O agronegócio é hoje responsável por quase 7% do Produto Interno Bruto (PIB) de Minas Gerais, segundo levantamento da Fundação João Pinheiro (FJP), baseado em seu desempenho no ano de 2023. Porém, a competitividade do setor que mais cresceu no ano passado, 11,5% em relação a 2022, tem um ponto de fragilidade que expõe os produtores às variantes do mercado externo: o uso de fertilizantes. Assim como no resto do país, a reposição de nutrientes no solo mineiro, prática fundamental para qualquer atividade agropecuária, incluindo a criação de gado, é dependente da importação.


No último ano, o estado captou 3,7 milhões de toneladas de fertilizantes provenientes do mercado externo, dado que representa um aumento de 22,5% em relação ao ano de 2022, de acordo com informações da Secretaria de Estado de Desenvolvimento Econômico (Sede). O volume elevado de adubos estrangeiros representa 30,1% da pauta importadora de Minas e a tendência é que a necessidade do produto continue crescendo nos próximos anos.

 




Ao Estado de Minas, o secretário de Estado de Desenvolvimento Econômico, Fernando Passalio, explicou que o governo do estado tem procurado atrair investimentos privados no setor para proteger os produtores de fatores externos que impactam nos preços do fertilizante. “Atualmente, contamos com cerca de R$ 6 bilhões em investimentos privados atraídos para Minas Gerais no setor de fertilizantes e remineralizadores, entre os anos de 2019 e 2024”, disse.


Apesar do crescimento em volume de importação, o montante no ano passado foi de 1,2 bilhão de dólares, valor que representou apenas 8% da pauta importadora do estado em 2023, sendo que houve uma queda de quase 40% nos gastos com o insumo em relação ao ano de 2022. Ocorre que o principal país de origem das importações de fertilizantes, em Minas Gerais, é a Rússia, com 33,2% do total. No entanto, há dois anos o país iniciou uma guerra com a Ucrânia, o que causou instabilidade nos preços do produto.

 

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Neste cenário, Passalio destacou a inauguração do complexo minero industrial da EuroChem, em Serra do Salitre, no Triângulo Mineiro, como um passo importante na redução da dependência do mercado externo. “Com grandes empreendimentos do setor instalados em Minas Gerais, os produtores mineiros ficam mais protegidos de fatores externos que impactam nos preços desses insumos, dando maior segurança nas operações e, consequentemente, reduzindo os custos dos alimentos na mesa do consumidor”, completou o secretário.


Inaugurado em cerimônia com a presença do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e do governador Romeu Zema (Novo), em março, a fábrica de fertilizantes fosfatados da EuroChem faz parte não apenas dos planos mineiros, mas também nacionais, na busca por autossuficiência. A expectativa é que quando estiver 100% operacional, o complexo possa fornecer 1 milhão de toneladas de adubos por ano para a agricultura brasileira, cerca de 15% da produção nacional.


A fábrica é a primeira inaugurada desde o lançamento do Plano Nacional de Fertilizantes (PNF), em 2022, que tem o objetivo ousado de dobrar a produção nacional de adubos até 2050 e atender entre 45% a 50% da demanda interna dos produtores brasileiros. No ano passado, o país havia batido o recorde de importação com 39,439 milhões de toneladas, de acordo com levantamento da Associação Nacional para a Difusão de Adubos (Anda), o que representa um aumento de 14% em relação a 2022.


O mesmo levantamento ainda mostra uma queda de 8,8% na produção nacional de fertilizantes. No entanto, na somatória entre importação e produção nacional, houve um crescimento de 11,6% no volume de adubos entregues ao mercado nacional, totalizando 45,82 milhões de toneladas. Neste cenário, o Mato Grosso liderou as entregas com 10,46 milhões de toneladas - Minas Gerais, por sua vez, teve destaque com 4,47 milhões de toneladas. Os dados mostram que 86% dos fertilizantes utilizados no mercado brasileiro em 2023 foram importados.

 

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Já neste ano, as importações cresceram 5%, como aponta o levantamento de janeiro e fevereiro da Anda. No primeiro mês de 2024 houve um recorde na entrada do produto estrangeiro, agora segundo o Boletim Logístico da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), quando foram importadas 2,77 milhões de toneladas de fertilizantes, contra 2,41 milhões no mesmo mês de 2023 (um crescimento de 15%).


Consumo de fertilizantes vai aumentar

Especialistas ouvidos pela reportagem corroboram o que os dados mostram: uma tendência de crescimento no consumo de fertilizantes. Em 2020, o Brasil foi o quarto maior consumidor de fertilizantes nitrogenados, o terceiro no consumo de fosfatados, e o segundo em potássicos, de acordo com o Plano Nacional de Fertilizantes — adubos que compõem a tríade dos principais nutrientes repostos quimicamente: Nitrogênio, Fósforo e Potássio (NPK).


O pesquisador Vinícius de Melo Benites, da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) e membro da Câmara Técnica de Produção de Fertilizantes NPK, do Conselho Nacional de Fertilizantes e Nutrição de Plantas (Confert), ressalta que não existe situações em que o solo brasileiro consiga sustentar uma produção agrícola sozinho, uma vez que é pobre em nutrientes seguindo um perfil dos solos tropicais.
“Neste tipo de solo, para sustentar uma produção, você precisa adubar, fertilizar. Se não repuser os nutrientes, ainda mais nós que trabalhamos muito com a exportação de grãos — que são culturas que levam muito nutriente para fora da colheita — o sistema vai exaurir. Então, quando você está exportando soja e milho, você está exportando nutriente dentro do grão”, explicou.


Graças aos avanços tecnológicos e ao investimento em pesquisa, o Brasil se consolidou como o quarto maior produtor mundial de grãos (arroz, cevada, soja, milho e trigo), responsável por 7,8% da produção mundial, atrás da China, Estados Unidos e Índia. O país lidera a exportação mundial de soja e é o segundo na exportação de milho.


Segundo a GlobalFert, empresa provedora de informações estratégicas no mercado de fertilizantes, 44% do consumo de adubos no Brasil vão para o cultivo de soja, enquanto 17% para o milho, e o restante é distribuído em outras culturas. Ainda de acordo com Benites, qualquer cultivo comercial depende do uso de fertilizantes, e até mesmo a produção para o consumo pessoal se beneficia da reposição de nutrientes.

 

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“Não existem situações no Brasil, onde o solo sozinho consegue sustentar uma produção sem a adição de fertilizantes, mesmo em sistemas orgânicos. Qualquer forma de agricultura no Brasil, hoje, depende de fertilizantes. E existe um cálculo, que varia, mas cerca de 40% do custo de produção da maioria das culturas de grãos é de fertilizantes. O aumento no consumo brasileiro de fertilizantes está na casa de 8 a 10% ao ano, é uma linha que sobe”, disse o pesquisador da Embrapa.


O engenheiro agrônomo João Chrisóstomo Pedroso Neto, pesquisador da Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais (Epamig) no Sul de Minas, destaca que o uso de fertilizantes é fundamental para a “viabilidade” do agronegócio mineiro devido às características do solo no Estado. “Como qualquer ser vivo, as plantas necessitam de receber todos os elementos essenciais a tempo. Além das diversidades regionais e culturais, Minas Gerais apresenta, também, diversidades pedológicas. Temos solos férteis no sul, semi-áridos no norte/nordeste e ácidos em praticamente todas as regiões”, explicou.


Produção nacional

Apesar da produção nacional representar apenas 15% da quantidade de fertilizantes entregues ao mercado, Minas Gerais aparece como um estado estratégico para mudar o cenário. A Secretária de Estado de Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Seapa), ressalta que o parque produtor de fertilizantes em Minas Gerais inclui 975 estabelecimentos registrados no Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa).


Vinícius Benites, da Embrapa, conta que a dependência do produto externo se dá por questões geológicas e as reservas pequenas dos nutrientes primários. “Fósforo nós temos várias reservas no Brasil, só que a qualidade do nosso minério é ruim do ponto de vista geológico. É um fósforo caro de extrair do solo, o custo de exploração não é competitivo e vale mais a pena importar. O potássio, que é o caso mais grave, o Brasil depende de 95% da importação, porque não temos reservas razoáveis ou estão em situação de muito difícil acesso”, disse.


Apoio ao produtor

O cenário descrito acende o alerta na dependência de importações, mas, mesmo que haja uma melhoria na produção nacional, é necessário que o produtor tenha conhecimento das formas mais eficientes de aplicar o fertilizante em sua produção.


Ambos os pesquisadores ouvidos pela reportagem destacaram a importância de projetos de extensão rural, em especial o FertBrasil. O programa realiza caravanas que já atenderam mais de 8 mil produtores na fase 1, ensinando sobre novas tecnologias, aumentando o número de pesquisas, além do forte envolvimento com estudantes, pesquisadores e setor privado.

 

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“Os principais objetivos são: desenvolver, avaliar, validar e transferir tecnologias em fertilizantes adaptados aos sistemas agrícolas tropicais, que contribuam para o aumento da eficiência do uso de fertilizantes. Para chegar a esses objetivos, foram estabelecidas três linhas temáticas: boas práticas para o uso eficiente de fertilizantes; identificação de fontes alternativas de nutrientes para a agricultura brasileira; e novas tecnologias em fertilizantes”, completou João Chrisóstomo da Epamig.


“É uma ação de transferência de tecnologia para o campo. Como nós vamos chegar na nossa independência? Encontrando fontes novas, desenvolvendo tecnologia para um uso mais eficiente das fontes, ensinando o produtor a usar bem, e criando condições políticas e econômicas para poder valorizar o produto nacional”, completou Vinícius Benites, da Embrapa.


Importação de fertilizantes em 2023

 

  • Total Brasil: 39,4 milhões de toneladas
  • Total Minas: 3,7 milhões de toneladas

 


Detalhes de MG

Municípios importadores

  • Uberaba - 37,2%
  • Araguari - 12,7%
  • Varginha - 12,4%
  • Iguatama - 5,2%
  • Manhuaçu - 5,1%

 

Origem da importação

 

  • Rússia - 33,2%
  • Canadá - 14%
  • China - 6,7%
  • Omã - 6,4%
  • Catar - 5,9%

 

 

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