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Finados também é dia de encontro e tradição familiar

Com chuva ou sol, vou todos os anos ao cemitério de Santa Luzia, cidade onde, com fartura e mineirice, boa parte da família se reúne


02/11/2021 04:00

 Ilustração da Coluna Anna Marina
É importante a tradição de reunir a família em datas importantes do calendário católico (foto: Lelis)

 
Feriado no começo da semana convida a ficar em casa, mas mesmo a pandemia não nos tira a obrigação de homenagear nossos mortos. Todos os anos, com chuva ou sol, cumpro a tradição de ir ao cemitério de Santa Luzia, onde boa parte de minha família está enterrada. Menos a fundadora de tudo, a baronesa, que foi levada pelo irmão para ser enterrada em Barra, na Bahia, sua terra natal. O túmulo é lindo, alto, tem três andares e, como reza a lenda, ela foi enterrada com suas joias, fora as que deixou aqui para a família.
 
O cemitério de Santa Luzia não tem a beleza do de Sete Lagoas, onde santos de mármore distinguem uma sepultura da outra. Vou também ao cemitério do Bonfim, que é cheio de normas – no ano passado, não era possível a visita, apesar de o túmulo de minha irmã ficar praticamente na entrada.
Durante muito tempo, era comum cada pessoa levar as flores que podia para homenagear seus mortos. Nos últimos anos, vendem-se, na entrada dos cemitérios, flores de todos os tipos, das naturais às artificiais. Como o manacá era a flor preferida de minha mãe, consegui que o homem que toma conta do local plantasse um pé na cabeceira do túmulo dela, que ocupa a área que antecede a parte baixa do cemitério, o que deu espaço para a árvore crescer.
 
No ano passado, o manacá trazia novidades: um ninho de passarinho. Lá estão meu pai e as cinzas de duas irmãs. Como minha mãe era muito previdente, desenhou como queria o seu túmulo, que deveria ter tampo único de mármore com dois galhos de copo-de-leite cruzados em cima.
Consegui um escultor que moldou as flores em metal, elas foram soldadas sobre o mármore para não serem roubadas. É isso mesmo, tem muito irresponsável que leva para casa o que gosta e encontra em túmulo alheio. Não vou ser enterrada lá, pois quero ser cremada. Assim como quis meu marido.
 
O 2 de novembro sempre foi uma data de reunião da família em Santa Luzia. O local de encontro, todos os anos, é a enorme casa da minha prima Beata, que recebe quem chegar com a máxima fartura e mineirice. Quem chega muito cedo pode abancar na cozinha e tomar café com bolo ou biscoito, que ficam à disposição de quem quiser. Quem chega depois se regala com a bacalhoada servida na varanda, onde fica a longa mesa de refeições.
 
A panela em que o bacalhau é preparado é imensa. Fica à disposição das visitas ao longo da tarde. Não existe cerimônia, não existe convite – só um ajuntamento de familiares e amigos. Não sei como será este ano, pois Beata está adotando todos os cuidados possíveis contra a pandemia. Este ano, lá não vou, fui chamada para almoçar com meu primo querido Mário Tamm, dono de um sítio na cidade.
A tradição de unir a família em datas importantes do calendário católico é muito legal, porque do jeito que as coisas vão, é difícil encontrar muitos parentes de uma vez só. Beata cultiva a tradição, e outra data na qual abre sua casa é na sexta-feira da Paixão. É de lá que saem todas as flores que irão cobrir o sepulcro e o caixão do Cristo morto.

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