Quando ainda existia nesta cidade uma sociedade fechada, quem atuava no setor e movimentava todos os acontecimentos era, sem dúvida, Eduardo Couri, que durante vários anos comandou a coluna social aqui do Estado de Minas, com muito sucesso. O que ele divulgava era assunto no meio e o que existia por aqui era um grupo fechado que promovia eventos em espaços particulares ou em clubes exclusivos. Era um tempo agradável, as conversas circulavam, todos tinham assuntos para comentar. As reuniões pediam luxo e muitas joias, as mulheres movimentavam as butiques da cidade encomendando roupas sempre novas para cada acontecimento.
Graças a Deus, ninguém queria ser “empoderada”, mas participar dos encontros fechados era uma glória. A casa de Zilda e Alair Couto recebia de nobres a socialites nacionais e internacionais, cariocas e paulistas, as festas superavam qualquer previsão em matéria de luxo e requinte. Eram outros tempos, mais leves, ninguém pensava em coronavírus, viagens adiadas por segurança, roubos sem fim e sem termo, tudo de ruim que cai hoje em nossas cabeças. Eram tempos de irresponsabilidade? Até podiam ser, mas os ares da cidade eram melhores, as pessoas conviviam mais, tudo podia ser mais cordial.
Foi nesse clima que Eduardo Couri criou um concurso, Glamour girl, que não só escolhia a moça mais diferente da sociedade como fornecia renda para a Jornada Solidária, que estava começando. O concurso promovia vários acontecimentos particulares para que as candidatas ficassem conhecidas pelas figuras da sociedade, que posteriormente fariam parte do júri. A temporada era de puro encanto – e dava assunto para muito tempo. O desfile final era realizado no Iate Tênis Clube, e a escolhida era glorificada como assunto, ganhava muitos presentes, não havia mocinha que não quisesse participar.
Em 1962, as duas escolhidas para disputar o título foram Elke Grunnup e Maria Cristina (cujo sobrenome esqueci completamente). Quem ganhou foi Elke, que não fazia parte das rodas sociais, mas já era um sucesso só: bonita, despojada, estudada. Nem queria participar, foi inscrita pela mãe. Ganhou o título e pagou caro por ele. O provincianismo – que, claro, sempre existiu – não perdoou o fato de uma moça que preenchia totalmente os requisitos para ser escolhida não pertencer à alta sociedade, em lugar da outra, que era carioca, mas sobrinha de figura conhecida. O que Elke recebeu de trotes – era uso na época – não está no gibi. Foi rejeitada, queriam porque queriam apagar o seu sucesso.
Fiquei sabendo de toda essa campanha invejosa pela própria Elke, num dia em que nos encontramos por acaso. É claro que tomei logo partido – o que me valeu o convite para jantar com seus pais. No simpático encontro, fui apresentada, sem saber, a um prato que nunca mais esqueci: filé de cobra.
A família dela, de russos, veio para o Brasil fugindo do nazismo e foi parar no interior de Minas, em Itabira, onde eles moraram muito tempo antes de vir para BH. Elke se mudou para o Rio, depois de concluir vários cursos. Aos poucos, foi se transformando na Elke Maravilha que ficamos conhecendo, apelido criado pelo jornalista Daniel Más, perfeito para ela. O que poucos sabem é que ela era diferente por fora e por dentro. Enquanto pôde, ajudou muita gente. Defendeu Stuart Angel, filho de Zuzu Angel, rasgando retratos dele como terrorista procurado, afixados pelo Rio de Janeiro. Foi parar na cadeia e perdeu sua cidadania brasileira. A irmã de Stuart, Hildegard Angel, nunca esqueceu o que Elke fez e sempre procurou não só divulgar seu sucesso na TV (trabalhou com Chacrinha e Sílvio Santos), mas também elogiar seu comportamento ao longo da vida.
Agora fiquei sabendo que ela acaba de ganhar audiolivro produzido por uma empresa sueca, escrito pelo jornalista Chico Felitti, que conta sua vida com simpatia e verdades. Elke merece, porque foi sempre uma grande figura feminina deste país.