Bisfenol A e suas alternativas podem causar diminuição na quantidade de folículos ovarianos e alterações morfológicas do óvulo. Substância é encontrada em diversos produtos, como garrafas reutilizáveis -  (crédito: Freepik)

Bisfenol A e suas alternativas podem causar diminuição na quantidade de folículos ovarianos e alterações morfológicas do óvulo. Substância é encontrada em diversos produtos, como garrafas reutilizáveis

crédito: Freepik

Fatores ambientais podem ter um impacto significativo na fertilidade e nas chances de gravidez. Nesse sentido, os chamados EDCs (Endocrine Disrupting Chemicals ou produtos químicos disruptores endócrinos) têm ganhado destaque como verdadeiros vilões para a saúde reprodutiva, pois são substâncias químicas que podem interferir na produção hormonal, inclusive dos hormônios ligados às funções reprodutivas. E entre os EDCs mais comuns está o BPA, ou Bisfenol A, que, segundo um estudo de revisão publicado em setembro na revista científica Human Reproduction Update, pode prejudicar severamente a qualidade dos óvulos e, consequentemente, as chances de gravidez.

 

 

“O Bisfenol A é um produto químico utilizado na produção de plásticos que pode ser encontrado em uma série de produtos na nossa rotina, como utensílios de cozinha, garrafas reutilizáveis, recibos de pagamentos, revestimentos de latas e rótulos, sendo que 90% da exposição humana à substância ocorre oralmente. E o problema é que o BPA, assim como suas alternativas, é um xenoestrógeno, isto, é, se comporta de maneira parecida ao estrógeno, confundindo os receptores e atrapalhando a produção de uma série de hormônios relacionados à fertilidade e à função sexual”, diz o especialista em reprodução humana e diretor clínico da clínica Mater Prime, em São Paulo, Rodrigo Rosa.

 

 

No estudo foram analisadas cerca de 100 pesquisas sobre o impacto do BPA e suas alternativas, como o Bisfenol F (BPF) e o Bisfenol S (BPS), na qualidade dos óvulos, levando em consideração cinco fatores: contagem dos folículos ovarianos (responsáveis por armazenar os óvulos), número de óvulos coletados e morfologia desses gametas, bem como a progressão meiótica e a integridade do fuso meiótico.

 

 

“A progressão meiótica avalia o quão bem os óvulos são capazes de concluir a meiose, que é o processo responsável por amadurecer os óvulos e dividir o número de cromossomos para 23, de forma que, quando óvulo e espermatozoide se juntarem, ocorra a formação de um embrião com 46 cromossomos. Já o fuso meiótico é o maquinário celular envolvido justamente na  separação dos cromossomos durante a meiose, então sua integridade é fundamental para que esse processo ocorra da maneira adequada”, detalha o especialista.

 

Entre os estudos selecionados para compor essa revisão, 27 pesquisas examinaram a maneira como ovúlos, folículos e ovários de humanos e animais eram afetados pela exposição direta ao BPA; 47 realizaram tratamentos com BPA e suas alternativas em animais, majoritariamente camundongos; e 21 eram baseados em resultados de estudos clínicos feitos em humanos.

 

 

“A maioria dos estudos reportava efeitos negativos à saúde do óvulo causados pelo BPA e suas alternativas. Enquanto os estudos in vitro mostraram consequências principalmente na morfologia do óvulo, na integridade do fuso e na progressão meiótica, pesquisas in vivo destacavam os prejuízos na contagem de folículos. Em humanos, os resultados foram mistos, mas altos níveis de BPA foram associados a uma menor quantidade de óvulos coletados, assim como menor contagem de folículos. Além disso, alguns dos estudos realizados em animais mostraram que os efeitos negativos dessas substâncias são multigeracionais, ou seja, a exposição pode afetar até mesmo os netos”, destaca o médico.

 

Com a revisão, os pesquisadores ainda reforçam a urgência de adequar os limites seguros de exposição aos BPAs aplicados atualmente, visto que grande parte dos estudos em animais utilizavam baixas doses que replicavam a exposição humana, mas ainda exibiam efeitos prejudiciais.

 

“Ainda existe uma lacuna entre as políticas globais e nacionais de controle desses produtos químicos e o que dizem as evidências mais atuais sobre essas substâncias. Estamos entendendo, por exemplo, que mesmo uma baixa exposição a esses produtos químicos pode causar problemas de saúde e talvez não exista uma dose segura para exposição. Porém, no geral, as políticas regulatórias não protegem contra essas baixas doses”, reforça o especialista.

 

 

O estudo também ressalta o cuidado necessário com as alternativas ao BPA, como o BPF e o BPS, que possuem efeitos prejudiciais similares. “Conforme descobrimos as consequências da exposição ao BPA para a saúde do organismo, muitos produtos passaram a trazer nos rótulos um selo indicando que são livres de BPA. O problema é que, nesses produtos, o BPA é, muitas vezes, substituído por alguma dessas alternativas que também são danosas e podem interferir na qualidade de óvulo e na saúde reprodutiva de maneira geral”, alerta.

 

Não há como eliminar totalmente a exposição ao BPA e suas alternativas, já que estão presentes em grande quantidade no dia a dia. Mas, enquanto políticas regulatórias mais rígidas não forem colocadas em prática, é possível adotar alguns cuidados para reduzir essa exposição.

 

“É importante, por exemplo, não esquentar, deixar no sol ou colocar alimentos quentes em recipientes e embalagens de plástico, já que o calor favorece a liberação de BPA por esses produtos, que acaba sendo absorvido pelo alimento”, aconselha Rodrigo Rosa, que ainda recomenda evitar latas amassadas e optar por garrafas de vidro ou inox.

 

“Além disso, outra fonte comum de exposição ao BPA são recibos de venda. Portanto, evite manuseá-los (especialmente com os dedos molhados) e jogue fora todas as cópias antigas na carteira ou no fundo da bolsa. Também é uma recomendação importante preferir receber os comprovantes de pagamentos digitalmente, evitando a emissão desnecessária de papel e o contato com disruptores endócrinos”, complementa.

 

 

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