Na semana passada, preço da caixa começou a cair e já foi encontrado abaixo de R$ 20 -  (crédito: Daniel Leal-Olivas/AFP - 29/6/18)

Na semana passada, preço da caixa começou a cair e já foi encontrado abaixo de R$ 20

crédito: Daniel Leal-Olivas/AFP - 29/6/18

Sob influência do El Niño, o outono chegou em março em Minas Gerais com um “calorzinho” a mais. Consequentemente, a adversidade das temperaturas acima dos níveis históricos costumeiros no estado atrasou a colheita de morango. A entrada da nova safra geralmente ocorre em abril, porém, só neste mês os novos morangos começaram a chegar aos consumidores, o que provocou uma elevação de preços nos últimos meses.

 


A técnica de campo Jaqueline Bergamasquini explica que a produção agrícola enfrenta uma instabilidade climática. “Para as plantas, no geral, isso é complicado, pois elas sentem muito as mudanças bruscas de temperatura.” Ela argumenta que o morango é uma planta adaptada e originalmente de lugares frios, por isso, sofre com essa interferência. “Nós tivemos um ano atípico, com um clima mais quente. As mudas podem vir defasadas, apresentar dificuldade de enraizamento quando plantadas e podem perder a umidade mais rápido”, explica.

 


Além disso, as altas temperaturas podem prolongar o desenvolvimento da planta. É o que diz o coordenador regional de Culturas da Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural (Emater-MG), Hélio João de Farias. “Este ano, tivemos um início de outono muito quente e com pouca chuva. Isso atrasou a florada, ou seja, em vez de formar flores, a planta acaba vegetando por mais tempo. Normalmente o morango depende de noites frias para que haja a indução floral”, enfatiza ele.

 


Devido ao atraso e a baixa oferta do produto nos últimos meses, a caixa com um quilo de morangos (com quatro bandejinhas) chegou a ser comercializada entre R$ 30 e R$ 35. “Com o tempo esfriando, tem-se um volume maior nos entrepostos, graças à entrada da nova safra. Com isso, os preços devem se acomodar um pouco. O quilo do produto deve oscilar entre R$ 25 a R$ 30. Na última semana, em alguns lugares chegou a ser comercializado de R$ 18 até R$ 22”, diz Hélio.

 

Expectativa de produção

Apesar do atraso, a safra chega em boa qualidade e quantidade. A estimativa, segundo a Emater-MG, é que Minas produza 197 mil toneladas da fruta. A quantidade representa um aumento de 14,72% em relação a 2023, quando a produção foi de 168 toneladas, e 19,8% em comparação a 2022, quando o total foi de 158 toneladas.

 

Produtores mineiros esperam colher 197 mil toneladas do fruto este ano e, apesar do atraso, a safra deve chegar em boa qualidade e quantidade

Produtores mineiros esperam colher 197 mil toneladas do fruto este ano e, apesar do atraso, a safra deve chegar em boa qualidade e quantidade

Hazem Bader/AFP - 3/2/20


A produtividade média este ano deve ser de 51 mil quilos por hectare (Kg/ha), igual ao ano passado. Já o registrado em 2022, foi de 45.453Kg/ha, sendo 3,9% inferior à safra de 2021 (47.285Kg/ha).

 


Os produtores mineiros também vêm ampliando a exportação de morango, que no ano passado teve um incremento de 196%. De acordo com o “Balanço do Agronegócio de Minas Gerais em 2023”, divulgado no fim de abril pela Secretaria de Estado de Agricultura, Pecuária e Abastecimento de Minas Gerais (Seapa), com as movimentações nos mercados interno e externo, a cultura atingiu o valor de 949,4 milhões, em 2022.

 

 

“A safra deste ano está mais desafiadora devido às intempéries climáticas"

Ricardo Alex, engenheiro agrônomo

 

De acordo com o estudo, a Região Sul abrange cerca de 90% da produção estadual de morangos do estado, com destaque para os municípios de Pouso Alegre, Espírito Santo do Dourado, Bom Repouso, Estiva e Senador Amaral.

 


Hélio destaca que a regional de Pouso Alegre contempla outros 40 municípios, destes, 26 também são produtores de morango. Todos possuem convênio com a Emater, por isso, rotineiramente, os técnicos recebem informações e vão à campo ouvir relatos dos trabalhadores sobre a produção e os desafios enfrentados.

 

Mão de obra é desafio

Cerca de 97% da produção de morangos no Sul do estado é oriunda da agricultura familiar, sendo que 9,5 mil agricultores envolvidos na atividade estão na região de Pouso Alegre, maior pólo produtor. Segundo Hélio, a rentabilidade é boa, mas demanda muita mão de obra. “É uma cultura que depende única e exclusivamente do trabalho braçal, então existe uma escassez de mão de obra por causa da posição do trabalho. Normalmente os canteiros são feitos no chão, o que causa um transtorno de ergonomia para o trabalhador rural.” A plantação no chão, apesar dos danos, é mais barata, por isso pequenos produtores optam por essa opção.

 

Plantação em Estiva, no Sul de Minas: na região, 97% da produção é proveniente da agricultura familiar

Plantação em Estiva, no Sul de Minas: na região, 97% da produção é proveniente da agricultura familiar

Donizete Barbosa/Divulgação


Donizete Barbosa da Silva é produtor de morango orgânico em Estiva e faz o plantio no solo. “Para a produção ser suspensa é preciso uma adubação diferenciada, é mais difícil, além de não ser possível colocar muita quantidade de terra. Já pesquisei sobre, até porque é mais fácil para trabalharmos, mas ainda não implantei”, conta o produtor.

 

Plantio suspenso

“Inovar na produção pode ser uma das soluções para incentivar quem trabalha nesse setor”, afirma o coordenador da Emater. Por causa disso, ele comenta que alguns produtores têm investido no plantio suspenso, uma vez que é mais ergonômico e evita ao agricultor ter que trabalhar agachado. “Há uma tendência de elevação dos canteiros, por meio de calhas. Dessa forma ocupa uma área menor, o manejo de doenças é facilitado e aumenta a longevidade dos substratos”, destaca Hélio.

 


Para enfrentar a escassez de mão de obra, os produtores têm investido na plantação suspensa. “O pessoal tem buscado fazer financiamentos via Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf) ou outros empréstimos bancários para bancar os investimentos. Apesar do custo inicial, vale a pena, pois é um investimento que se dilui no longo prazo e facilita muito a vida do produtor”, diz Hélio.

 

 

“Este ano, tivemos um início de outono muito quente e com pouca chuva. Normalmente, o morango depende de noites frias para que haja a indução floral”

Hélio João de Farias, coordenador regional de Culturas da Emater-MG


O plantio suspenso em calhas pode oferecer benefícios para o cultivo sustentável e ajudar a maximizar os rendimentos na produção. Dentre as vantagens estão a melhor drenagem do solo, evitando o acúmulo de água nas raízes das plantas; diminuição do impacto erosivo sobre o solo, melhor aproveitamento de recursos, como água e fertilizantes e cultivo mais intensivo, onde é possível plantar em espaços menores e otimizar o uso do terreno.

 

Cuidados na colheita

No geral, a época de colheita depende do clima na região de cultivo, variando de abril a outubro em regiões quentes, podendo estender-se até dezembro, em regiões mais frias. A colheita do morango é uma operação delicada e importante para o ciclo da cultura. Se for feita de forma inadequada, poderá se perder todo o esforço realizado nas outras etapas do cultivo.

 

Em São Gotardo, projeto leva turistas para conhecer lavouras, colher e provar os frutos

Em São Gotardo, projeto leva turistas para conhecer lavouras, colher e provar os frutos

Divulgação

 


De acordo com a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), os frutos do morangueiro são delicados e pouco resistentes, devido à sua epiderme delgada (poucas camadas de células), grande percentagem de água e alto metabolismo, o que exige muitos cuidados durante a colheita. Se colhidos muito maduros, poderão chegar em decomposição e com podridões ao mercado, e, se forem colhidos com falta de maturação, terão alta acidez, adstringência, e ausência de aroma.

 


A colheita começa aproximadamente após 60/80 dias do plantio das mudas, e pode se estender por quatro a seis meses. A produção de Donizete, por exemplo, é feita em março. “Após o plantio, a colheita começa, em média, 70 dias depois. Plantei 20 mil pés de morango este ano e vou colhê-los até meados de novembro”, destaca.

 


A cor é o parâmetro para definir o ponto de colheita dos morangos. A fruta deve ter em torno de 50 a 75% da superfície de cor vermelha brilhante. É importante evitar golpes, feridas ou qualquer tipo de injúrias na fruta, pois a deixam suscetível ao ataque de microrganismos, e colhê-la nas horas mais frescas do dia, armazenando em local refrigerado.

 

“Colheita no pé”

Para além da economia, o atraso da safra também adiou a tradição de 25 anos da cidade de São Gotardo, no Alto Paranaíba. Todo ano, na abertura da lavoura da fruta, moradores e turistas são convidados para colher morangos frescos diretamente no pé. A famosa degustação da fruta promovida por um grupo de produtores locais, no entanto, foi adiada. Devido às condições climáticas, a abertura da colheita foi no último sábado.

 


“A safra deste ano está mais desafiadora devido às intempéries climáticas. As hortaliças em geral estão sofrendo com o clima mais quente. Os frutos não estão amadurecendo como deveriam”, relata o engenheiro agrônomo e sócio do evento, Ricardo Alex.

 


A “colheita no pé” foi uma ideia do produtor e ex-prefeito de São Gotardo, Seiji Sekita. Com o passar dos anos o empreendimento tornou-se um evento do calendário do município, atraindo milhares de pessoas das cidades vizinhas. São 380 mil mudas distribuídas em uma área de 5 hectares.

 


Hoje, quem quiser viver a experiência, paga R$ 25 pela entrada, que dá direito a degustação sem restrições. Além disso, há embalagens próprias no local que são pesadas na hora ao custo de R$ 45 o quilo, para aqueles que quiserem levar as frutas para casa. A visitação pode ser feita em grupo e é permitido levar incrementos para o morango, como leite condensado, chantilly e chocolate. Vale destacar o cuidado na lavoura para não machucar os pés e evitar o desperdício das frutas.

*Estagiária sob supervisão da redação