Ao término das partidas de tênis, após o longo embate que coloca dois esportistas frente a frente por horas, o árbitro responsável pelo jogo declara: "game, set and match", uma alusão ao conjunto de pontos que levam ao triunfo do vencedor. É o xeque-mate da bolinha verde.


Ontem, em vídeo gravado e veiculado na imprensa, Mark Zuckerberg, o CEO da Meta, conglomerado de mídia que controla o Facebook, o Instagram e o WhatsApp, fez seu movimento final. Anunciou o fim das ferramentas de checagens de suas redes sociais, um claro movimento de aproximação ao presidente eleito dos Estados Unidos, Donald Trump, histórico crítico do que chama de "censura" de conteúdo por parte das big techs.


"O rio só corre para o mar", diz a expressão popular. Ao colocar um ponto final nas iniciativas que tinham o objetivo de frear discursos de ódio e informações fraudulentas, Zuckerberg dá um claro sinal de que vai administrar a Meta de acordo com as preferências do político à frente da maior potência econômica mundial.


E a gigante da tecnologia nem faz questão de esconder isso. Em dezembro, doou US$ 1 milhão (cerca de R$ 6 milhões, na cotação atual) para colaborar com o evento de posse de Trump. Zuckerberg também nomeou Joel Kaplan, um conservador "de carteirinha", para ocupar o cargo de chefe de políticas da companhia – clara aproximação do Partido Republicano.


Outro movimento alinhado a Trump adotado pela Meta envolve Dana White, o mandachuva do UFC, empresa líder do MMA sediada em Las Vegas, Nevada. White é um histórico apoiador do presidente eleito e terá, a partir deste ano, uma cadeira no conselho da Meta.


Sobrou até para o Supremo Tribunal Federal (STF). No vídeo em que anuncia o fim das políticas de checagem de fatos da Meta, Zuckerberg criticou os “tribunais secretos da América Latina que podem ordenar que empresas removam conteúdos de forma silenciosa”. Vale lembrar que a Corte deve retomar, após o recesso, em fevereiro, o julgamento sobre o Marco Civil da Internet, interrompido após pedido de vistas do ministro André Mendonça.


Em suma, o Supremo quer aumentar a responsabilidade das big techs sobre o compartilhamento de conteúdos que ferem a lei nas redes sociais. O artigo 19 da legislação, hoje, só responsabiliza os sites quando há descumprimento de uma decisão judicial – com exceção do compartilhamento de fotos e vídeos sexuais sem consentimento da vítima, no qual a simples notificação da Justiça basta para a exclusão.


A tentativa do Supremo de criar um regramento tem seus riscos, evidentemente. Até mesmo por seu ineditismo, o movimento da Corte, seja ele qual for, requer ampla discussão com especialistas. No entanto, apesar dos perigos, o STF, ao se ater à questão, cumpre com sua obrigação de guardar a Constituição, sobretudo após os atos de 8 de janeiro de 2023, claramente planejados e divulgados a partir das redes sociais.


Dessa forma, é realmente lamentável a direção tomada pela Meta. Evidente que ela também tem motivação política, a partir do retorno de Trump e dos interesses econômicos circundados, mas a mensagem dada pelas big techs, mais uma vez, se aproxima da falta de transparência e do conservadorismo.


O fim do projeto de verificação de dados por parte da Meta acompanha a compra do X (antigo Twitter) pelo bilionário Elon Musk, que transformou o site em uma ferramenta aliada de Donald Trump. Também anda de mãos dadas com a extinção do CrowdTangle, anunciada em março, uma ferramenta que permitia acesso da população aos conteúdos em alta no Instagram e no Facebook em nome da lisura desses sites para com a sociedade e seus usuários. "Game, set and match".


Ao disponibilizar campos férteis para a desinformação em suas empresas, Musk e Zuckerberg deixam claro de qual lado estão, também, em toda discussão que envolve a inteligência artificial. A partir do potencial de controle de dados e do aumento da eficiência do trabalho que essas ferramentas oferecem, as big techs claramente pouco se importam com a isonomia no desenvolvimento deste novo mundo. São claros sinais de que não há qualquer preocupação com a capacidade que a IA tem para aumentar, ainda mais, as incomensuráveis desigualdades que cercam o mundo contemporâneo.


Cabe às potências mundiais, entre elas o Brasil, analisar esses movimentos de maneira crítica para resguardar suas populações. Discussões como a do Marco Civil da Internet, que deve ser retomada no STF em fevereiro, vêm em ótima hora.