Pesquisa mineira sobre azeite pode reduzir custo de produção
Método de avaliação do produto criado durante doutorado na Universidade Federal de Lavras usa smartphones para baratear custos de análise química
Mais lidas
compartilhe
Siga noUma pesquisa iniciada na Universidade Federal de Lavras (Ufla), no Sul de Minas Gerais, pretende tornar os custos da análise de qualidade do azeite de oliva mais baratos, além de serem “ecoamigáveis”, uma vez que utilizam menos solventes químicos no processo. De acordo com a pesquisadora Amanda Souza Anconi, o estudo é fruto de sua tese de doutorado, realizada no Laboratório de Pesquisa em Química e Análise de Alimentos (Laquali), na Escola de Ciências Agrárias de Lavras (Esal) da instituição.
Segundo a pesquisadora, a análise de qualidade química de azeite de oliva é realizada a partir da determinação do índice de acidez e do índice de peróxidos do produto. Para isso, é utilizada uma técnica simples chamada titulação, que depende da detecção de uma variação de cor, fazendo com que seja considerada um pouco imprecisa. A partir dessa mudança de cor, são realizados alguns cálculos para chegar aos índices, que têm valores e limites estabelecidos pela legislação brasileira.
Leia Mais
Na indústria, esses índices classificam os azeites de oliva como extravirgem, virgem ou lampante. Durante sua elaboração ou quando não são bem armazenados, os azeites de oliva sofrem degradação por processos hidrolíticos e oxidativos, o que afeta os índices de acidez livre e índice de peróxido, assim como seu valor comercial e, em caso de oxidação, seu sabor, cor e odor.
A ideia proposta pela pesquisa do Laquali é utilizar imagens digitais obtidas, por exemplo, por smartphones para substituir a etapa em que o analista faz a leitura visual. A substituição pela leitura digital, feita por aplicativos gratuitos, utiliza até 98% menos produtos químicos, tornando a determinação da qualidade ambientalmente amigável e econômica, além de ser mais simples e rápida do que os métodos atualmente empregados.
“Pegamos uma técnica que já existe para tentar facilitar e tornar mais precisa e padronizada a análise que realizamos no laboratório. Então, a inovação está em usar o smartphone, que não era comumente utilizado em análise química e bioquímica. É uma abordagem recente, que vai tornar o método mais preciso”, explica Amanda.
De acordo com ela, uma das vantagens é que aparelhos que custam entre R$ 20 mil e R$ 30 mil podem ser substituídos por celulares de R$ 1 mil, diminuindo o custo de produção. Isso porque, para que os produtos sigam a legislação brasileira, os olivicultores enviam amostras do azeite para laboratórios certificados, que avaliam a qualidade.

“É uma pesquisa que dá o pontapé inicial para esse tipo de desenvolvimento tecnológico no nosso país. O Brasil ainda investe pouco em pesquisa, então quanto mais barato a gente conseguir desenvolver, melhor para o nosso país, mais pesquisas serão feitas. O uso de smartphones barateia os processos, pois todo mundo tem um. Além disso, permite que a gente substitua esses métodos caros e que usam solventes por outros mais baratos e mais limpos. Quanto mais a gente seguir o caminho da sustentabilidade, melhor”, argumenta.
Segundo Anconi, durante o doutorado, foi percebido que ainda há pouca pesquisa sobre o tema no Brasil, pois é algo recente na ciência. A especialista explica que a leitura de máquina não é comumente utilizada no azeite de oliva em termos globais e, por isso, a avaliação comum exige grande quantidade de solventes químicos e até a classificação incorreta do líquido. No Brasil, Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) considera que o azeite de oliva é extravirgem quando possui acidez de até 0,8% e virgem quando a acidez se encontra entre 0,8% e 2%.
Brasil é grande importador de azeite
Atualmente, o Brasil produz menos de 1% da demanda nacional de consumo de azeite de oliva, sendo um grande importador do produto, principalmente de países europeus, como Portugal, Itália e Espanha, além do Chile, na América do Sul. Embora a produção nacional seja baixa, ela tem se destacado pela alta qualidade, e pode ganhar volume à medida que as análises são facilitadas.

A adoção dessa nova técnica terá impacto na indústria, pois torna o processo mais acessível, simples e econômico. De acordo com a pesquisadora, isso beneficiaria os produtores, que precisam garantir que seu produto atenda às normas de qualidade, e os consumidores.
De acordo com o presidente da Associação dos Olivicultores dos Contrafortes da Mantiqueira (Assolive), Moacir Batista, o estudo é interessante para a categoria, visto que é uma parcela pequena, mas que se preocupa com a qualidade do produto. “O cuidado começa no manejo, no trato da planta, na produção de um fruto saudável. Esse fruto tem que chegar para processamento limpo, sem impurezas, sem doença, sem nada. Quem faz a extração tem que ter muito cuidado para não ter contaminação, para ter um azeite limpo. Então, o controle de qualidade começa lá atrás. A análise físico-química te dá um parecer de uma coisa que está pronta, então você não consegue voltar atrás e mexer mais”, explica o presidente da associação.
A Assolive reúne 32 pequenos e médios produtores de azeites de alta qualidade, concentrados nos estados de São Paulo, Minas Gerais, Rio e Espírito Santo. Gaúcho, Moacir, que é engenheiro florestal, atualmente trabalha com o produto em Catas Altas da Noruega, na Região Central de Minas. De acordo com ele, são enviadas duas garrafas de 250 ml para análise em laboratório, que cobra R$ 300 por porção. Com a nova técnica, a despesa deve ter queda significativa.

Análise e fiscalização
O azeite de oliva e o óleo de bagaço de oliva são regulamentados tecnicamente conforme a Normativa nº 1, de 2012, do Mapa. A norma define padrões oficiais de classificação, incluindo requisitos de identidade e qualidade, métodos de amostragem, e regras de rotulagem. Tolerâncias para diversos parâmetros físico-químicos são estabelecidas, classificando os produtos em grupos e tipos, com critérios para produtos considerados “fora de tipo” ou “desclassificados”. O documento também detalha os procedimentos para análise e fiscalização, incluindo responsabilidades dos envolvidos na produção e comercialização.
Por diversos motivos, que vão da dificuldade de cultivo do fruto do qual é extraído ao preço do maquinário, passando por processos dispendiosos, o azeite de oliva tem um custo de produção alto. Isso acaba gerando muita fraude, segundo o olivicultor.
Se normalmente tem preço alto, o azeite teve um aumento considerável nos últimos anos para o consumidor final. Um problema na safra nos países europeus fez com que o produto subisse de preço, agravando ainda mais a deterioração da qualidade, considerando que o Brasil é o segundo maior consumidor de azeite de oliva no mundo, segundo o Instituto Brasileiro de Olivicultura (Ibraoliva). Porém, é esperado que, com a melhora da safra atual na Europa, o preço estabilize.

“A Espanha sofreu com condições climáticas adversas nas últimas duas safras. Por esse motivo, o preço subiu bastante. Há uma expectativa que haja uma diminuição no valor a partir da próxima safra. Mas, provavelmente, não voltará ao preço de antes”, diz Amanda Anconi, que aposta na adoção de sua técnica para baratear parte da cadeia produtiva. “O esperado é que, a longo prazo, isso reflita nas prateleiras dos supermercados.”