Jornal Estado de Minas

ANNA MARINA

Sociedade não pode fugir dos casos de abuso infantil e violência doméstica

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Já perceberam que tem alguns assuntos que tentamos fugir deles? Fingir que não vemos, que não existem, ou que pensamos que estão tão longe de nós, que é mais fácil “deletá-los” de nosso raio de coisas com as quais nos preocuparmos.




 
Infelizmente, eles estão bem mais próximos de nós do que podemos imaginar. E nada é feito na tentativa de acabar ou minimizar o problema, exatamente porque nós e as autoridades que podem agir fechamos os olhos, ouvidos e bocas iguais aos três macaquinhos.

Dois desses temas desagradáveis são abuso sexual infantil e violência doméstica. E os números são alarmantes, infelizmente.
 
Com relação à violência doméstica, estamos falando com mais frequência, porque, desde antes da pandemia, a sociedade levantou contra isso por causa do crescente número de assassinato de mulheres por companheiros e ex-companheiros. O crime ganhou até nome: feminicídio.
 
Minha filha foi missionária por cinco anos no sertão da Bahia, onde trabalhou diretamente com crianças e foi chocante saber a quantidade de crianças abusadas sexualmente. Os pequenos e os adolescentes confiaram nela e se abriram. Fiquei sabendo por alto, pelos relatos superficiais que ela me contou. Chegou a denunciar na Promotoria, e, pasmem, foi sutilmente ameaçada de morte por eles. Ela criou um projeto espetacular sobre o tema. Infelizmente, nenhum empresário da Região Sudeste se interessa em investir nesta área, provavelmente por não trazer a visibilidade desejada.



A cada hora, o Brasil tem 2,2 casos de violência sexual contra crianças e adolescentes, com registros no Disque 100, o telefone da Secretaria Nacional de Direitos Humanos da Presidência da República. Vale lembrar que o número de denúncias é baixíssimo, portanto, esse número é bem maior.
 
Cerca de 51% destas vítimas têm entre 1 e 5 anos de idade, de acordo com dados do Comitê Nacional de Enfrentamento à Violência Sexual contra Crianças e Adolescentes e a Rede ECPAT Brasil. Ranking dos tipos de violência: abuso sexual (49,3%), abuso psicológico (24,4%), físico (15,6%) e negligência (10,7%).
 
Infelizmente, assim como a violência doméstica, que só cresceu nos últimos anos, inclusive na pandemia, esses assuntos ainda não são banalizados pela sociedade. Segundo a psicóloga Patricia Bezerra, eles têm que ser a pauta diária dentro de casa, na escola e no governo.



A especialista alerta os pais para ficarem de olho aos sinais e mudanças de comportamento das possíveis vítimas, entre eles, vergonha excessiva do corpo, brincadeiras de cunho sexual, agressividade e tristeza, por exemplo. O grande problema é que, na maioria das vezes, o abuso ocorre dentro da própria família, pelo pai, irmão, tio, ou mesmo amigo da família.
 
Por causa da Jornada Solidária, há um tempo, fiz uma denúncia pelo telefone. Uma criança de uma das creches que ajudamos estava sendo abusada pelo meio irmão, adolescente. Ela tinha 4 anos, o rapaz, 16 – e como era traficante, o pessoal da creche tinha medo de fazer a denúncia.

A ligação é anônima, mas precisamos dar tantos detalhes para tornar a denúncia mais segura – para evitar denúncia falsa –, o que também dificulta. Não dá para saber nome completo do abusador, idade, locais que frequenta, endereço completo etc, etc.




 
“O enfrentamento tem que acontecer na prevenção. A proteção de crianças e adolescentes é papel de todos nós. A violência muitas vezes ocorre de forma velada, o que leva a uma banalização desse ato entre os indivíduos”, diz Patrícia.
 
De acordo com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, uma em cada quatro mulheres acima de 16 anos afirma ter sofrido algum tipo de violência doméstica nos últimos 12 meses, ou seja, cerca de 17 milhões de mulheres brasileiras sofreram algum tipo de violência no último ano.
 
Nunca sofri nenhuma violência física, nem sexual, mas sei que, se um homem quiser bater em uma mulher, ele bate, porque é mais forte, mas a segunda vez é apenas se a mulher permitir, porque cabe a ela tomar uma atitude depois da primeira vez. Sei que não é fácil sair de casa, denunciar na polícia, mas é preciso.
 
Em entrevista à imprensa, a advogada que foi esfaqueada no Gutierrez disse que, mesmo depois de terminar com o ex que a esfaqueou, ela tentou ajudá-lo. Fica a prova de que toda e qualquer mulher que já foi agredida deve manter distância do seu agressor, sob qualquer circunstância. Graças a Deus, essa sobreviveu.
 
* Isabela Teixeira da Costa/ Interina