Internet é terra de ninguém, mundo sem dono. Todo mundo sabe disso, mas ninguém confere nenhuma notícia ou informação que recebe e sai repassando como verdade absoluta. Quando questionados, respondem com autoridade: “Mas está na internet”. E quando a informação vem com autoria, então, para que duvidar? Porém, a coisa mais fácil que tem é escrever alguma coisa e colocar o nome de quem quer que seja. Luis Fernando Verissimo e Arnaldo Jabor que o digam – e até mesmo o professor Pasquale Cipro Neto.
- Opinião sem medo:'O que é, quem são, como vivem os babacas da internet e descubra se você é um'
Explico. Tem um texto – muito interessante por sinal – que tenta explicar os antigos ditados populares, mostrando como sofreram mudanças ao longo da história e perderam o sentido original. Para dar veracidade à explicação, creditaram ao expert da língua portuguesa, nosso conhecido professor. Só que, em 2010, o próprio Pasquale publicou em sua coluna no jornal Folha de S. Paulo que nunca escreveu tal artigo, e ressalta estar cheio de erros. Agora, esse texto voltou a circular novamente.
Uma coisa é certa. Muitos destes provérbios populares são politicamente errados, principalmente no mundo atual, onde prezamos pela igualdade e respeito mútuo. Vou reproduzi-los aqui e fica por conta de cada leitor analisar e ver, afinal, qual seria de fato a forma correta.
Hoje é domingo, pé de cachimbo.... O desconhecido autor diz que ficava imaginando como seria um pé de cachimbo, e afirma que o correto é: hoje é domingo, pede cachimbo (dia de fumar um cachimbo). Esse menino não para quieto, parece que tem bicho carpinteiro. Que bicho seria esse? Vai aí uma possível explicação: esse menino não para quieto, parece que tem bicho no corpo inteiro. Batatinha quando nasce, esparrama pelo chão. Enquanto o correto é: batatinha quando nasce, espalha a rama pelo chão. As folhas que se espalham sobre a terra.
Outro: cor de burro quando foge. Afinal, burro muda de cor quando foge? Será que o correto seria: corro de burro quando foge?. Quem tem boca vai a Roma. No texto da internet o “autor” diz que o correto é: quem tem boca vaia Roma (isso mesmo, do verbo vaiar). Socorro. Sinceramente, não dá para concordar. E o professor Pasquale, em seu artigo no jornal, faz questão de se ater a ele. Reproduzindo: “A explicação? Lá vai uma delas: "Ou vai me dizer que você nunca vaiou Roma naqueles filmes históricos?" Outra: "No tempo do Império Romano, as pessoas vaiavam...". Melhor parar.
Só umas informaçõezinhas: sabe como é esse provérbio em espanhol?. Lá vai: "Preguntando se llega a Roma". Não é preciso traduzir, é? Sabe como é em italiano? Lá vai: "Chi ha (la) lingua arriva a Roma" ("quem tem (a) língua chega a Roma"). E que tal acrescentar a famosa frase "todos os caminhos levam a Roma", que em inglês vira "all roads lead to Rome", e em italiano passa a "tutte le strade portano a Roma"? Que tal?
Bem, a esta altura, alguém pode estar achando que os provérbios necessariamente se explicam pela lógica da frase, pela história da língua ou da humanidade, o que não é verdadeiro. Qual seria a explicação "lógica" para o dito "por fora, bela viola; por dentro, pão bolorento"? Nenhuma, creio. E quem disse que isso é necessário ou fundamental? O fundamental, nesse caso, além do aspecto lúdico, sonoro, chistoso etc., é que quem tem um tostão de senso de abstração capta logo o sentido desse dito, por sinal muito parecido com o de outros, igualmente conhecidos ("as aparências enganam"; "lobo em pele de cordeiro" etc.). Devagar com o andor, pois.... E com os julgamentos a respeito do que alguém.
Um outro, que não entrou no texto da internet, que falamos muito, e se pararmos para pensar é bem cruel, merece ser citado aqui e explicado: é a expressão “joão sem braço”, que dizemos quando queremos nos referir a uma pessoa preguiçosa ou trapaceadora. Vamos à explicação: originalmente, o pedinte amarrava sob a roupa um dos braços ou os dois, fingindo ser mutilado de guerra para obter a esmola pretendida, dando uma de joão sem braço. Porém, havia outros sinceros joões sem braços, muitos dos quais eram atendidos pelas Santas Casas de Misericórdia. No Rio de Janeiro, a Rua dos Inválidos atesta a tradição. Ela ainda conserva o mesmo nome que tinha em fins do século 18, por ter sido edificado ali um asilo para militares reformados. E muitos iam para a rua mendigar. Essa explicação eu encontrei no blog do Augusto Nunes. Afinal, é importante dar os devidos créditos.
*Isabela Teixeira da Costa/Interina