Os militares envolvidos na trama de um golpe de Estado após a eleição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em 2022, falavam sobre entrar em guerra civil contra "os vermelhos", diziam ter "apoio maciço" da população e afirmavam que "qualquer solução não acontece sem quebrar ovos".
As falas fazem parte de um conjunto de mais de 50 áudios obtidos pela Polícia Federal. Nas gravações, que o Correio teve acesso, o tenente-coronel Mauro Cid — que na época era ajudante de ordens de Jair Bolsonaro —, o general Mario Fernandes, o coronel Reginaldo Vieira de Abreu e o coronel Roberto Raimundo Criscuoli discutem um golpe de Estado para impedir que Lula assumisse à presidência da República.
Em áudio enviado ao general Mario Fernandes, o coronel Roberto Raimundo Criscuoli ressalta que a intervenção militar deveria ser feita de imediato.
"Vai ser guerra civil agora ou vai ser guerra civil depois, só que a guerra civil agora tem uma justificativa, o povo está na rua, nós temos aquele apoio maciço. Daqui a pouco nós vamos entrar em uma guerra civil, porque, daqui uns meses, esse cara vai destruir o exército, vai destruir tudo", afirmou.
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O coronel diz que a guerra civil será contra "os vermelhos" — termo usado por bolsonaristas para descrever "comunistas" ou "petistas". "O presidente (Bolsonaro) não pode pagar para ver. Ele (Lula) vai destruir o nosso país. Vai esperar virar uma Venezuela pra virar o jogo? Democrata é o cacete, não tem que ser mais democrata agora. 'Ah, não vou sair das quatro linhas', acabou o jogo!. Não tem mais quatro linhas, o povo na rua tá pedindo pelo amor de Deus", disse Criscuoli.
Confira o áudio:
"Braga Netto tá indignado"
A Mauro Cid, Fernandes pede que mostre ao presidente Bolsonaro um vídeo. Pelo contexto, pode-se entender que seria uma gravação de manifestantes bolsonaristas após a eleição de Lula.
"Força, Cid! Cid, acho que está tendo uma reunião aí importante agora no Alvorada. Pô, mostra esse vídeo para o comandante, se possível transmite durante a reunião, porr*. Isso é história, e a história é marcada por momentos como os que estamos vivendo agora", alegou.
Em outro áudio, direcionado para uma pessoa identificado como "Caveira", Fernandes diz que "qualquer solução não acontece sem quebrar ovos" e que "apoio popular é o que não falta".
"Tava pensando aqui, sugeri ao presidente ele mudar de novo o MD [Ministério da Defesa], porr*, coloca de novo o João Braga Netto lá. João Braga Netto tá indignado, porr*, ele vai ter um apoio mais efetivo. Reestrutura de novo", diz áudio. "Não daí vão alegar que estou fazendo isso para dar um golpe". Porr*, negão, qualquer solução, Caveira, você sabe que ela não acontece sem quebrar ovos, sem quebrar cristais. Então, meu amigo, partir pra cima, apoio popular é o que não falta", declarou.
1964
Mario Fernandes ainda afirmou que as eleições presidenciais de 2022 tinham sido fraudadas, além de citar o clamor popular, "como foi em 1964", para a adesão das Forças Armadas ao golpe. Naquele ano, foi realizado o golpe que culminou na ditadura militar, que durou até 1985.
“Tá na cara que houve fraude, porr*. Tá na cara, não dá mais pra gente aguentar esta porra, tá fod*. Tá fod*. E outra coisa, nem que seja pra divulgar e inflamar a massa. Pra que ela se mantenha nas ruas, e, aí sim, porr*, talvez seja isso que o alto comando, que a defesa quer. O clamor popular, como foi em 64", diz o coronel a Luiz Eduardo Ramos.