Ovos, laticínios, carnes, vegetais verde-escuros e oleaginosas são alguns dos alimentos que contêm BCAA -  (crédito: Getty Images)

Ovos, laticínios, carnes, vegetais verde-escuros e oleaginosas são alguns dos alimentos que contêm BCAA

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A suplementação de BCAA, do inglês Branched-Chain Amino Acids (Aminoácidos de Cadeia Ramificada), começou a se popularizar no Brasil no início dos anos 2000, com a venda motivada por estudos realizados nos anos 1990, que indicavam potenciais benefícios dessa suplementação no exercício físico.

As pesquisas — que hoje já não são consideradas robustas e confiáveis o suficiente — indicavam que consumir mais desses aminoácidos poderia fazer maravilhas para os praticantes de esporte: aumentar a massa muscular e reduzir o nível de fadiga durante exercícios de longa duração.

Com o passar dos anos, sua popularidade só cresceu — especialmente nos últimos anos, acompanhando o aumento do interesse por performance esportiva e ganhos estéticos por meio da prática de atividades físicas.

Versões em pó ou em cápsulas são facilmente encontradas online — mas, antes de aderir a qualquer tipo de suplemento de BCAA, é importante entender o que ele é, quais suas funções no corpo e de quais fontes ele vem.

O papel do BCAA

Os aminoácidos podem ser pensados como os "blocos de construção" das proteínas — e é justamente com as proteínas que o corpo constrói e repara músculos (por exemplo, após um treino intenso de musculação).

Esse macronutriente também participa da produção de hormônios e enzimas, fortalece o sistema imunológico, transporta oxigênio pelo sangue e contribui para a regeneração de tecidos.

Existem 20 aminoácidos diferentes que o corpo usa para construir proteínas, e os BCAAs (incluindo leucina, isoleucina e valina) são parte desse grupo.

"Esses são aminoácidos chamados de essenciais, o que significa que não podem ser produzidos pelo organismo e precisam ser obtidos por meio da alimentação", explica Daniela Caetano Gonçalves, professora do Instituto de Saúde e Sociedade da Universidade Federal de São Paulo (ISS/Unifesp) — Campus Baixada Santista.

A sequência e a estrutura dos aminoácidos em uma proteína determinam suas funções no corpo, como o suporte aos músculos, defesa contra infecções (anticorpos), transporte de oxigênio (hemoglobina) e muitas outras funções biológicas.

No caso dos BCAAs, explica Gustavo Starling Torres, médico especialista em medicina esportiva, sua principal função é ajudar na construção e reparação muscular.

"Quando praticamos atividades físicas intensas, nossos músculos sofrem microlesões, que precisam ser recuperadas, e os BCAAs contribuem para esse processo, ajudando na regeneração e no aumento da síntese proteica. Entre os três aminoácidos, a leucina é particularmente importante, pois ela ativa mecanismos de crescimento muscular, auxiliando na recuperação e desenvolvimento do músculo", afirma o médico, que é diretor da SBMEE (Sociedade Brasileira de Medicina do Exercício e do Esporte).

Uma alimentação balanceada já contém BCAA

Embora o corpo não produza os três aminoácidos do BCAA, muitos alimentos naturais os contêm.

"Os BCAAs são encontrados principalmente em alimentos proteicos de alto valor biológico, como ovos, leite e carnes. Proteínas vegetais também os contêm, mas é importante que haja uma diversificação no consumo desses alimentos."

"Dietas veganas, por exemplo, podem suprir a necessidade, desde que incluam uma variedade de fontes vegetais, como leguminosas, grãos integrais, oleaginosas e vegetais verde-escuros", afirma a professora da Unifesp.

Gonçalves explica também que a deficiência desses aminoácidos geralmente ocorre devido à ingestão inadequada de proteínas, especialmente de fontes ricas em BCAAs, e que uma alimentação equilibrada costuma ser suficiente para atender às necessidades do organismo e ter os benefícios naturalmente oferecidos pelos aminoácidos.

Ainda assim, muitas pessoas escolhem adicionar mais BCAAs na dieta por meio de cápsulas ou pós de suplementos. Por quê?

Ovos mexidos em um pedaço de pão
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Ovos, laticínios, carnes, vegetais verde-escuros e oleaginosas são alguns dos alimentos que contêm BCAA

Vale suplementar BCAA?

A nutricionista esportiva Julia Engel explica que um dos principais motivos pelos quais as pessoas tentam aumentar a ingestão de BCAAs é a crença de que os BCAAs ajudam a preservar massa muscular ou até mesmo a promover a hipertrofia muscular (ganho de músculos).

"Entre os três, a leucina tem um papel fisiológico relevante, pois ativa uma via metabólica chamada mTOR, que é fundamental para a hipertrofia. No entanto, embora a leucina sinalize essa via, os estudos disponíveis não comprovam que a suplementação de BCAAs melhore os resultados."

"Isso porque o corpo precisa de todos os aminoácidos essenciais para alcançar esse objetivo, não apenas da leucina. Portanto, o nível de evidência científica que apoia o uso de BCAAs para ganho muscular é baixo", afirma ela, que é host do podcast Em Busca da Performance.

Se o objetivo é aumentar a massa muscular, aponta a nutricionista, é mais eficiente garantir uma ingestão adequada de proteínas completas, que oferecem todos os aminoácidos necessários.

"Suplementos como whey protein, por exemplo, são mais indicados porque contêm um perfil completo de aminoácidos, incluindo os BCAAs. Além disso, a dieta como um todo precisa ser avaliada para assegurar o aporte proteico adequado."

Gonçalves, professora da Unifesp, acrescenta que não há sinais específicos de que alguém possa estar com carência desses aminoácidos.

"Sintomas como fadiga ou cansaço muscular crônico podem estar associados à baixa ingestão de BCAAs, embora existam diversas outras possíveis causas."

Segundo a especialista, mesmo quando há um aumento na necessidade de BCAAs — como ocorre com atletas e praticantes de exercícios físicos, que geralmente demandam maior ingestão proteica —, esse incremento tende a ser atendido naturalmente pelo aumento do consumo de proteínas na dieta.

Outra teoria sugere que os BCAAs podem ajudar a retardar a fadiga central na prática de esportes de longa duração (treinos, por exemplo, de triatlo, que geralmente ocorrem por horas).

Isso aconteceria porque os BCAAs competem com o triptofano para atravessar a barreira hematoencefálica. Com menos triptofano entrando no cérebro, a produção de serotonina — associada à sensação de cansaço e relaxamento — seria reduzida, ajudando o atleta a manter o foco e a energia por mais tempo.

"No entanto, a eficácia dessa teoria ainda é incerta. Apesar de haver uma base fisiológica que a sustente, os estudos realizados até agora não trazem evidências consistentes ou significativas em humanos", afirma Engel.

Há contraindicações?

Sobre possíveis contraindicações, Engel descreve que não há evidências claras de que o consumo extra de BCAAs cause problemas específicos.

"Suplementar algo já adequado pela alimentação pode ser desnecessário e nenhum suplemento é completamente isento de efeitos ou riscos. Mesmo algo considerado 'simples' pode interagir com medicamentos ou causar algum tipo de sobrecarga no organismo, especialmente em quantidades excessivas ou sem necessidade."

Gonçalves complementa que o consumo excessivo de aminoácidos pode resultar em um excedente energético, pois, embora seja baixo em calorias, o BCAA também as contém.

 

 

"Quando esse excesso se mantém de forma crônica, pode resultar em ganho de peso, já que toda energia ingerida além das necessidades do corpo é armazenada como gordura ao longo do tempo."