Quem ouve as queixas não consegue entender como é que uma dor tão tremenda quanto a enxaqueca não foi resolvida pela ciência. Conheço alguns casos e como tenho a sorte de não ter nem dor de cabeça, recebi como ótima notícia os novos tratamentos que estão sendo usados contra o problema. E é claro que é bom lembrar que só quem sofre com enxaqueca sabe dimensionar o impacto no bem-estar, na qualidade de vida e na rotina que esse problema causa.
Sabendo que uma crise de enxaqueca pode durar até 72 horas, aparecer mais de 15 dias por mês e apresentar sintomas como dor intensa e pulsátil em um ou nos dois lados da cabeça, náuseas, vômitos e sensibilidade à luz ou ao som, conviver com isso é enfrentar crises sérias, que esbarram na vida social e econômica do paciente.
Existem dois tratamentos principais para a enxaqueca na atualidade: a cirurgia e a aplicação de anticorpos monoclonais. Estudo recente, publicado em fevereiro no The Journal of Craniofacial Surgery, destaca que a cirurgia tem um custo/benefício melhor e os custos da aplicação da medicação, a partir de um ano, ultrapassam e muito os do procedimento.
“Esse é um artigo importante por comparar os dois tratamentos e também pelo fato de ter sido feito em colaboração entre os departamentos de Cirurgia Plástica e o de Neurologia de duas universidades americanas”, diz o cirurgião plástico Paolo Rubez, membro titular da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica, especialista em cirurgia de enxaqueca pela Case Western University e membro da Sociedade de Cirurgia de Enxaqueca dos EUA. “A cirurgia é realizada uma vez, enquanto que a medicação é para o resto da vida”, completa o especialista.
Segundo estimativas, a doença crônica migrânea, conhecida popularmente como enxaqueca, afeta cerca de 15% da população brasileira, sendo que a faixa etária dos 20 aos 45 anos é a mais acometida. Sem medicação específica para a doença, o tratamento é feito com medicamentos anti-hipertensivos, antidepressivos e antipsicóticos, além da toxina botulínica. “Pouco invasiva, a cirurgia tem o objetivo de descomprimir e liberar os ramos dos nervos trigêmeo e occipital, envolvidos nos pontos de dor. É por isso que o procedimento, disponível mais recentemente no Brasil e embasado cientificamente por uma série de estudos, promete ser um divisor de águas para quem sofre com o problema”, diz o médico.
Estudo da Sociedade Americana de Cirurgia Plástica publicado no ano passado já havia avaliado a cirurgia da enxaqueca como um procedimento eficaz e seguro. “A cirurgia de enxaqueca é hoje realizada por diversos grupos de cirurgiões plásticos ao redor do mundo e em mais de uma dezena das principais universidades americanas, como Harvard. Os resultados positivos e semelhantes das publicações dos diferentes grupos comprovam a eficácia e a reprodutibilidade do tratamento”, afirma o médico.
Quais os tipos de cirurgia de enxaqueca? As cirurgias para migrânea podem ser de sete tipos principais nas seguintes regiões: frontal, rinogênico, temporal e occipital (nuca). Segundo o especialista, para cada um dos tipos de dor existe um acesso diferente para tratar os ramos dos nervos, sendo todos nas áreas superficiais da face ou do couro cabeludo, ou ainda na cavidade nasal. O médico explica que cada cirurgia foi desenvolvida para gerar a menor alteração possível na fisiologia local. “Em todos esses tipos, o princípio é o mesmo: descomprimir e liberar os ramos dos nervos trigêmeo ou occipital, que são irritados pelas estruturas adjacentes ao longo de seu trajeto.”
A cirurgia para enxaqueca pode ser feita em qualquer paciente que tenha diagnóstico de migrânea (enxaqueca) feito por um neurologista, e que sofra com duas ou mais crises severas de dor por mês que não consigam ser controladas por medicações; ou em pacientes que sofram com efeitos colaterais das medicações para dor ou que tenham intolerância a elas; ou ainda em pacientes que desejam realizar o procedimento devido ao grande comprometimento que as dores causam em sua vida pessoal e profissional.
Paolo Rubez enfatiza que as cirurgias são realizadas em ambiente hospitalar e sob anestesia geral, e em alguns casos sob anestesia local. “A duração da cirurgia para cada nervo é de cerca de uma a duas horas, e o paciente tem alta no mesmo dia”, finaliza.