Mais que esconder os fios brancos – como era há algumas décadas – mudar a cor do cabelo parece ser hoje um requisito de beleza para mulheres, homens e adolescentes. O chamado alisamento também é muito utilizado, apesar de nos últimos anos ter perdido espaço diante da valorização do cabelo mais natural.
No entanto, há pouco questionamento sobre o efeito desses processos para a saúde em longo prazo. Os produtos utilizados para ambos procedimentos estéticos podem conter mais de 5 mil substâncias químicas, incluindo algumas com propriedades mutagênicas e desreguladoras do sistema endócrino, como as aminas aromáticas, que são nocivas ao nosso organismo.
As aminas aromáticas são disruptoras endócrinas, isto é, alteram uma série de hormônios e podem, por exemplo, elevar a quantidade de estrógeno circulante (hormônio feminino). No caso do câncer de mama, pelo menos em alguma etapa de seu desenvolvimento, o estrógeno atua para acelerar o crescimento da célula tumoral.
Além disso, a presença desses disruptores endócrinos e o próprio mecanismo direto dessas aminas aromáticas na alteração do DNA e dos genes de controle de crescimento celular podem precipitar ou desencadear a geração de um tumor.
Inúmeros estudos buscam detalhar os efeitos do uso prolongado dessas substâncias. Um deles, conduzido na Universidade da Carolina do Norte, em Chapel Hill, mostrou a relação do uso desses produtos com o aparecimento de câncer de mama em mulheres.
O estudo conseguiu confirmar teses anteriormente levantadas ao associar estatisticamente tanto o uso dos corantes permanentes quanto dos alisantes ao maior aparecimento de câncer de mama em mulheres.E nquanto o uso permanente de corante foi associado a um risco relativo de câncer de mama 45% maior em mulheres negras e 7% maior para mulheres brancas, o uso de alisantes de cabelos elevou o risco de câncer de mama em 31% em uma intensidade de uso de 5 a 8 semanas.
As mulheres que já nascem com predisposição correm mais riscos. Então, este público deve avaliar a utilização desses procedimentos com cuidado redobrado e mais restrição. Ou seja, essas mulheres precisam naturalmente tomar mais cuidado, buscarem outras formas de tratamento capilar. Também foi observado risco maior nas mulheres negras, o que pode significar um possível componente hereditário racial ou ainda o maior consumo dos produtos para alisamento. Independentemente do motivo, os dados são um alerta.
Embora exista todo um controle sobre as quantidades de químicos permitidos, o fato é que ainda não temos muita certeza sobre a real segurança do uso dessas substâncias em longo prazo. Os estudos de toxicologia que examinaram a incidência de câncer provocado por alguns produtos são difíceis de serem executados, os efeitos podem aparecer de imediato ou demorar décadas para surgirem.
Então, estamos constantemente expostos a riscos. Na dúvida, In dubio pro reo, o melhor é evitar qualquer produto químico, optar por opções naturais, in natura, sem a presença ou com menos excesso de substâncias químicas. Como oncologista que acredita na prevenção, não posso deixar de alertar às mulheres e homens que utilizam tais processos estéticos.
O estudo demonstrou também risco 27% maior de câncer de mama para a aplicação não profissional de alisantes. Por isso, se a questão estética for mais importante, o indicado é recorrer sempre a profissionais habilitados que saibam quais tipos de tinturas e substâncias estão sendo usadas, certificar-se de que não há formaldeído (formol) e que as concentrações de químicos são mínimas.
Por fim, saliento que essas situações de exposição se tornam um pouco mais passíveis de cuidar quando identificamos o fator de risco hereditário, especialmente, para o câncer de mama. Identificando que já existe essa predisposição, os cuidados devem ser redobrados em relação a esse fator de risco adicional, além de outras ações preventivas que podem ser ajustadas. A saúde e a prevenção de doenças devem sempre ser o maior objetivo.
Oncologista, diretor-executivo da Personal Oncologia de Precisão e Personalizada e Oncogeneticista no Centro de Câncer Brasília – Cettro e do Instituto Kaplan de Porto Alegre