mês já somavam R$ 1,2 milhão, em 18 autuações por provocar degradação ambiental e por descumprimento da interdição municipal.
Fiscalização da Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad) e do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) determinou a paralisação da mina em 29 de setembro de 2022. Mas, em 28 de novembro, uma liminar foi concedida pela 5ª Vara da Fazenda Pública do Tribunal de Justiça de Minas Gerais autorizando a mineradora Gute Sicht a retomar suas atividades.
Após mais fiscalizações, em abril de 2023, a Semad determinou multa e imediato encerramento das atividades da mineradora na Serra do Curral, em BH. A decisão ocorreu em 2 de maio de 2023 pois “a empresa realizava operação sem licença ambiental fora de sua área de direito minerário”. O TAC da empresa não foi mais renovado e foi suspenso pelo Supremo Tribunal Federal em 8 de maio de 2023.
Em 24 de janeiro de 2025, o Juízo da 3ª Vara Federal Criminal da Subseção Judiciária de Belo Horizonte determinou a imediata suspensão das atividades de duas mineradoras – Gute Sicht e Fleurs Global Mineração. A Fleurs conseguiu uma licença para beneficiamento e não está paralisada.
O que diz a Patrimônio Mineração
Veja a nota da empresa, na íntegra
“Ouro Preto, 28 de março de 2025.
Considerando os fatos divulgados e materializado nos documentos produzidos pela Fundação Estadual de Meio Ambiente – Feam, nos Auto de Fiscalização 51562/2025 e Auto de Infração 225355/2025, acerca de pretensa supressão de feição espeleológica durante as atividades de instalação e operação do empreendimento Patrimônio Mineração, localizado no município de Ouro Preto, titular do licenciamento ambiental (Processo SLA 4682/2021), viemos informar as providências adotadas pelo empreendimento visando garantir todas as medidas de salvaguarda do meio ambiente ecologicamente equilibrado durante o exercício de suas atividades produtivas.
Como medida inicial, decorrente das atividades fiscalizatórias realizadas pela Feam, foi feita vistoria na área pela equipe técnica e adotada a imediata paralização das atividades em um buffer de 250 m do ponto de coordenadas centrais onde pretensamente ocorreu a supressão de feição espeleológica (LAT 20° 22’ 12,11’’ LONG 43° 34’ 39,9’’ – atendendo o Auto de Infração 225355/2025).
É importante esclarecer que, ao contrário do que tem sido divulgado, as atividades da empresa estão parcialmente embargadas, estando a empresa cumprindo integralmente a determinação administrativa, com a suspensão das atividades no trecho mencionado, permanecendo legalmente autorizada a operar nas demais áreas do empreendimento, conforme legislação vigente.
Nesse contexto, na referida área de paralisação das atividades, estão sendo adotadas apenas as medidas de controle ambiental necessárias, de modo que já foram desmobilizadas as máquinas inseridas na área embargada.
Ademais, visando garantir a higidez do patrimônio espeleológico na área afetada, o empreendimento está desenvolvendo um plano de trabalho, por equipe técnica especializada, e um estudo espeleológico complementar.
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Não obstante, diante de eventuais controvérsias acerca da caracterização da estrutura como feição espeleológica, o empreendimento vem direcionando todos os esforços para avaliar de maneira criteriosa quais providências podem ser adotadas para resolução do caso, observando todas as medidas legais e normativas incidentes.
Em atenção aos questionamentos recebidos, esclarecemos, de forma categórica, que não existe qualquer tipo de relação societária ou de interesse comum entre a Patrimônio Mineração e as empresas Gute Sicht e Fleurs Global Mineração. Trata-se de sociedades completamente distintas e alheias às atividades, à estrutura e à gestão da Patrimônio Mineração, não existindo, portanto, qualquer vínculo ou conexão entre as referidas empresas.
Sempre aberta ao diálogo, a empresa permanece à disposição para quaisquer esclarecimentos e segue firme em sua missão de promover desenvolvimento, emprego e renda, com absoluto respeito à legislação ambiental vigente.
Patrimônio Mineração”