“Jabuti não sobre em árvore”– diz a sabedoria popular. Sexta-feira passada, no Senado, o presidente Rodrigo Pacheco instalou uma comissão, presidida pelo ministro do Supremo Ricardo Lewandowski, tendo como relatora a ex-secretária-geral do Supremo na presidência de Lewandowski, e mais nove integrantes, para, em 180 dias, oferecer ao Senado um anteprojeto de lei de impeachment, para substituir a Lei 1.079, de 1950.
O normal é que isso comece na Câmara, porque o Senado é a casa revisora; o estranho é que, teoricamente, Lewandowski pode ser julgado no Senado, que é a Casa julgadora de ministros do Supremo; estranho é que quem faz lei são os congressistas, e não integrantes de uma comissão composta de pessoas sem mandato popular para isso.
Estranho é que vá presidir a comissão um ministro do Supremo, que também é juiz do Tribunal Eleitoral, em ano de eleição. E logo Lewandowski, que entrou para a história por ter presidido julgamento, no mesmo Senado, em que se rasgou o parágrafo único do artigo 52 da Constituição, deixando elegível a presidente condenada. Tantas estranhezas levaram o senador Lasier Martins a expressar suas desconfianças na tribuna. O jabuti, “ou foi enchente ou mão de gente”.
Talvez como força dissuasiva contra tantas incursões do Supremo sobre o Poder Executivo. São quase duas dezenas de pedidos de impeachment parados no Senado, à espera de que Rodrigo Pacheco os ponha em exame – o maior número tem Alexandre de Moraes como alvo. A comissão instalada por Pacheco terá seis meses para deliberar, o que já dá ao presidente do Senado uma desculpa para esperar sentado sobre os pedidos até setembro, véspera das eleições.
Punir o denunciante se a denúncia não for aceita? Vai atingir os promotores também? Eu cobri o julgamento de Dilma, e ela teve todo o direito de defesa e do contraditório. Quanto a esclarecer o que seja crime de responsabilidade, basta ser alfabetizado e saber ler a lei 1.079, que trata do assunto há 72 anos. Está abundantemente esclarecido. O jurista Modesto Carvalhos, à revista Oeste, disse que “é uma lei primorosa, que nada tem a ser modificada”.
Se alguém quer mexer na lei neste ano eleitoral, sem que isso se configure uma necessidade ou urgência, já que serviu para Color e Dilma; se começou com um ato de subserviência do presidente do Senado, como sugere o senador Lasier; se há tanta esquisitice em torno desse jabuti que apareceu ex machina, o patrão desses servidores do público, que é o cidadão, o pagador de impostos, o eleitor, precisa saber o que estão preparando assim de forma tão estranha quanto um jabuti no galho.