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CARESTIA

Com a teimosia de Putin, ameaça agora é inflação descontrolada

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Deus que me perdoe a heresia, mas, para mim, a guerra da Rússia teve, como efeito colateral, apagar a pandemia de coronavírus. Sem querer ser definitiva, a COVID-19 transformou-se, nos últimos dois anos, não só na desgraça da humanidade como no assunto permanente de jornais e TV. Sem falar que muitos se aproveitaram do fato de ser uma síndrome desconhecida para usar todos os meios de comunicação para se promover. O que se via e ouvia de tolice e repetição não dava nem para comentar.





Com a teimosia de Vladimir Putin, o assunto mudou, aliviando os noticiários. Mas não livrando nossa vida da terrível ameaça de uma inflação descontrolada. Quando a nossa vida cotidiana começou a ficar mais cara, adotei um princípio para a preservação da cabeça: comprava o necessário, sem avaliar muito o custo final.

Levei alguns trancos na intendência mensal, mas o que me bateu na cara com a maior força foi encontrar, naquele famoso ponto de venda no Mercado Central, ao lado do elevador, um abacaxi custando R$ 18. Espantada, acabei comprando dois por R$ 15 cada – que não honraram a tradição da banca: estavam muito ruins.

Acontece que me deu uma vontade danada de encarar um abacaxi e a fiscalização da prefeitura, que não tem tempo nem funcionário suficiente para recolher os pobres que lotam as ruas e que transformam cada marquise em um teto de casa, resolveram acabar com a venda da fruta em postos de rua.



Há anos compro abacaxis ótimos em alguns pontos tradicionais: na Rua Grão Mogol com Campanha, quando vou para o salão de Laura Nunes, e ao lado do Epa, no Santo Agostinho. Sumiram os dois, como sumiram os caminhões que ficavam na Avenida Francisco Sá. Quando algum aparece, sorrateiramente, o dono informa que foram proibidos pela fiscalização de vender abacaxi na rua. Aumenta o problema o fato de a fruta vendida no sacolão ser mais cara e, simplesmente, pior.

Outro susto que levei, semanas antes de a guerra russa começar, foi o custo de um quilo de cenoura vendida nos sacolões. Se levarmos em consideração que o legume nem faz tanto parte da mesa do mineiro, não dá para entender como é que chegava nas bancas custando R$ 17 o quilo. Agora, com a ameaça da “inflação russa”, não dá nem mesmo para pensar em comprar cenoura.

Se levarmos nosso raciocínio adiante, vamos reparar que a maior parte das frutas e legumes vendidos nos sacolões da cidade costumam ser comprados em pequenos fornecedores da vizinhança. Quer dizer, produtores que não precisam usar os benditos adubos que são importados da Rússia.





E outro espanto é aprender, com essa guerra, que um país grande como o nosso, com terra sobrando, tem que importar fertilizantes para manter suas plantações. Quando vou a São Paulo, meu passeio predileto não é nos shoppings, é no Mercado Central, onde há do bom e do melhor a preços muito melhores do que aqui. Um sobrinho que vai muito costuma me trazer uvas imensas, muito gostosas e sem sementes.

Por aqui, esse tipo de uva não aparece em lugar nenhum, os consumidores aceitam o que oferecem. O que me leva ao passado, quando caminhões corriam os bairros vendendo caixas de uva nacional vindas do Sul, ótimas, por pouco mais que nada. Eram deliciosas e quando aparecem nos supermercados, são bastante diferentes.

Outra ameaça da guerra é que a vodca vai acabar, porque não será mais exportada. Quando estive na Rússia, muito antes da queda de 1991, o que me chamou a atenção foram as garrafas de vodca de várias cores. Achava lindo nos bares e lojas, fiquei pensando como aqui seriam ótimas para decorar bares domésticos.

Só que a bebida agradou tanto por aqui que acabou sendo produzida no Brasil mesmo, só os muito exigentes é que preferem a original. Mas, mesmo assim, falta a original não há de fazer. E como detesto caviar, não estou nem aí se as importações forem fechadas.